APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0008234-03.2005.4.03.6102/SP

REL. DES. ANDRÉ NEKATSCHALOW -  

Penal. Processo aliciamento de trabalhadores de um local para outro do território nacional. Materialidade e autoria. Comprovação. Dosimetria. Apelações não providas. 1. Por não haver trânsito em julgado para a acusação, a prescrição é regulada pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao delito, nos termos do art. 109 do Código Penal. A pena máxima prevista para o delito do art. 207, caput e § 1º, do Código Penal, é de 3 (três) anos de detenção, cujo prazo prescricional é de 8 (oito) anos, a teor do inciso IV do art. 109 do Código Penal. 2. Entre o fato (04.02.05, fl. 95) e o recebimento da denúncia (25.06.09, fl. 98) transcorreu período aproximado de 4 (quatro) anos e 4 (quatro) meses. Entre o recebimento da denúncia (25.06.09, fl. 98) e a publicação da sentença condenatória (02.12.15, fl. 554), decorreram 6 (seis) anos, 5 (cinco) meses e 7 (sete) dias. Contado o prazo prescricional a partir da publicação da sentença condenatória (02.12.15, fl. 554), a prescrição está prevista para ocorrer em 01.12.23. Portanto, não está prescrita a pretensão punitiva estatal com base na pena prevista em abstrato. 3. A materialidade delitiva está satisfatoriamente comprovada quanto ao recrutamento de trabalhadores fora da localidade de execução do trabalho, mediante cobrança de qualquer quantia, conforme decorre dos seguintes elementos de convicção: a) termos de declaração e de interrogatório do réu, condutor do veículo; b) termos de declaração dos trabalhadores; c) termos de declaração e de oitiva do policial rodoviário federal que interceptou o veículo. 4. Em 04.02.05, policial rodoviário federal interceptou caminhão em cujo compartimento de carga, coberto por lona, eram transportadas 5 (cinco) trabalhadores. O policial rodoviário federal afirmou que a interceptação ocorreu na BR 101, em Alagoas, e que os documentos de identidade de todos os transportados estavam em poder do condutor do veículo (fls. 18/19). As declarações do policial rodoviário federal foram por ele confirmadas em sede judicial. 5. Malgrado os trabalhadores tenham declarado à Autoridade Policial que se organizaram para entrar em contato com o condutor do veículo, a ele prestando contribuição financeira espontânea que variou entre R$ 20,00 (vinte reais) e R$ 30,00 (trinta reais) (fls. 8/17), as circunstâncias da apreensão do veículo comprovam que o transporte foi realizado com a finalidade de recrutar trabalhador para execução de serviço fora da localidade. 6. O réu declarou à Autoridade Policial ser motorista autônomo (transporte de carga e de passageiros). Alegou ter realizado o transporte de pertences de vários trabalhadores, de Batatais (SP) para Quipapá (PE) e que, para não voltar de caminhão vazio, decidiu transportar os trabalhadores, deles cobrando apenas os custos com combustível e hospedagem (fl. 7). Em Juízo, o réu apresentou versão diversa. Afirmou que trabalhava para a empresa Anatur, sediada em Goiás e que, em fevereiro de 2005, havia transportado turistas para Alagoas, aproveitando a viagem para visitar parentes em Pernambuco. Na data da interceptação do veículo (ocorrida em 04.02.05), "tinha voltado ao Nordeste para transportar arame da empresa Morlan (em Orlândia, SP) e roçadeiras da empresa Baldan (em Matão, SP), para os municípios de Feira de Santana, BA, e Catende (PE)". Embora admita conhecer os trabalhadores transportados, aduz que os "apanhou" na viagem de retorno e negou saber que iriam "cortar cana" em Batatais (fl. 176v). 7. As declarações do réu não encontram respaldo nos autos, à míngua de elementos que comprovem a realização de fretes para as empresas e que esclareçam os motivos pelos quais estava na posse dos documentos de identidade dos trabalhadores. O fato de apenas um dos trabalhadores, ter sido localizado e ouvido em juízo não permite infirmar as circunstâncias em que ocorreu a interceptação do veículo, suficientes para a comprovação da autoria delitiva. No mesmo sentido, a alegação do réu de que as testemunhas referidas na sentença recorrida referem-se a processo diverso. 8. Em observância ao art. 59 do Código Penal, o Juízo a quo fixou a pena-base no mínimo legal, 1 (um) ano de detenção e 10 (dez) dias-multa. Na ausência de circunstâncias atenuantes ou agravantes e causas de aumento ou de diminuição, a pena foi tornada definitiva. Fixado o regime inicial de cumprimento aberto e o valor unitário do dia-multa em 1/10 (um décimo) do salário mínimo. A pena privativa de liberdade foi substituída por 1 (uma) pena restritiva de direitos, consistente em prestação de serviços à comunidade. 9. A acusação apela da dosimetria da pena e requer a majoração da pena-base em razão das circunstâncias do crime, da personalidade e maus antecedentes do réu. Passo a rever a dosimetria da pena. Justifica-se a fixação da pena-base acima do mínimo legal, considerando-se o número de trabalhadores transportados e a significativa distância entre a localidade em que foram recrutados (Quipapá, Pernambuco) e a localidade na qual executariam o trabalho (Batatais, São Paulo), a indicarem a maior reprovabilidade da conduta do réu. 10. Os documentos juntados aos autos pelo Ministério do Trabalho, embora mencionem "Nilton" com condutor de um veículo que transportava trabalhadores para Batatais, não são suficientes para afirmar tratar-se do réu, à míngua de maior individualização da pessoa indicada. Ademais, não consta que tenha sido instaurado inquérito policial ou que o réu tenha sido denunciado pelos fatos que são referidos às fls. 243/281 (inquérito policial instaurado contra José Roberto da Silva). Acrescente-se ser vedada a utilização de inquéritos e processos em curso para agravar a pena-base (STJ, Súmula n. 444). 11. Assim, a pena-base deve ser fixada 1/6 (um sexto) acima do mínimo legal, em 1 (um) ano e 2 (dois) meses de detenção e 11 (onze) dias-multa. Ausentes circunstâncias agravantes ou atenuantes e causas de aumento ou de diminuição, torna-se definitiva a pena. À míngua de recurso das partes, e em razão da pena definitiva fixada, mantendo o regime inicial de cumprimento aberto e o valor unitário do dia-multa em 1/10 (um décimo) do salário mínimo, bem como a substituição da pena privativa de liberdade por 1 (uma) pena restritiva de direitos, consistente em prestação de serviços à comunidade. 12. Apelação do réu não provida. Apelação do Ministério Público Federal provida em parte, para majorar a pena-base e condenar o réu à pena definitiva de 1 (um) ano e 2 (quatro) meses de detenção e 11 (onze) dias-multa, mantida, no mais, a sentença. 

Para ler o documento na íntegra, clique aqui!

Comments are closed.