ACR – 11186/PE – 0000270-51.2012.4.05.8302

RELATOR : DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO MACHADO CORDEIRO -  

Penal e processual penal. Operar instituição financeira sem autorização da susep (art. 16 da lei 7.492/86). Crime contra o sistema financeiro nacional. Sentença Condenatória. Demonstração da condição de dono e administrador das empresas. Erro de proibição. Descabimento. Continuidade delitiva. Não-configuração. Dosimetria da pena base. Presença de circunstâncias judiciais desfavoráveis. Confissão espontânea (art. 65, iii, "d", do código penal). Inexistência. Culpabilidade Demonstrada. Improvimento das apelações dos réus e provimento da apelação do Ministério público federal. - Trata-se de apelações criminais interpostas pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e por JOSÉ ARLINDO ALEXANDRE e JACKSON JOSÉ ALEXANDRE contra sentença proferida pelo Juízo da 24ª Vara Federal de Pernambuco, que os condenara pela prática do crime previsto no art. 16 da Lei 7.492/86, respectivamente, a 3 (três) anos e 4 (quatro) meses de reclusão e a 4 (quatro) anos de reclusão, além de 200 (duzentos) dias-multa na fração de 1/10 (um dez avos) salário-mínimo vigente à época do delito para cada um deles. - Irresignados com o decreto condenatório, os réus JOSÉ ARLINDO ALEXANDRE e JACKSON JOSÉ ALEXANDRE interpuseram recurso de apelação, invocando as seguintes razões: a) negativa de prática criminosa para o JOSÉ ARLINDO, dada a fragilidade da prova produzida que não comprovou, de maneira cabal, ser ele coproprietário das empresas ASSOCIAÇÃO AMIGO DO CAMINHONEIRO e ESTILO SEGURO; b) erro de proibição, pois os réus não tinham consciência da ilicitude, sobretudo porque ostentam baixa escolaridade; c) prática criminosa em continuidade delitiva, e não em concurso material, em virtude de os réus terem constituído duas empresas, e não apenas uma; d) na dosimetria da pena, o juiz a quo avaliou equivocadamente as circunstâncias judiciais (art. 59 do CP) dos antecedentes, da conduta social e dos motivos, devendo a pena base ser estipulada no mínimo legal previsto em abstrato. - Também inconformado com a condenação sentencial, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL assevera, em fórmula sintética, que a sentença condenatória aplicou equivocadamente atenuante da confissão espontânea ao réu JACKSON JOSÉ ALEXANDRE, desenhada no art. 65, inciso III, letra "d", do Código Penal, na medida em que se operou, a bem da verdade, confissão qualificada. - Configura o crime contra o sistema financeiro nacional delineado no art. 16 da Lei 7.492/86, a conduta de fazer operar, sem a devida autorização, instituição financeira, inclusive de distribuição de valores mobiliários ou de câmbio. - A análise cuidadosa do presente caderno processual bem revela a existência de elementos de prova suficientes e robustos, calcados primordialmente em prova testemunhal, que conduzem à constatação da efetiva prática da conduta delituosa descrita no art. 16 da Lei 7.492/86, com a consequente condenação dos réus. - A prova caminha toda no sentido de inferir que JOSÉ ARLINDO ALEXANDRE, embora não constasse nos contratos sociais das empresas em tela como sócio-gerente, apresentava-se ao lado de seu filho, ora também réu, como um dos proprietários, donos e efetivos administradores, devendo também responder pelo delito do art. 16 da Lei 7.492/86. - Não apenas a testemunha Nathália Cavalcante Prazeres assim afirmou, malgrado não conhecesse maiores detalhes, até mesmo porque permaneceu nas empresas apenas por dois meses (agosto e setembro de 2012), mas notadamente a testemunha Rubiana Tereza da Silva, ao ratificar em juízo o depoimento que prestara na Polícia Federal (fls. 36/37 do IPL 1065/2012), foi enfática, segura e precisa em afirmar que JOSÉ ARLINDO ALEXANDRE apresentava-se sempre como dono, não podendo, assim, invocar a tese de negativa de prática de conduta criminosa. O organograma constante à fl. 45 do IPL 1065/2012 corrobora a constatação apurada pelos próprios funcionários que laboraram nas empresas em questão. - Inclusive, na concretização da operação nas empresas pela Polícia Federal, JOSÉ ARLINDO ALEXANDRE identificou-se como um dos proprietários, manifestando, inequivocamente, consciência e vontade de praticar a conduta imputada no tipo penal inscrito no art. 16 da Lei 7.492/86 a revelar a existência do elemento subjetivo do tipo (dolo). - No erro de proibição (art. 21 do Código Penal), o agente desconhece a ilicitude do ato que pratica, imaginando estar em conformidade com a ordem jurídica. Não tem o autor do fato potencial consciência da ilicitude e, portanto, deixa de emitir juízo de reprovabilidade, o que leva à exclusão da sua culpabilidade. - Na espécie em apreço, ficou provado, através do depoimento prestado em juízo e no ambiente policial pela testemunha PF José Oliveira Lima Júnior, que, no momento da abordagem da operação que culminou com a prisão e com a busca e apreensão de documentos na sede das empresas investigadas, os réus informaram que estavam atuandosem autorização da SUSEP. Por isso mesmo, os réus, ao contrário do que alegam, sabiam da existência da SUSEP e sabiam que necessitam de autorização prévia para operarem. - Sem olvidar que não há necessidade de conhecimentos técnicos ou específicos para simplesmente se saber que a atividade empresarial securitária precisa de autorização de algum órgão para operar. A isso não se exije, aliás, qualquer mínimo conhecimento especializado. - Não se pode reconhecer na espécie a continuidade delitiva entre ambos os crimes cometidos no instante do início das atividades da instituição financeira sem autorização do órgão competente (crime de mera conduta), diante do caráter independente e autônomo que possuem entre si. A ASSOCIAÇÃO AMIGO DO CAMINHONEIRO principiou as atividades, a partir de fevereiro de 2009. A ESTILO SEGURO, por sua vez, a partir de fevereiro de 2011. Logo, houve lapso temporal de longos dois anos entre uma prática criminosa e outra, não se admitindo, nesta situação, continuidade delitiva. - Houve justificativa plausível para estabelecer a pena base acima do mínimo legal, com arrimo na prevalência de aspectos negativos na apuração das circunstâncias judiciais pessoais e objetivas, que superaram as favoráveis. Em princípio, analisou, uma a uma, as circunstâncias judiciais previstas pelo art. 59 do CPB, encontrando as consideradas desfavoráveis, o que levou o juiz a fixar a pena-base acima do mínimo legal de 1(um) ano. - Em momento algum, referido réu confessou a prática do crime de fazer operar instituição financeira, sem autorização do órgão a tanto competente, tendo, inclusive, no interrogatório que prestou perante o juiz singular, alegado que desconhecia a própria existência da SUSEP e de que precisava postular autorização perante esse órgão fiscalizatório de seguros. Nem sequer confessou, em sede de inquérito policial, sempre tendo ressaltado a sua ignorância quanto à necessidade de tomar cautelas quanto às operações nitidamente financeiras que findou por realizar. Confessar significa reconhecer que se encontrava praticando conduta criminosa. JACKSON JOSÉ ALEXADRE não admite, em qualquer fase inquisitorial ou processual, que praticou o crime do art. 16 da Lei 7.492/86. Ao contrário, tenta, para exonerar a sua culpabilidade, invocar a excludente de erro de proibição. Por isso mesmo, não deve incidir na espécie a atenuante de confissão espontânea prevista no art. 65, inciso III, letra "d", do Código Penal brasileiro. (Precedente do STJ: HC 197.395/DF, Rel. Min. Laurita Vaz, 5ª Turma, unânime, j. 23/04/2013). - Nesta linha de pensar, impõe-se a acolhida do apelo criminal do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, para excluir da dosimetria da pena a redução decorrente da aplicação da atenuante de confissão espontânea prevista no art. 65, III, alínea "d", do Código Penal, ficando a pena definitiva e concreta de JACKSON JOSÉ ALEXANDRE em 4 (quatro) anos de reclusão nos mesmos moldes já estabelecidos para o réu JOSÉ ARLINDO ALEXANDRE quanto à aplicação da pena de multa (item 4.1.4), ao concurso material e pena definitiva (item 4.2), ao regime inicial de cumprimento (item 4.3), à substituição da pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos, ao valor mínimo de indenização, à pena de perdimento de bens e o cancelamento do registro perante a Junta Comercial e às providências finais estipuladas na sentença condenatória ora hostilizada. - Improvimento da apelação dos réus e provimento do apelo do Ministério Público Federal. 

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