ACR – 14458/AL – 0000481-18.2015.4.05.8000

RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL CID MARCONI -  

Penal e processual penal. Princípio da intervenção mínima do direito penal não incidência. Erro de tipo. Inaplicabilidade. Art. 171, § 3º, c/c o art. 71, do código penal. Estelionato em detrimento do inss. Inserção de vínculos laborativos inexistentes para obtenção de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez. Autoria e materialidade delitivas positivadas apenas com relação a um dos benefícios. Dolo comprovado. Dosimetria da pena. Consequências do delito desfavoráveis aos réus. Dolo comprovado. Majoração das penas privativas de liberdade. Substituição por penas restritivas de direitos. 1. Réus/Apelantes condenados à pena privativa de liberdade de 01 (um) ano e 04 (quatro) meses de reclusão e 13 (treze) dias-multa, cada um deles no valor de 1/20 (um vigésimo) do salário-mínimo vigente à época dos fatos pela prática do crime previsto no art. 171, § 3º, do Código Penal, por terem eles, obtido de forma fraudulenta auxílio-doença e/ou aposentadoria por invalidez pela inserção de dados falsos (tempos de serviços extemporâneos com empresas, em regra, inexistentes e com altos salários) nas Carteiras de Trabalho dos beneficiários e nos sistemas da Previdência Social, causando ao INSS um prejuízo de R$ 59.798,09 (cinquenta e nove mil, setecentos e noventa e oito reais e nove centavos). 2. A alegação de ofensa ao princípio da intervenção mínima pela subsunção da conduta dos Apelantes ao crime de estelionato não merece guarida, tendo em vista que o patrimônio é um bem jurídico constitucionalmente tutelado, de forma que não se há de falar em ilegalidade do Código Penal por punir o estelionato, conduta gravemente reprovável, sobretudo quando praticada em detrimento dos cofres públicos, e mais ainda do INSS, entidade que ainda tem caráter assistencial para milhões de brasileiros. 3. Inocorrência de erro de tipo quanto ao Apelante M. I. Ao contrário de suas alegações, fundadas na suposta ignorância acerca do processo de concessão do benefício, há, na sua conduta, a vontade consciente de receber indevidamente a aposentadoria, posto que não é crível que  ele não tinha conhecimento, ao olhar sua CTPS, que não tinha trabalhado nas empresas Suporte Manutenção e Soluções Ltda. e José Laélcio Ferreira - ME, havendo ciência de sua parte de que tais vínculos eram falsos, pelo simples fato de que nunca trabalhou em nenhuma delas. 4. Primeiro benefício, concedido a G. N. Embora o Relatório de Informação sobre Vínculos Laborais elaborado pelo INSS ateste a inexistência da empresa Alagoas Balança Ltda. e a ausência de vínculos laborais entre o Apelante G. N e a dita firma, o proprietário da empresa, em testemunho realizado em Juízo, confirmou que ela não apenas existia, como estava localizada em outro endereço, bem como o Apelante G. N. efetivamente havia trabalhado no empreendimento, quando seu pai era ainda gestor do negócio, tendo sido demitido em decorrência de problemas de saúde, mas que ele trabalhara alguns meses entre os anos de 2006/2007, e que o vínculo fora extemporaneamente inserido no CNIS. 5. Em face das informações conflitantes entre aquelas trazidas pela testemunha e pelo Relatório do INSS, seria prudente verificar se no outro endereço indicado pela testemunha, a empresa de fato estava operante e se porventura o apelado trabalhou nela. Neste aspecto, ausente a promoção de qualquer diligência apta a contrapor o conteúdo da prova testemunhal, especialmente quanto ao efetivo funcionamento em local diverso do cadastrado e à presença de G. N. no local de trabalho, deve ser aplicado o princípio "in dubio pro reo" em benefício dos Apelantes. 6. Segundo benefício, concedido indevidamente a M. I., que obteve benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez mediante a inscrição em sua CTPS de vínculos laborais inexistentes, visto que jamais trabalhara nas empresas Suporte Manutenção e Solução Ltda. e José Laélcio Ferreira - ME que constavam em sua CTPS. 7. Prova da autoria e da materialidade delitivas, pela colação dos documentos acostados, no sentido de que o Apelante C.B. inseriu os vínculos laborais falsos na CTPS de M. I. e G. N. tenha participado do delito possibilitando a inserção dos dados falsos no sistema do INSS, em face dos conhecimentos que tinha na autarquia previdenciária. 8. O crime de estelionato exige a presença do aspecto subjetivo, ou seja, o "animus" de aferir vantagem, através da utilização de artifícios fraudulentos, causando um prejuízo comprovado ao Erário Público. Resta comprovado, através da análise do "modus operandi", que os Apelantes agiram com a vontade livre e consciente de induzir em erro o INSS, auferindo vantagem financeira. 9. Réus condenados às penas-base de 01 (um) ano de reclusão. Recurso Ministerial para elevar a pena, em face de dois requisitos desfavoráveis (a culpabilidade e as consequências do crime) com relação aos Apelantes G. N. e C. B., bem como a aplicação das agravantes previstas no art. 61, I, e IV do CP, e reduzir a pena de M. I., em face da delação premiada. 10. Quanto a todos os Apelantes, a culpabilidade constitui a normal à espécie, visto que a fraude é elementar do crime do estelionato. As consequências foram graves, tendo em vista que causou ao já combalido INSS um prejuízo no valor de R$ 59.798,09 (cinquenta e nove mil, setecentos e noventa e oito reais e nove centavos), valor que poderia ser utilizado para pagamento de segurando que realmente tinha direito ao benefício. Presente 01 (um) requisito desfavorável entre os 08 (oito) previstos no art. 59, do CP, a pena-base dos Apelantes deve ser elevada para 01 (um) ano e 06 (seis) meses de reclusão. Sem atenuantes. 11. Referente apenas a G. N. e C. B., não incide ao caso a agravante prevista no art. 62, IV, do CP (participar do crime mediante paga ou promessa de recompensa), em face da ausência de prova de que os Réus G. N e C. B. tenham efetivamente recebido R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais) pelas inscrições indevidas de vínculos laborais nas CTPS. 12. Inaplicabilidade da agravante prevista no art. 62, I do CP, porque não há provas de que os Apelantes tenham cooptado pessoas para a obtenção de benefícios fraudulentos de como líderes ou organizadores do esquema de fraudes, sendo partícipes dele. Manutenção da pena-base em 01 (um) ano e 06 (seis) meses de reclusão. 13. Em seguida, deve ser aplicada a causa de aumento de pena prevista no § 3º, do art. 171, do CP, ficando a pena definitiva em 02 (dois) anos de reclusão para C. B e G. N, a ser iniciada em regime aberto, mantida a substituição da pena privativa de liberdade em duas penas restritiva de direitos, consistentes na prestação de serviços à comunidade, e na limitação de fim de semana, conforme o art. 48 do Código Penal, bem como a pena de multa, fixada em 13 (treze) dias-multa, cada um deles no valor de 1/20 (um vigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos. 14. Apenas quanto ao Apelante M. I., partindo da pena-base de 01 (um) ano e 06 (seis) meses de reclusão, incide a atenuante de confissão espontânea, reduzindo-se a pena ao mínimo legal de 01 (um) ano de reclusão, deixando-se de aplicar a redução em face da idade (art. 65, I, do CP), em face do disposto na Súmula nº 231, do STJ. 15. Presente a causa de aumento descrita na parte especial do Código Penal, no § 3º, do art. 171, do CP e também a aplicação da causa de redução da pena prevista art. 14, da Lei nº 9.807/99, relativa à delação premiada, na fração de 2/3 (dois terços), deve a pena ser reduzida em 1/3 (um terço), ficando em 08 (oito) meses de reclusão, tornada definitiva, a ser cumprida em regime aberto. 16. A pena privativa de liberdade será substituída por apenas 01 (uma) pena restritiva de direitos, consistente na limitação de fim de semana, conforme o art. 48 do Código Penal e a pena de multa reduzida para o mínimo legal de 10 (dez) dias-multa, cada um deles, no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos. 17. Apelação dos Réus improvidas. Apelação do MPF provida, em parte, para aumentar as penas privativas de liberdade de G. N. e de C. B., e para reduzir a pena privativa de liberdade de M. I. a patamar inferior ao mínimo legal pela redução da pena prevista em delação premiada.

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