Apelação Criminal Nº 0006657-49.2002.4.03.6181/sp

Penal - estelionato contra a receita federal cometido em continuidade delitiva - auditor fiscal da receita federal - extinção e compensação indevida de débitos tributários no âmbito da receita com uso de senha própria do servidor no sistema de computação - atuação com dívidas provenientes de outra jurisdição - dolo, materialidade e autoria delitivas comprovados - condenação e penas mantidas - improvimento do recurso. 1.A materialidade delitiva vem demonstrada pela documentação trazida aos autos que serviu de suporte à apuração administrativa, a demonstrar as alterações no sistema da Receita Federal operadas pelo réu, mediante o uso de senha pessoal e a despeito da não observância da legislação, instruções normativas e regulamentares da Secretaria da Receita Federal. 2.As condutas ao acusado imputadas acarretaram a extinção indevida de débitos de várias pessoas jurídicas também através de compensação irregular, inclusive referente a outras áreas de atuação não acobertadas pela divisão fiscal em que o réu atuava, a demonstrar intensidade do dolo na conduta por ele perpetrada. 3.A autoria delitiva está sobejamente provada nos autos. Não obstante a negativa do réu, quando inquirido em Juízo, ao afirmar que não inseriu no sistema os lançamentos que culminaram com a indevida extinção de débitos, o que, segundo ele, teria sido possivelmente feito por interposta pessoa através de uso de sua senha, inclusive para emissão de certidão negativa de débitos, a versão não resultou amparada pelos elementos de prova colhidos nos autos. 4.A própria versão apresentada com base em negativas genéricas, de pronto, demonstram a responsabilidade do réu pelos fatos, o que veio confirmado pelos depoimentos testemunhais. 5.Para além disso, o procedimento administrativo disciplinar concluiu pela responsabilidade criminal do réu e culminou com a demissão publicada no Diário Oficial da União em 23 de janeiro de 2004. 6.Devidamente comprovada a autoria delitiva por vasto arcabouço probatório coligido nos autos que demonstra também o dolo na conduta do réu consubstanciado em propiciar vantagem ilícita dos contribuintes beneficiados que tiveram seus débitos indevidamente excluídos do sistema, tendo sido calculado o valor de mais de três milhões de reais em débitos fiscais extintos. 7.A pena-base tal como fundamentada merece ser mantida, bem sopesadas as circunstâncias previstas no art. 59 do Código Penal. 8.Além disso, trata-se de um Auditor da Receita Federal do Brasil, o mais alto cargo na carreira e melhor remunerado na escala hierárquica. É responsável, entre outras atribuições, pela fiscalização dos tributos federais e, mesmo assim, envolveu-se com o crime ao praticar ato de ofício, razão pela qual não há falar-se em bis in idem na valoração das circunstâncias que serviram à majoração, considerando-se ainda os fins da pena. 9.Todos esses fatores, que levam avaliação negativa da conduta social ou da personalidade do réu, não podem ser desconsiderados, relevando destacar a gravidade dos fatos apurados e a incompatibilidade com o cargo exercido pelo réu, que exige não só a probidade no trato com a coisa pública, mas a escorreita postura com as informações e dados privilegiados resultantes do exercício da função. 10.Ademais, verifica-se no sistema informatizado desta Corte que o réu sofreu condenação no feito nº 2000.03.99.0115195 que transitou em julgado em 30 de julho de 2008, condenação definitiva pela prática do crime previsto no art. 3º, inc. II, da Lei nº 8137/90, no qual foi decretada a perda do cargo, nos termos do art. 92, inc. I, do Código Penal. 11.Estão presentes as causas de aumento do § 3º, do art. 171 e a do art.71, do mesmo estatuto, aplicando-se a majoração de 1/3 para a primeira causa e de 1/3 para a segunda (considerando-se o número de condutas imputadas durante o período de quase dois anos, de 1º de janeiro de 1998 a 16 de novembro de 1999- aproximadamente doze vezes) a justificar a adoção dessa porcentagem e resultar a pena definitiva imposta em 05 (cinco) anos e 04 (quatro) meses de reclusão. 12.Manutenção da pena de multa imposta em 328 dias-multa, em conformidade e proporcionalidade com a pena privativa de liberdade imposta. 13.O regime inicial de cumprimento da pena corporal fica mantido no semiaberto, nos termos do artigo 33, § 2º, “b“ do Código Penal. 14.Levando-se em consideração o fato de ter sido Auditor Fiscal e possuído remuneração considerável resta mantido o valor do dia-multa em 1/6 (um sexto) do salário mínimo vigente à época dos fatos. 15.Incabível a substituição da pena corporal por penas restritivas de direitos, em face do não preenchimento dos requisitos subjetivos e objetivos para tal, conforme preconiza o art. 44 do Código Penal. 16.Também é incabível o sursis pleiteado no recurso, em face do quantum da pena imposta. 17. Improvimento do recurso defensivo e manutenção da condenação de Paulo Luiz Souto e Silva, como incurso nas sanções previstas no artigo 171, § 3º, c.c art. 71 do Código Penal ao cumprimento das penas de 05 (cinco) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, inicialmente em regime semi-aberto, e ao pagamento de 328 (trezentos e vinte e oito) dias-multa, cada dia-multa em 1/6 (um sexto) do salário mínimo vigente na data dos fatos.

Rel. Des. Luiz Stefanini

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