A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) recebeu denúncia contra o desembargador do Tribunal de Justiça do Tocantins (TJTO) Amado Cilton Rosa, que permanecerá afastado de suas funções. Na mesma ação penal, também são réus três desembargadores já aposentados: José Liberato Costa Póvoa, Carlos Luiz de Souza e Willamara Leila de Almeida. Os dois últimos foram aposentados compulsoriamente pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) por infrações análogas aos crimes descritos na ação penal.
O julgamento ocorreu na quarta-feira (15). Ao todo, 21 denúncias contra 18 pessoas – entre magistrados, servidores e advogados – foram reunidas pelo Ministério Público em uma única ação penal, fruto de investigações que apontaram a existência de grupos criminosos no TJTO atuando na venda de decisões judiciais, aí incluídos acórdãos e fraudes em precatórios.
O relator, ministro João Otávio de Noronha, concluiu pela existência de elementos capazes de justificar o processamento da ação penal contra os quatro magistrados e contra outras 12 pessoas. Noronha qualificou as acusações de “graves” e disse que o afastamento do desembargador Amado Rosa foi “salutar”, especialmente em razão de os crimes descritos pelo Ministério Público estarem relacionados ao exercício da judicatura.
“É imperativo de ordem pública o afastamento, pois é justamente a sua função primeira, o ato de julgar, que está sob suspeita. A atividade do Poder Judiciário é muito sensível e não pode estar acoimada de qualquer pecha de irregularidade, como no presente caso, até que se esclareçam cabalmente os fatos”, enfatizou o ministro.
Os réus
A ação penal foi aberta contra o desembargador Amado Cilton Rosa (por corrupção passiva qualificada, concussão e peculato) e os desembargadores aposentados Carlos Luiz de Souza (por corrupção passiva qualificada, associação criminosa e concussão), José Liberato Costa Póvoa (por corrupção passiva qualificada, associação criminosa e peculato) e Willamara Leila de Almeida (por concussão, associação criminosa e corrupção passiva qualificada).
Também responderão à ação o procurador do estado do Tocantins Hércules Ribeiro Martins (por peculato) e os advogados Antônio dos Reis Calçado Júnior (por concussão, associação criminosa e corrupção passiva qualificada), Francisco Deliane e Silva (por corrupção ativa qualificada e associação criminosa), Germiro Moretti (por corrupção ativa qualificada e associação criminosa), Joaquim Gonzaga Neto (por corrupção ativa qualificada), José Carlos Ferreira (por concussão e associação criminosa) e João Batista Marques Barcelos (por concussão e associação criminosa).
Ainda foi recebida pelo STJ denúncia contra três assessores – Liamar de Fátima Guimarães Rosa (por corrupção passiva qualificada), Manoel Pedro de Andrade (por corrupção passiva simples e associação criminosa) e Dagoberto Pinheiro Andrades Filho (por corrupção passiva simples e associação criminosa) –, além de Rogério Leopoldo Rocha (por corrupção ativa qualificada), supostamente beneficiado por uma das negociações, e João Batista Moura Macedo (por associação criminosa), companheiro da desembargadora Willamara Leila de Almeida.
A denúncia contra o procurador do estado do Tocantins Haroldo Carneiro Rastoldo foi rejeitada. A punibilidade de Walker de Montemor Quagliarello foi julgada extinta em razão de sua morte no ano passado.
Venda de decisões
O inquérito chegou ao STJ em 2007. A Justiça Federal no Tocantins percebeu que escutas telefônicas relativas a uma investigação sobre crime de moeda falsa revelavam possível negociação de decisões judiciais praticada por desembargadores.
A denúncia separa a acusação em quatro núcleos. O primeiro grupo seria articulado pelo advogado Germiro Moretti e descreve a compra de duas decisões judiciais, em dois agravos de instrumento, pelas quais teriam sido pagos R$ 120 mil. Nessa negociação, estariam envolvidos os desembargadores Carlos de Souza e Liberato Póvoa.
Outro grupo envolveria o desembargador Amado Rosa, que teria organizado um núcleo próprio de venda de decisões – em habeas corpus e em mandado de segurança para acelerar recebimento de precatório, cuja distribuição, inclusive, teria sido fraudada pela falsa informação sobre prevenção do magistrado.
Precatórios
No fim de 2009, a investigação chegou a um esquema de concussão montado contra beneficiários de precatórios em que o grupo supostamente comandado pela ex-presidente do TJTO Willamara de Almeida se apropriava de metade dos valores.
O então vice-presidente, Carlos Souza, também seria beneficiado. Eles exigiam propina por meio de advogados para apressar e expedir os alvarás relativos aos precatórios. Caso as vítimas não concordassem, havia a ameaça de jamais receberem o valor a que tinham direito ou de terem a pretensão dificultada.
Acordos fraudulentos
Segundo a denúncia, um quarto conjunto de fatos envolve “acordos suspeitos” feitos pelos desembargadores Amado Rosa e Liberato Póvoa, em aparente conluio com procuradores do estado do Tocantins e em detrimento do erário.
Amado Rosa era credor da quantia de R$ 1,5 milhão, fruto de condenação do estado. Ocorre que o recurso especial contra tal decisão não foi admitido pela desembargadora Willamara e não houve agravo por parte do estado. O desembargador teria feito um acordo com a procuradoria do estado para apressar o pagamento sem obediência à ordem dos precatórios.
Em outro caso, Liberato Póvoa era credor de indenização por danos morais contra o estado, fixada inicialmente em R$ 3 milhões, mas reduzida pelo STJ para R$ 50 mil (REsp 521.434). No entanto, a procuradoria fez acordo no valor de R$ 310 mil.
Desmembramento
O ministro Noronha determinou a separação do processo quanto à prática de concussão atribuída à ex-presidente do TJTO Willamara de Almeida, em razão de ela supostamente exigir pagamento mensal de alguns servidores com função comissionada.
Também retornará à Justiça do Tocantins a denúncia por peculato contra a desembargadora aposentada, acusada de ter recebido valores indevidos em 2009 referentes a “gratificação de curso”. Quando já estava afastada de suas funções pelo STJ, em janeiro de 2011, ela teria recebido pagamentos por insalubridade e por horas-extras.