Por maioria dos votos, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) inadmitiu, nesta terça-feira (8), pedido de Habeas Corpus (HC 138633) formulado em favor dos advogados Patrícia Esteves de Pinho e José Roberto Neves da Silveira. Eles foram condenados, em primeira instância, pela prática dos crimes de quadrilha (artigo 288) e peculato contra entidade de direito público, em continuidade delitiva (artigo 171, parágrafo 3º, cumulado com o artigo 71, todos do Código Penal).
Segundo os autos, os impetrantes foram condenados pela 8ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro à pena de 11 anos, 4 meses e 20 dias de reclusão, em regime inicial fechado. Essa sentença foi reformada, em sede de apelação, pela Segunda Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região para 7 anos, 6 meses e 20 dias, mantido o regime de cumprimento.
Em seguida, foi interposto o recurso especial no Superior Tribunal de Justiça (STJ), tendo sido determinado o início da execução provisória da pena, a pedido do Ministério Público Federal, em razão de jurisprudência do Supremo, segundo a qual a execução provisória da sentença já confirmada em sede de apelação, ainda que sujeita a recurso especial e extraordinário, não ofende o princípio constitucional da presunção de inocência, conforme decidido no HC 126292. Esse posicionamento foi mantido pelo STF ao indeferir medidas cautelares na Ações Declaratórias de Constitucionalidade (ADCs) 43 e 44, e no julgamento do Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 964246, com repercussão geral reconhecida.
Os impetrantes sustentavam que o referido entendimento do STF não justifica, por si só, o início da execução provisória, antes do trânsito em julgado da condenação, sob pena de ofensa ao princípio constitucional da presunção de inocência.
Voto do relator
O relator do HC, ministro Marco Aurélio, votou pelo cabimento do HC, ao se manifestar de forma contrária à execução provisória da pena. Segundo ele, a hipótese diz respeito a um estelionato judiciário, uma vez que o crime foi praticado por advogados em dois processos judiciais contra a administração pública. De acordo com o ministro, “esse caso revela que não se pode levar às últimas consequências o pronunciamento do Supremo, mitigando sobre o meu olhar o princípio da não-culpabilidade”. “Não me consta que alguém pode devolver a liberdade perdida pelo cidadão, o que afasta o caráter provisório da execução”, avaliou.
O ministro observou que o ato questionado perante o Supremo foi formalizado por meio de uma ação cautelar ajuizada no STJ, e não em habeas corpus, “por isso, se diz que não se deve observar a Súmula 691, do STF. “Nessa situação concreta se aponta que a jurisprudência do STJ não admite essa tipologia penal: o estelionato praticado no bojo de um processo jurisdicional”, disse o relator. Assim, ele admitiu o HC, mantendo liminar anteriormente deferida para que os envolvidos não venham a cumprir uma pena “que poderá ser tirada do mundo jurídico pelo STJ”.
Maioria
O ministro Alexandre de Moraes votou pelo não conhecimento do habeas corpus e abriu a divergência. Ele destacou que a defesa, ao invés de ingressar com HC contra determinação do imediato cumprimento da pena – incidindo a Súmula 691 –, ajuizou uma ação cautelar para dar efeito suspensivo ao recurso especial, a fim de que os condenados fossem mantidos soltos até o STJ analisar a matéria e, com isso, se afastaria a incidência da Súmula 691. “Não me parece que negar efeito suspensivo a um recurso que não o tem possa caracterizar teratologia ou manifesta ilegalidade, consequentemente não afastaria, da minha parte, o óbice de analisarmos a ação cautelar antes da Turma do STJ ”, considerou.
No mesmo sentido, votou o ministro Luís Roberto Barroso. Segundo ele, a mudança de jurisprudência do Supremo quanto à execução provisória da pena foi favorável, “porque o sistema aparelhou-se para o país conseguir punir a criminalidade de colarinho branco”. “A efetividade criou um país de ricos delinquentes e permitiu a quebra do sistema que só punia pobres”, disse.
Dessa forma, o ministro avaliou como ruim a possibilidade de uma nova mudança de jurisprudência, pois alguns novos réus entraram no sistema. “Essa não deve ser uma matéria caso a caso porque, assim, vamos voltar à seletividade do sistema, na qual quem tem dinheiro e bons advogados, consegue, e quem não tem, não consegue”, avaliou. “O Estado em que a jurisprudência vai mudando em função do réu não é um Estado de Direito é um Estado de compadrio. Portanto, acho que devemos perseverar na jurisprudência do Plenário, entendendo e respeitando as opiniões contrárias”, completou.
O ministro Luís Roberto Barroso destacou, ainda, que se o relator do recurso especial no STJ “tivesse vislumbrado a possibilidade de reversão, caberia a ele suspender a execução provisória, mas não tendo ele procedido dessa forma, aplicar-se analogicamente a Súmula 691 porque não houve manifestação do STJ sobre esse ponto, acho que nós estaríamos dando um salto”. Os ministros Rosa Weber e Luiz Fux também acompanharam a divergência, formando a maioria dos votos pelo não cabimento do HC.
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