O ministro-decano Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), rejeitou o trâmite do Habeas Corpus (HC) 144652, impetrado em favor do governador do Mato Grosso do Sul, Reinaldo Azambuja (PSDB), contra decisão do ministro Edson Fachin, na Petição (PET) 7003, de homologar os acordos de colaboração premiada firmados entre executivos do grupo empresarial J&F e o Ministério Público Federal. Entre outros fundamentos para a rejeição, o ministro citou a inviabilidade de habeas corpus impetrado contra decisão de ministro do STF e a impossibilidade de pessoas delatadas impugnarem o acordo pela via do HC.
A defesa do governador alegava que a homologação do acordo de colaboração premiada teria sido praticada em desconformidade com dispositivos da Lei 12.850/2013, e buscava a invalidação do acordo e declaração da ilegalidade de todas as provas produzidas após a decisão homologatória.
O decano explicou que a colaboração premiada se acha legalmente disciplinada e vem sendo reconhecida pelo STF como relevante instrumento de obtenção de prova, e não como meio de prova, destacando que o Supremo tem admitido sua utilização, com a ressalva, no entanto, de que nenhuma condenação penal poderá ter por único fundamento as declarações do agente colaborador.
Em relação à homologação do acordo, o ministro Celso de Mello destacou que o juiz não está autorizado a fazer exame aprofundado das cláusulas pactuadas, uma vez que, nesta fase, cabe-lhe apenas promover o controle das cláusulas abusivas, desproporcionais e ilegais, citando inclusive doutrina jurídica nesse sentido. “O ato homologatório de acordo de colaboração premiada ostenta perfil e conteúdo de índole jurisdicional, eis que emanado de órgão judiciário competente, que atua – considerado o que dispõe a Lei 12.850/2013 (artigo 4º, parágrafos 7º e 8º) – em sede de estrita delibação”, apontou.
O ministro frisou que a jurisprudência do STF se firmou no sentido de recusar, em favor de terceiros, legitimidade ativa para questionar, por meio de HC, a validade jurídica do ato que homologou acordo de colaboração premiada celebrado entre o Ministério Público e agentes colaboradores. Isso porque, segundo o ministro, o negócio jurídico processual em questão, em razão de sua natureza personalíssima, não obriga nem vincula a esfera jurídica daqueles que não integram o acordo.
No entanto, explicou que a inviabilidade do habeas corpus na hipótese não significa que o delatado não possa proteger-se das consequências eventualmente lesivas resultantes do acordo. “Esta Corte Suprema reconheceu a possibilidade de o delatado contestar, em juízo, no exercício do direito de defesa, o depoimento do agente colaborador, as provas que se produzirem por efeito de sua cooperação, podendo impugnar, ainda, sempre no procedimento penal-persecutório em que ostentar a condição de investigado, indiciado ou réu, as medidas de privação de sua liberdade ou de restrição a seus direitos”, destacou.
O ministro lembrou também que, apesar da sua posição divergente, a jurisprudência do STF inadmite o uso do habeas corpus para questionar decisões emanadas de ministros da Corte, inclusive contra o ato homologatório de acordo de colaboração premiada. Já quanto à alegação de que colaboradores no caso seriam líderes de uma organização criminosa, situação que afastaria a aplicação de benefícios previstos no acordo, ele ressaltou a impossibilidade dessa discussão por meio de HC, pois o rito desse instrumento jurídico não comporta dilação probatória. “A pretensão dos impetrantes, nos moldes em que deduzida, imporia necessária análise da prova e importaria em aprofundada investigação dos fatos subjacentes às alegações por eles feitas, o que se revela inadmissível na via angusta e sumaríssima do habeas corpus”.
Processos relacionados HC 144652 Pet 7003 |