REL. DES. CECILIA MELLO -
Revisão criminal. Processo penal. Da justiça gratuita. Da alegação de nulidade quanto à citação - improcedência - comparecimento do réu a interrogatório que supre eventual vício de citação. Da intimação pessoal do requerente para tomar ciência da sentença condenatória - desnecessidade - intimação do advogado constituído nos autos - questão já decidida em sede de habeas corpus. Da alegação de insuficiência probatória - impossibilidade de discussão em sede de revisão criminal. Da pena-base - dos maus antecedentes - anulação posterior de processo considerado na dosimetria - da pena-base. I. Deferido o benefício da gratuidade da justiça, nos termos da Lei nº 1.060/50, diante do pedido do autor e por não haver prova de que ele possa arcar com as despesas do processo. II. As hipóteses em que se admite a revisão criminal estão previstas no artigo 621, do CPP - Código de Processo Penal e no artigo 626, também do CPP, que prevê a possibilidade de revisão criminal quando demonstrada uma nulidade absoluta do processo criminal. III. Ainda que o autor não tenha sido regularmente citado na unidade prisional na qual se encontrava recolhido, tal nulidade relativa teria sido suprida pelo seu comparecimento em juízo para audiência de interrogatório, em função do quanto estabelecido expressamente no artigo 570, do CPP. Não prospera a alegação de que, em razão da falta de citação do autor, "não houve qualquer possibilidade de amplitude de defesa", tendo em vista que (i) o autor constituiu advogado quase 3 meses antes de ser interrogado; (ii) o advogado constituído pelo autor o acompanhou no seu interrogatório; (iii) o juiz, conforme certificado nos autos, cumpriu o determinado no artigo 186, do CPP, ou seja, cientificou o autor do inteiro teor da acusação, o informou do seu direito de permanecer calado e de não responder perguntas que lhe forem formuladas; e que (iv) no interrogatório, na resposta à acusação e nas alegações finais, defendeu-se, em síntese, a mesma tese sustentada nesta revisão criminal. Não há, pois, como se vislumbrar que, in casu, fora sonegado ao autor o direito de se orientar adequadamente com a sua defesa, tampouco que a sua defesa técnica fora deficiente. IV. Nos termos do artigo 392, II, do CPP, estando o réu solto, não se faz necessária a sua intimação para tomar ciência da sentença condenatória, se o seu advogado constituído nos autos tiver sido notificado para tomar ciência da sentença. Destarte, considerando que no caso sub judice, o autor estava solto e que seu advogado constituído nos autos em que proferida a decisão revisanda foi devidamente intimado pela imprensa oficial para tomar ciência da sentença condenatória ali prolatada, constata-se que a intimação pessoal do ora autor para tomar ciência desta afigurava-se, nos termos da lei, dispensável, de modo que as alegadas irregularidades em relação à intimação pessoal do autor não configuram nulidades que autorizam a revisão do julgado, na forma do artigo 621 e 626, do CPP. Acresça-se que a questão suscitada pelo requerente no bojo desta revisão criminal já foi decidida no habeas corpus de n. 2014.03.00.029801-0/SP (fls. 2.540/2.546 do apenso), no qual a Egrégia Quinta Turma desta Corte concluiu que "Não há falar, portanto, em defeito que torne sem efeito o trânsito em julgado em relação ao réu por suposta violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa, uma vez que a defesa teve ciência da sentença em conformidade com as disposições legais e quedou-se inerte no prazo legal para a interposição de recurso de apelação". A decisão proferida no writ encontra-se amparada por posicionamento agasalhado pela jurisprudência pátria sobre o tema, tendo ela conferido interpretação razoável ao artigo 392, II, do CPP, o que igualmente interdita a revisão do julgado na forma pleiteada pelo requerente. V. A legislação de regência só admite a revisão criminal quando a sentença condenatória é contrária à evidência dos autos (artigo 621, I, do CPP). É dizer, para que a decisão impugnada seja desconstituída por ser contrária à evidência dos autos, é preciso que referido decisum não encontre qualquer apoio na prova produzida no bojo do processo criminal em que proferido. O C. STJ tem reiteradamente decidido que "O acolhimento da pretensão revisional deve ser excepcional, cingindo-se às hipóteses em que a contradição à evidência dos autos seja manifesta, estreme de dúvidas, dispensando, pois, a interpretação ou análise subjetiva das provas produzidas", não sendo a revisão criminal a via processual adequada para se buscar a absolvição por insuficiência ou falta de provas, pois não se trata de um segundo recurso de apelação. Na situação vertente, o que o requerente realmente busca é a desconstituição do julgado ao fundamento de que as provas residentes nos autos seriam insuficientes para ensejar a sua condenação, o que, nos termos da jurisprudência pátria, inclusive do C. STJ. Além disso, a pretensão deduzida na presente ação autônoma de impugnação demanda uma reanálise das provas produzidas no processo de origem, o que é igualmente inviável neste momento processual. Por fim, não se vislumbra uma manifesta contradição entre a decisão impugnada e a evidência dos autos; pelo contrário, o decisum afigura-se devidamente fundamentado, indicando a prova residente nos autos que ampara a sua conclusão. A rejeição da pretensão revisional nesse particular é, portanto, medida imperativa. VI. Segundo a jurisprudência do C. STJ, em sede de revisão criminal, só se admite que a decisão impugnada seja revisada, quando há na dosimetria uma flagrante ilegalidade, já que o reexame da dosimetria exige uma análise dos elementos probatórios residentes nos autos, o que, via de regra, é incompatível com tal remédio processual, o qual não pode ser utilizado como se apelação fosse. VII. A decisão impugnada não violou o princípio da individualização da pena, penso que razão não assiste ao requerente. Ela, muito embora tenha reconhecido como desfavoráveis ao autor algumas circunstâncias judiciais também aplicadas aos demais réus, assim o fez de forma fundamentada, apresentando os motivos que justificavam tal providência em relação ao requerente, individualizando, destarte, a pena a ele aplicada. Logo, não há que se falar em violação ao princípio da individualização da pena, tampouco em manifesta ilegalidade no particular. VIII. No que tange aos antecedentes, o r. decisum impugnado deixou de considerar que: (i) foi extinta a punibilidade do réu quanto ao crime objeto do inquérito 0039/1984 e dos processos 313/1984 e 61885, conforme certidão de fl. 1.449; (ii) o réu foi absolvido da imputação objeto do inquérito 0129/1994 e do processo de n. 1768/1993, conforme certidão de fl. 1.329; e que (iii) foi extinta a punibilidade do réu quanto ao crime objeto do inquérito 0327/1994 e do processo 402108/1994, conforme decisão proferida na Revisão Criminal de n. 97.03.074884-8. Considerando que (a) a punibilidade do recorrente foi extinta em relação a dois dos delitos a ele imputados; (b) ele foi absolvido em um dos processos contra ele ajuizado; e (c) que os demais apontamentos constantes na folha de fls. 586/587 (inquérito 0272/1999 e processo de n. 2627/1999) se referem ao delito objeto do processo no qual foi proferida a sentença ora impugnada; forçoso é concluir que os apontamentos constantes da folha de antecedentes de fls. 586/587 não poderiam ter sido valorados negativamente na primeira fase da dosimetria da pena, tendo a decisão impugnada contrariado de forma manifesta a prova residente nos autos. IX. Os demais argumentos utilizados na decisão atacada - a) extrema reprovabilidade de sua conduta, tendo em vista que o autor e seus comparsas "faziam parte da organização criminosa intermediando a introdução em circulação de vultosas quantias de moeda falsa denotando clara motivação para a prática do crime que objetivava lucro ilícito e desmedido"; e b) audácia, premeditação e a maquinação intelectual, haja vista que "a quantidade de cédulas contrafeitas apreendidas, qual seja, um milhão setecentos e vinte e quatro mil e setecentos dólares americanos falsos, revela a audácia, premeditação e a maquinação intelectual dos envolvidos para a prática do crime praticado contra a fé pública que lesa ou expõe a perigo de lesão a própria coletividade" - para exasperar a pena-base, não ensejam ilegalidade manifesta que autorize a desconstituição do julgado. Ainda que se possa discordar da fundamentação adotada pelo magistrado prolator da decisão atacada, é certo que ele se valeu de um critério compatível com a legislação de regência, não sendo a estreita via da revisão seara cabível para se discutir tal critério e os posicionamentos adotados no julgado em tela. As circunstâncias negativamente valoradas no decisum impugnado, ao reverso do quanto alegado pelo autor, não configuram elementares do tipo penal do artigo 289, do CP, de sorte que não prospera a assertiva de que elas "já foram utilizadas como fundamento pelo legislador para mensurar a pena cominada no preceito secundário da norma penal incriminadora prevista no art. 289 do Código Penal". Elas foram sopesadas segundo critérios subjetivos razoavelmente empregados pelo magistrado sentenciante, dentro dos limites previstos em lei e em consonância com a jurisprudência da época, não se divisando, assim, nulidade manifesta que autorize a revisão do julgado no particular. X. Revisão Criminal parcialmente acolhida.
Para ler o documento na íntegra, clique aqui!