RELATOR : DESEMBARGADOR FEDERAL ROGÉRIO FIALHO MOREIRA
Penal e processual penal. Darfs contendo autenticações bancárias falsas. Uso de Documento falso (cp, art. 293, incisos i e v e § 1º). Falsificação de autenticação Mecânica atribuída à cef e apresentação à drt/rn. Competência da justiça federal. Ausência de provas suficientes da autoria. Preliminar de incompetência rejeitada e Apelação provida. 1. Apelações criminais interpostas pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e pela defesa do acusado CAIO RAMON LINS HONÓRIO DA SILVEIRA contra sentença que absolveu um dos réus, condenando o outro, na parte em que julgou parcialmente procedente a ação penal para condenar Caio Ramon Lins Honório da Silveira pela prática do crime previsto no artigo 293, V, e § 1º, do Código Penal à pena de 02 anos e 09 meses e 18 dias de reclusão, em regime aberto, e 53 dias-multa, tendo sido a pena de reclusão substituída por restritivas de direitos. 2. Caso em que, segundo a denúncia, os acusados CAIO RAMON e ITAÉCIO MELO, na condição de administrador e contador da empresa CONSTRUTORA SOLARES LTDA., respectivamente, teriam apresentado e entregue na Delegacia Regional do Trabalho do Rio Grande do Norte, oito (08) Documentos para Arrecadação de Receitas Federais - DARFs com autenticação de pagamento falsificadas, que seriam relativos ao recolhimento de multas devidas por referida sociedade. 3. Recurso da acusação pugnando pela majoração da pena-base, tendo em vista ser desfavorável ao réu os antecedentes, a personalidade e a conduta social, argumentando existirem ações penais em curso, bem como o fato de os réus terem, no modus operandi, se utilizado de "laranjas". 4. Recurso da defesa do acusado CAIO RAMON LINS HONÓRIO DE SILVEIRA requerendo, preliminarmente: a) declaração da incompetência da Justiça Federal; b) nulidade da sentença, sob o fundamento de que para a prova da materialidade do crime previsto no artigo 293 do Código Penal faz-se necessária a prova pericial com documento original, o que não teria ocorrido no caso sob exame em que a condenação se baseou em cópias de documentos não autenticadas e, no mérito, c) a absolvição, em razão a violação ao princípio da anterioridade (a Lei nº 11.035/2004, que alterou o artigo 293, § 1, I, do Código Penal, é posterior aos fatos descritos na denúncia), bem como por ausência de provas da autoria. 5. No julgamento do RHC 34959/PA, da Relatoria do Min. Jorge Mussi, a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que compete à Justiça Federal processar e julgar ação penal envolvendo a falsificação de autenticação bancária atribuída à Caixa Econômica Federal, pois a conduta implica lesão ao interesse daquela empresa pública, na medida em que importa abalo em sua credibilidade. 6. Conduta narrada na denúncia que atinge diretamente interesse da União, uma vez que os Documentos de Arrecadação de Receitas Federais - DARF¿s, com autenticação falsa foram apresentados à Delegacia Regional do Trabalho do Rio Grande do Norte - DRT/RN, órgão integrante da administração pública federal, com o objetivo de elidir o pagamento de multas aplicadas à empresa Construtora Solares Ltda pelo descumprimento da legislação trabalhista. 7. Preliminar de incompetência da Justiça Federal rejeitada. 8. Durante a instrução criminal, ficou apurado que os fatos delituosos foram praticados em 13/05/2004, 07/06/2004 e 01/09/2004, vindo o preceito primário em que se baseou a condenação (inciso I e § 1º do art. 293 do Código Penal) sofrer alterações em 23/12/2004, com a entrada em vigor da Lei n.º 11.035/2004. 9. Alterações promovidas no § 1º e no inciso I do art. 293 do Código Penal pela Lei n.º 11.035/2004 que não autorizam o reconhecimento da atipicidade da conduta ao tempo em que praticada, uma vez que o comportamento descrito na peça acusatória, se não se enquadrasse com perfeição na descrição típica do § 1º, inciso I, do art. 293 do Código Penal, em sua redação original ou naquela resultante da modificação introduzida pela Lei n.º 11.035/2004, certamente se enquadraria nas disposições do inciso V e § 1º do art. 293 do mesmo Código em sua redação originária. 10. Documento utilizado para pagamento da multa administrativa que, além de servir para arrecadação de tributos federais, também serve para recolhimento de outras rendas públicas, de modo que, independentemente de não ter a multa administrativa natureza tributária, a conduta encontraria tipificação nas disposições do inciso V do art. 293 do Código Penal, que não sofreu alteração desde sua redação original. 11. Trechos da sentença condenatória tratando da autoria delitiva demonstrando claramente que se imputou ao acusado Caio Ramon Lins Honório da Silveira a autoria do crime com base apenas na presunção de que, sendo ele o "dono" e o único responsável pela administração da empresa Construtora Solares Ltda, restaria "clarividente sua conduta de apresentar ou fazer apresentar" os DARF¿s falsos à DRT/RN. 12. A condição de administrador da empresa, à época dos fatos, não basta para que seja atribuída ao apelante a autoria do crime de uso de documento falso. Isso porque, não obstante seja razoável presumir que ele apresentou ou fez apresentar os DARF¿s à DRT/RN, por ser o único responsável pela gestão da empresa e ter amplos poderes de administração, não se mostra lícito presumir, apenas com base na condição de administrador da empresa, que ele praticou as falsificações ou que sabia da falsidade das autenticações. 13. Não se mostra plausível, pelo menos acima de qualquer dúvida razoável, concluir de que o apelante promoveu a falsificação ou sabia da falsidade das autenticações bancárias até porque é do conhecimento comum que as empresas muitas vezes atribuem a alguns de seus funcionários a tarefa de realizar o pagamento de títulos e tributos junto a instituições bancárias. Não se pode olvidar ainda dos casos relatados na jurisprudência em que servidores de repartições públicas e empregados de instituições bancárias se apropriam de valores entregues para pagamento pela empresa mediante devolução de papéis com autenticações forjadas. 14. Provas produzidas nos autos apenas poderiam levar à presunção de que o acusado apresentou ou fez apresentar os DARF¿s à DRT/RN, mas de modo algum que ele praticou as falsificações ou que de alguma forma sabia que as autenticações eram falsas. 15. Provimento à Apelação do réu para absolvê-lo da imputação de ter praticado o crime do art. 293, § 1º, incisos I e V, do Código Penal, em face da ausência de provas suficientes para a condenação, nos termos do art. 386, inciso VII, do Código de Processo Penal. 16. Prejudicada a preliminar de nulidade da sentença por ausência da prova pericial tida como indispensável à constatação da falsidade, uma vez que pelo mérito foi possível acolher pretensão mais favorável ao apelante. 17. Prejudicada a apelação do Ministério Público Federal, tendo em vista que a insurgência tinha como objeto apenas a dosimetria da pena.
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