ACR – 10893/CE – 0000934-37.2011.4.05.8102

RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL CID MARCONI -  

Penal. Ex-prefeita municipal. Ex-secretária da educação e ex-secretário de administração. Delito cometido no exercício do cargo. Artigo 89 da lei nº 8.666/93. Dispensa indevida de licitação. Falta de demonstração de prejuízo ao erário e do dolo específico. Lesão ao patrimônio público como elementar do crime de dispensa de licitação. Necessidade da prova da vontade deliberada de causar dano ao erário. Ausência de prova das elementares do crime pela acusação. Absolvição dos réus. 1. Apelação Criminal interposta pelo Ministério Público Federal e pelo ex-Secretário da Administração da sentença que absolveu a ex-Secretária de Educação e a ex-Prefeita do Município de Campos Sales/CE, dos crimes previstos nos arts. 89, da Lei nº 8.666/93 e 1º, IV, do Decreto-lei nº 201/67 e condenou o então Secretário de Administração pela prática do crime previsto no art. 89, da Lei nº 8.666/93 à pena de 04 (quatro) anos de detenção e 2% (dois por cento) sobre o montante do contrato indevido, valorado em R$ 909.811,93 (novecentos e nove mil, oitocentos e onze reais noventa e três centavos), substituindo a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos a serem indicadas pelo Juízo das Execuções Penais. 2. Segundo o MPF, os Réus, no ano de 2001, teriam empregado recursos do FUNDEF em desacordo com os planos ou programas a que se destinavam, dispensando/inexigindo licitação para a aquisição de produtos e serviços para as escolas municipais requerendo a condenação das Rés nas penas do art. 89, da Lei nº 8.666/93 e o aumento de pena-base do Réu, de forma a que ele fosse fixada em patamar superior ao mínimo legal. 3. A jurisprudência do eg. Superior Tribunal de Justiça, a partir de 29 de março de 2012, no julgamento do "leading case", no caso, a Ação Penal nº 480/MG, por maioria, acolheu a tese de que a tipificação do delito contido no art. 89 da Lei nº 8.666/93 exige a concomitância do dolo específico de lesar o erário com a demonstração do prejuízo efetivo advindo da não observância do procedimento licitatório. 4. As penas do art. 89, da Lei nº 8.666/93 devem ser aplicadas aos agentes que agem com o intuito de causar dano ao erário, acarretando uma lesão efetiva, e não àqueles que, por não possuírem habilitação jurídica ou técnica específica, ou mesmo por falta de experiência ou capacitação técnica acabem violando as normas legais no intuito de beneficiar de forma imediata o Município, sem qualquer intenção de causar dano ao Estado. 5. Ausência de prova capaz de evidenciar o prejuízo ao erário (elemento objetivo em conformidade com a atual jurisprudência do STJ), e o dolo específico do Apelado em lesar o patrimônio público ao contratar diretamente pessoas físicas e jurídicas para o fornecimento de material escolar, gêneros alimentícios e de transporte para as crianças e professores do ensino fundamental do Município. 6. Embora os Réus tenham efetivamente dispensado os procedimentos licitatórios, nota-se, pela descrição das despesas relativas ao FUNDEF que elas foram direcionadas à educação infantil, como a capacitação dos professores do ensino fundamental, reforma na creche, realização de seminários de educação infantil, pagamento de aluguel de prédio destinado a outra creche, formação de professores de alfabetização, aquisição de gêneros alimentícios, material permanente para as escolas, aquisição de combustível para o transporte escolar, transporte de alunos e reforma e construção de novas escolas. 7. Os pagamentos saíram da conta da Prefeitura, não havendo notícias ou provas de saques diretos na "boca do caixa" ou de pagamento de empresas ou pessoas que não fornecessem as mercadorias. Sequer houve notícias ou denúncias acerca da falta de material escolar ou de ausência de transporte para o ensino fundamental, mesmo em se tratando Município de pequeno porte, que por isso já não conta com grandes fornecedores de material e serviços capazes de satisfazer as exigências legais para se habilitarem em uma disputa de licitação, fato facilmente verificável por se tratar de Município pequeno (cerca de 12 mil habitantes). 8. A mera prática da descrição típica ("dispensar ou inexigir" ou "deixar de observar" o procedimento licitatório) pelo Apelado sem, no entanto, qualquer prova de que ele agiu com dolo específico de lesar o Erário ou de efetivação do prejuízo ao patrimônio público não configura o delito previsto pelo art. 89 da Lei nº 8.666/93 pela ausência de elementares subjetivos imprescindíveis à sua consumação. 9. Apelação do Ministério Público Federal improvida, para manter a absolvição das Rés da prática do delito previsto no art. 89, da Lei nº 8.666/93. Apelação do Réu provida, para absolvê-lo da prática do delito disposto no art. 89, da Lei nº 8.666/93 de acordo com o disposto no art. 386, III, do Código de Processo Penal.

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