APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0002799-48.2014.4.03.6000/MS

REL. DES. ANDRÉ NEKATSCHALOW -  

Processo penal. Tráfico internacional de drogas. Denúncia. Inépcia. Inocorrência. Nulidade. Recebimento da denúncia. Inocorrência. Autoria e materialidade demonstradas. Dosimetria. 1. Para não ser considerada inepta, a denúncia deve descrever de forma clara e suficiente a conduta delituosa, apontando as circunstâncias necessárias à configuração do delito, a materialidade delitiva e os indícios de autoria, viabilizando ao acusado o exercício da ampla defesa, propiciando-lhe o conhecimento da acusação que sobre ele recai, bem como, qual a medida de sua participação na prática criminosa, atendendo ao disposto no art. 41, do Código de Processo Penal. 2. A denúnciaoferecida pelo Ministério Público Federal preenche os requisitos formais do art. 41 do Código de Processo Penal. O fato criminoso está exposto com clareza, possibilitando o adequado exercício de defesa pelo acusado. 3. A decisão de fl. 186 recebeu a denúncia, considerando que essa preenchia os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal, com a exposição do fato criminoso e a qualificação do réu. Foi observado que a peça acusatória decorria de prisão em flagrante e que havia laudo de exame toxicológico, com resultado positivo para cocaína. Ponderou-se que haveria necessidade de dilação probatória para se verificar a consumação do delito do art. 35 da Lei n. 11.343/06. Concluiu a decisão que havia prova da materialidade e indícios de autoria e não estavam presentes as hipóteses do art. 395 e do art. 397, ambos do Código de Processo Penal. Foram analisadas todas as preliminares suscitadas pela defesa. Assim, está suficientemente fundamentada a decisão que recebeu a denúncia. Não se entrevê a alegada nulidade. 4. Materialidade e autoria demonstradas em relação ao acusado Volgran. Quanto a corré Bruna não há prova suficiente de que tivesse ciência da existência da droga, não havendo elementos de convicção suficiente para embasar sua condenação, razão pela qual é mantida a sentença absolutória da acusada. Por conseguinte, é mantida a absolvição dos réus quanto ao delito do art. 35 da Lei n. 11.343/06. 5. É justificável a fixação da pena-base acima do mínimo legal, nos moldes procedidos na sentença, pena que se ajusta à natureza e à quantidade da droga apreendida. As parte não se insurgiram contra a pena-base aplicada na sentença, a qual se mantém. 6. Deve ser aplicada a atenuante genérica do art. 65, III, d, do Código Penal. São irrelevantes os motivos pelos quais o agente teria sido levado a confessar o delito perante a autoridade para fazer jus à incidência da atenuante genérica (STJ, HC n. 159.854, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 15.06.10; HC n. 117.764, Rel. Min. Og Fernandes, j. 11.05.10; HC n. 46.858, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 13.11.07; HC n. 79.381, Rel. Min. Nilson Naves, j. 23.10.07). Assim, pouco importa que o réu tenha sido preso em flagrante, bastando o reconhecimento da prática do delito (STF, HC n. 69.479-RJ, Rel. Min. Marco Aurélio, unânime, DJ 18.12.02, p. 384). 7. Mantida a redução da pena em razão da causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06. Alguns precedentes do Supremo Tribunal Federal admitem que a natureza e a quantidade de entorpecente sirvam para graduar a causa de diminuição do § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/06 (STF, HC n. 106.762, Rel. Min. Cármen Lúcia, j. 21.06.11; HC n. 104.195, Rel. Min. Luiz Fux, j. 26.04.11), reconhecendo ademais plena liberdade ou discricionariedade judicial (STF, HC n. 94.440, Rel. Min. Joaquim Barbosa, j. 03.05.11; RHC n. 106.719, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 01.03.11). Não obstante, há precedentes também no sentido de que considerar essas circunstâncias do delito seria proibido bis in idem (STF, HC n. 108.264, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 21.06.11; HC n. 106.313, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 15.03.11). Assim, embora repute admissível apreciar tais circunstâncias com certa dose de discricionariedade (trata-se de disposição específica), convém que além delas sejam consideradas outras peculiaridades do caso concreto, à vista das provas dos autos, para resolver sobre a aplicabilidade e a gradação dessa causa de diminuição. 8. O acusado é primário e não tem antecedentes. Desse modo, os elementos fáticos da prática delitiva, em que o agente assume eventualmente a responsabilidade pelo transporte de substância entorpecente em viagens internacionais, com as despesas custeadas por terceiros, não evidenciam que réu integra organização criminosa voltada à prática de tráfico internacional de drogas ou que se dedica a atividades criminosas. De fato, as circunstâncias do delito recomendam a incidência da causa de diminuição de pena estabelecida no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06. Não há nos autos elementos que autorizam a aplicação do benefício em fração acima do mínimo legal; aplico a redução da pena em 1/6 (um sexto).  9. Para a configuração da transnacionalidade do delito, não é necessário que o agente ou o entorpecente ultrapasse as fronteiras do País. O delito, com essa causa de aumento, pode ocorrer no território nacional, desde que haja elementos indicativos de que o fato se relacione com o estrangeiro. Na espécie, a transnacionalidade do delito restou comprovada, sendo a droga proveniente do Paraguai, razão pela qual é mantido o aumento da pena em 1/6 (um sexto). 10. No caso de tráfico ilícito de entorpecentes, as circunstâncias, as consequências e a sua gravidadeaconselham o início do cumprimento da pena em regime fechado, nos termos do art. 33, § 2º, c. c. o art. 59, caput, III, ambos do Código Penal, cabendo ao Juízo das Execuções Penais apreciar a progressão do regime de pena. 11. O Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade da vedação à conversão das penas privativas de liberdade em restritivas de direitos contida no § 4º do art. 33 e no art. 44 da Lei n. 11.343/06 (STF, Pleno, HC n. 97256, Rel. Min. Ayres Britto, j. 01.09.10), de modo que, nos delitos de tráfico transnacional de entorpecentes cumpre resolver sobre a substituição à luz do disposto no art. 44 do Código Penal. 12. Afastada a substituição da pena privativa de liberdade por penas restritivas de direitos, as quais não se mostram suficientes no caso dos autos e à míngua do preenchimento dos requisitos legais (art. 44, III, do Código Penal). 13. Apelação da defesa desprovida. Apelação da acusação parcialmente provida.  

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