ACR – 11561/RN – 2007.84.00.000235-2 [0000235-64.2007.4.05.8400]

RELATOR : DESEMBARGADOR PAULO ROBERTO DE OLIVEIRA LIMA -  

Penal. Processual penal. Cinco réus. Persecução por falsidade ideológica (cp, art. 299) E associação criminosa (cp, art. 288). Provimento do apelo do mpf apenas na parte em Que requer extinção da punibilidade de um dos réus, falecido, e para aplicar, Quanto a outro, a agravante do cp, art. 62, i. Inocorrência de associação criminosa. Reconhecimento da prescrição retroativa para três acusados, cujas apelações Restam prejudicadas. Improvimento do apelo interposto pelo réu remanescente. 1. De acordo com a denúncia, JOÃO MARIA DE ANDRADE, na qualidade de servidor da Receita Federal, teria realizado alterações irregulares na base de dados do Cadastro de Pessoa Física (CPF), emitindo, cancelando e alterando documentos mediante encomendas dos outros corréus (ABELMÁRIO DE FREITAS BARROS, JOÃO GOMES DA SILVA, JOSÉ ALBERTO CASSIANO DE OLIVEIRA e FRANCISCO MARCELINO SANTANA FILHO); 2. Segundo o MPF: (i) no dia 31/03/2000, o denunciado Abelmário foi preso em flagrante portando documentos falsos (CPFs, várias carteiras funcionais e cédulas de identidade com números diferentes, todos munidos de fotografia, mas preenchidos com dados divergentes); (ii) no decorrer das investigações, foi apurado que Abelmário teria se associado com João Maria de Andrade, servidor da Receita Federal, para confecção e venda de documentos falsificados, utilizando, como base da empreitada criminosa, a sede de um escritório (oferecida pelo também acusado José Alberto Cassiano de Oliveira, sendo que lá foram apreendidos documentos falsos em nome de várias outras pessoas); (iii) José Alberto Cassiano de Oliveira seria possuidor de duas carteiras de identidade e dois CPFs com dados diferentes; (iv) João Maria também emitia CPFs irregulares a pedido do réu João Gomes da Silva, recebendo a quantia de R$ 120,00 (cento e vinte reais) por cada emissão; (v) Francisco Marcelino teria recorrido aos serviços de falsificação de João Maria de Andrade Lima por intermédio de João Gomes, pagando a quantia de R$ 300,00 (trezentos reais) para a confecção de três carteiras de identidade com nomes diferentes, bem como de vários CPF's; 3. Finda a instrução, os réus foram absolvidos pelo crime de associação criminosa, com base no Art. 386, I, do CPP, mas foram condenados nas penas do Art. 299 do Código Penal, em continuidade delitiva (CP, Art. 71); 4. O MPF apelou. Postula, em primeiro lugar, a extinção da punibilidade quanto ao réu ABELMÁRIO DE FREITAS BARROS, tendo em vista seu falecimento; demais disso, pediu a condenação dos demais réus pelos crimes de associação criminosa, bem como a majoração das penas já aplicadas pelo delito do Art. 299. Os réus, a esta altura, pugnam a absolvição por insuficiência de provas e a diminuição das penas impostas; 5. Ante a comunicação do falecimento do réu e à vista da certidão de óbito de fl. 371, declara-se extinta a punibilidade do réu Abelmário de Freitas Barros, nos termos do Art. 107, I, do CP, dando-se provimento ao apelo do MPF nesta parte; 6. Quanto ao crime de "associação criminosa", é certo que, ao tempo das ações praticadas, a redação do tipo penal em comento exigia o concurso de ao menos 4 (quatro) pessoas para sua caracterização. No caso em tela, dos depoimentos e elementos acostados aos autos, verifica-se que o acusado João Gomes da Silva tinha uma estreita relação de amizade com o réu João Maria de Andrade, bem como intermediou o contato de Francisco com este. Contudo, não há qualquer evidência de que João Gomes da Silva tivesse contribuído com os réus Abelmário de Freitas Barros e José Alberto Cassiano de Oliveira no cometimento dos crimes de falsidade; 7. Ademais, os pretensos indícios do ânimo associativo apontados pelo MPF - que não passam de frágeis ilações - sequer demonstram de que maneira João Gomes da Silva estaria participando ou contribuindo, de forma estável e permanente, para as ações de João Maria, Abelmário e José Alberto Cassiano, estes, sim, entre si, associados no intento de cometer crimes. Isso posto, é de ser mantida a absolvição pelo crime de "quadrilha", na redação anterior à alteração realizada pela Lei n° 12.850/2013; 8. Resta a análise pelo crime do Art. 299 (culpabilidade, debatida pelos réus; dosimetria, discutida pelo MPF); 9. Não merece acolhida o apelo do réu JOÃO MARIA DE ANDRADE LIMA, que alega insuficiência de provas para a condenação. A exigência de vantagem econômica não é elementar o crime em tela, não interferindo na tipicidade da conduta. Ademais, a autoria deste apelante encontra-se fartamente comprovada nos autos, mormente pelos depoimentos dos outros corréus e de servidores do Ministério da Fazenda, os quais informaram que sindicância instaurada (administrativamente) constatou irregularidades no cadastro realizadas por ele (fls. 76/77, 87/88, IPL), não merecendo crédito a tese de que as faltam tivessem sido cometidas a vista de documentos apresentados pelos contribuintes, por ausência de lastro probatório que lhe dê suporte; 10. A análise do pleito ministerial, no que alude à exasperação das penas cominadas por falsidade, leva à conclusão de que, quanto a três dos réus (JOÃO GOMES DA SILVA, JOSÉ ALBERTO CASSIANO DE OLIVEIRA e FRANCISCO MARCELINO SANTANA FILHO), deve ser improvido, sendo parcialmente provido quanto ao quarto (JOÃO MARIA DE ANDRADE LIMA); o quinto é o réu falecido (ABELMÁRIO DE FREITAS BARROS); 9. Inexiste previsão ou fundamento legal para a adoção de um critério objetivo e matemático na determinação do patamar inicial da pena-base, ao qual o magistrado estivesse vinculado (conforme precedentes STJ), de modo que todas as penas-bases, em relação a todos os réus, porque adequadamente estipuladas, devem ser mantidas (aumentá-las apenas pelo propósito de fugir da prescrição não é juridicamente admissível); 11. Deve ser provido o apelo do MPF quanto à aplicação da agravante prevista no Art. 62, I, do CP, relativamente ao réu JOÃO MARIA DE ANDRADE, haja vista sua condição de pivô central dos crimes, ou seja, o principal responsável por toda engrenagem criminosa, a qual, induvidosamente, promovia; 12. Sabe-se que, por força da Súmula 497 do STF, deve-se excluir o acréscimo decorrente da continuidade delitiva para fins de cálculo do prazo prescricional, pelo que devem ser consideradas as seguintes penas: JOÃO GOMES DA SILVA, 01 (um) ano e 08 (oito) meses de reclusão, mais 112 (cento e doze) dias-multa; JOSÉ ALBERTO CASSIANO DE OLIVEIRA, 01 (um) ano e 10 (dez) meses de reclusão, mais 185 (cento e oitenta e cinco) dias-multa; FRANCISCO MARCELINO SANTANA FILHO, 01 (um) ano e 05 (cinco) meses de reclusão, mais 75 (setenta e cinco) dias-multa. 13. Passados, então, mais de 06 (seis) anos entre a data do recebimento da denúncia (27/02/2007, cf. fls. 14/15) e a da sentença (04/06/2013, cf. fls. 366), constata-se lapso temporal suficiente para que seja reconhecida a prescrição retroativa pela pena aplicada, a gerar a extinção da punibilidade, a teor do que dispõe o Art. 109, V, do CP, o qual prevê o prazo de 04 (quatro) anos para prescrição da pena superior a 01 (um) ano e não excedente a 02 (dois), comunicada para a pena de multa que haja sido cominada (CP, Art. 114, II); 14. Havendo a ocorrência da prescrição retroativa, é de ser reconhecida mesmo ex officio, matéria de ordem pública que é, jamais sujeita aos rigores da preclusão; 15. Importante salientar que as alterações formuladas pela Lei nº 12.234/2010 ao CP, Art. 110, §§ 1º e 2º --- impedindo o cômputo da prescrição retroativa a partir de termo anterior ao momento do recebimento da denúncia ---, não se aplicam à hipótese, vez que os autos tratam de fatos anteriores ao advento da mencionada modificação legislativa, e a Lei Penal somente retroagirá em benefício do réu (CF, Art. 5º, XL); 16. Como consequência da manutenção das penas privativas de liberdade, é de ser reconhecida, então, a ocorrência da prescrição retroativa com relação aos réus JOÃO GOMES DA SILVA, JOSÉ ALBERTO CASSIANO DE OLIVEIRA E FRANCISCO MARCELINO SANTANA FILHO, cujos apelos, assim, restam prejudicados - Súmula nº 241 do extinto TFR; 17. Quanto à condenação de JOÃO MARIA DE ANDRADE LIMA: i) pena-base (mantida como em sentença): 01 ano e 10 meses de reclusão; ii) segunda fase: incide a agravante do CP, Art. 62, I, ou seja, mais 06 meses, totalizando-se, provisoriamente, 02 anos e 04 meses de reclusão; iii.1) terceira fase: causa de aumento mercê da condição de funcionário público (CP, Art. 299, Parágrafo Único), ou seja, mais 1/6, equivalentes a 04 meses e 20 dias de reclusão; iii.2) ainda em terceira fase: causa de aumento por continuidade delitiva, na fração adotada em primeiro grau, de 2/3 (conforme CP, Art. 71), ou seja, mais 01 ano, 06 meses e 20 dias; iv) pena privativa de liberdade final: 04 anos, 03 meses e 10 dias de reclusão, em regime inicial semiaberto, com perda do cargo público (CP, Art. 92, I, "a"); v) mantém-se a pena de multa cominada em primeiro grau; 18. Parcial provimento da apelação do Ministério Público Federal; prescrição retroativa reconhecida em favor de João Gomes da Silva, José Alberto Cassiano de Oliveira e Francisco Marcelino Santana Filho, cujos apelos restam prejudicados; apelo de João Maria de Andrade Lima improvido.  

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