Penal e processo penal. Presentes os requisitos de admissibilidade da ação penal. Crime permanente. Prescrição inexistente. Estelionato previdenciário caracterizado. Irregularidade na concessão do benefício. Dosimetria da pena. Redução da pena fixada em sentença. 1 - o interesse de agir divide-se em necessidade, adequação e utilidade para a ação penal. A denúncia, oferecida de acordo com os parâmetros do art. 41 do CPP, é (i) necessária para a condenação penal da acusada; (ii) adequada, pois se submete ao procedimento legal e é acompanhada de provas pré-constituídas suficientes para embasá-la (Procedimento administrativo e inquérito policial que demonstram indícios de autoria e materialidade do crime de estelionato previdenciário) e; (iii) útil para a pretensão punitiva do Estado de ver condenado réu que, comprovadamente, tenha ofendido bem por ele tutelado. 2 - O estelionato qualificado, quando praticado pelo segurado em proveito próprio, é crime permanente, cuja consumação ocorre quando cessada a prática da conduta delitiva (inciso III do art. 111 do CP). A fluência do prazo prescricional na presente hipótese teve início em 15/11/2008, data em que o benefício foi suspenso pelo INSS por suspeita de fraude. Dúvidas não há de que a pretensão punitiva estatal não se encontra fulminada pela prescrição na modalidade retroativa porque não transcorridos mais de 8 (oito) anos entre a suspensão do benefício e o recebimento da denúncia. Tal prazo prescricional está cominado no art. 109, IV do CP para pena de 2 (dois) anos e 8 (oito) meses fixada em sentença condenatória não objeto de recurso da acusação. Precedentes: STF, HC 115776, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 12/11/2013, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-246 DIVULG 12-12-2013 PUBLIC 13-12-2013; STJ, RHC 33.295/MG, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 17/12/2013, DJe 03/02/2014) 3 – Baseando-se em conjunto probatório produzido nesse processo, entendo que há prova suficiente de que o benefício previdenciário nº 42/044.101.365-1 foi concedido à acusada com base em vínculos empregatícios irregulares. 4 - De acordo com o Procedimento Administrativo nº 35318.001775/2008-79, realizado pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS (folhas 11/94 do apenso), não houve comprovação da regularidade dos vínculos empregatícios da ré utilizados na concessão do benefício com as empresas: FÁBRICA DE MÓVEIS MON PARNASSR S/A; SOAQUA TRATAMENTO DE ÁGUA, SHALLOON EMPRESA COMÉRCIO DE ROUPAS (vínculos não constantes do cadastro do CNIS), causando prejuízo de R$ 88.227,11 em desfavor da Autarquia Previdenciária. 5 - Quando intimada nos autos do procedimento administrativo realizado pela Previdência Social, a ré não se manifestou, deixando de juntar qualquer documento que pudesse comprovar a regularidade de sua aposentadoria. 6 – Consta nos autos protocolo de requerimento administrativo de aposentadoria, em 19.02.93, assinado por Rosely da Silva Gomes, o que indica que a ré foi até o posto do INSS pleitear o benefício. Observe-se que em momento algum a validade deste documento foi questionada por ela, restringindo-se a afirmar que jamais requereu ou mesmo usufruiu do benefício previdenciário em questão. Todavia, há informação prestada pela Gerência Executiva em Niterói da Previdência social de que a Sra. Rosely da Silva Gomes possuía um empréstimo consignado ativo no valor de R$ 3.388,10, processado no dia 08/05/2007, no Banco Schahin S.A. Após a juntada do contrato original realizado entre a apelante e a instituição financeira, foi determinada a realização de perícia grafotécnica para atestar se o empréstimo foi, de fato, efetuado pela ré. O laudo do exame documentoscópico identificou ―convergências grafoscópicas, em qualidade e quantidade, para imputação ao punho escritor da Sra. Rosely Gomes Monteiro‖. Não há como se sustentar, portanto, o desconhecimento da ré a respeito da aposentadoria. A mesma não só requereu o benefício irregularmente como vinha usufruindo deste, uma vez que no ano de 2007 valeu-se de empréstimo consignado em folha, firmando contrato pessoalmente (atestado de forma inequívoca pelo laudo pericial) com a instituição bancária. 7 - Interrogada pelo juízo da 3ª Vara Federal de São Gonçalo (Carta precatória), a ré afirmou nunca ter trabalhado em empresa privada e que não trabalhou em nenhuma das empresas constantes da denúncia, contribuindo para o INSS como autônoma. A apelante não trouxe aos autos qualquer comprovação de sua situação de contribuinte individual. Por outro lado, os arquivos do CNIS (fl. 27 do IPL) atestam apenas uma contribuição datada de 02/1993 nesta qualidade. 8 - As alegações da ré não são hábeis a infirmar a força probatória da documentação coligida no processo acima analisada, que atestou de forma inquestionável que, além dos vínculos empregatícios considerados na concessão de sua aposentadoria eram inautênticos, a apelante requereu e usufruiu do benefício previdenciário. A ré agiu com pleno conhecimento e domínio dos fatos e de suas consequências jurídico-penais, estando comprovado o dolo. Estão provados os fatos descritos na denúncia, afastada a alegação da apelante de que não existem provas suficientes para a condenação. 9 – Quanto à pena aplicada, como a ré pugna pela absolvição, recorre, por óbvio, pela redução da pena. Entendo que a pena-base de 2 (dois) anos foi excessiva porque, neste tipo de delito, apesar de ser considerável o prejuízo do INSS (considerando o somatório dos valores), o lucro auferido pela ré não é elevado, pois o benefício é mensal de natureza alimentar. Como circunstância desfavorável considera-se, a saber, o tempo de duração do benefício fraudulento (de 1993 a 2008), aumentando, então, a pena em 6 (seis) meses (intervalo de 40 meses dividido por 8 é igual a 6 meses para cada circunstância). A pena-base de 1 (um) ano e 6 (seis) meses, com o aumento de 1/3 (§ 3º), totaliza a pena definitiva de 2 (dois) anos de reclusão. Quanto a pena de multa, mantém-se a pena fixada pelo juiz de 26 dias-multa, no valor unitário de R$50,00. Aplica-se a substituição da pena de reclusão por 1 prestação de serviços à comunidade a ser determinada pelo juízo da execução e 1 pena pecuniária no valor de R$ 1.000,00. 10 – Apelação parcialmente provida.
Rel. Des. Simone Schreiber
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