Na sessão desta terça-feira (8) da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), pedido de vista do ministro Edson Fachin suspendeu o julgamento do Habeas Corpus (HC) 136720, por meio do qual a defesa de um condenado questiona decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que determinou o início da execução da pena, mesmo que a sentença de primeiro grau e a decisão de segunda instância tenham garantido ao réu o direito de aguardar em liberdade o trânsito em julgado da condenação. Até o momento, votaram pela concessão do pedido para garantir o direito de o réu recorrer em liberdade os ministros Ricardo Lewandowski (relator), Gilmar Mendes e Celso de Mello.
Consta dos autos que o réu foi condenado, em primeira instância, a oito anos de reclusão, em regime inicial fechado, pela prática de inserção de dados falsos em sistema de informações (artigo 313-A do Código Penal) e oito meses de detenção pelo delito de usura (artigo 4° da Lei 1.521/1951). Ao julgar o recurso de apelação, o TJ-PB reduziu a pena para cinco anos de reclusão pela prática do delito previsto no artigo 313-A do CP e seis meses de detenção para usura.
Alegando erro material no acórdão do TJ paraibano, que teria trazido informações divergentes em relação à pena fixada para o primeiro delito, a defesa interpôs recurso especial para o STJ, que ainda não teve o mérito julgado. Individualmente, contudo, o relator do caso naquela corte acolheu petição do Ministério Público Federal (MPF) e determinou o início do cumprimento da pena, com base no entendimento fixado pelo Plenário no julgamento do HC 126292, no qual o STF, por maioria, permitiu o início do cumprimento da sentença após condenação em segunda instância.
Reformatio in pejus
Em seu voto, o relator do caso, ministro Ricardo Lewandowski, afirmou que eventual equívoco nas notas taquigráficas foi suprido pelo TJ-PB no julgamento de embargos de declaração. Ele afastou assim a primeira alegação da defesa. Contudo, com relação à execução provisória da pena, ele explicou que a sentença condicionou o início do cumprimento da pena ao trânsito em julgado. Segundo o relator, esse direito conferido ao réu não foi objeto de recurso de apelação por parte do Ministério Público, fazendo, com isso, coisa julgada. No julgamento da apelação da defesa, prosseguiu o ministro, o TJ manteve o direito do réu de recorrer em liberdade, decisão que também não foi contestada, no ponto. Entretanto, frisou o ministro, ao analisar recurso da defesa, o STJ determinou o início da execução da pena, revogando um direito concedido desde a primeira instância, com agravamento indevido da situação do recorrente, causando, na prática, uma verdadeira reformatio in pejus (reforma para pior).
De acordo com o ministro Lewandowski, a antecipação do cumprimento da pena, em qualquer grau de jurisdição, somente poderá ocorrer mediante pronunciamento específico e fundamentado, que demonstre, com base em elementos concretos, a necessidade da custódia cautelar. O ministro reiterou seu entendimento no sentido de que não é possível afastar a taxatividade do dispositivo constitucional que prevê a presunção da inocência, salvo em situações de cautelaridade, por tratar-se de comando constitucional absolutamente imperativo, categórico, com relação ao qual não cabe qualquer “tergiversação”.
Leitura linear
O ministro Gilmar Mendes votou no sentido de conceder o habeas para reformar a decisão do STJ que determinou o início da aplicação da sanção. A compreensão que se teve da decisão do STF sobre execução antecipada da pena foi uma leitura bastante linear, disse o ministro. Segundo ele, o que o Supremo disse na ocasião foi que se poderia dar condições para execução da pena após condenação em segunda instância, “mas passou-se a entender isso como imperativo”, como se o Supremo estivesse autorizando prisões em segunda instância sem qualquer avaliação quanto a controvérsias, possibilidades de recursos, observância da jurisprudência de tribunais superiores, explicou.
Decisão regressista
Ao também acompanhar o relator, o ministro Celso de Mello disse considerar que a decisão do STF que permitiu o início do cumprimento de pena após decisão de segunda instância foi regressista, retardando o avanço de uma agenda concretizadora de liberdades fundamentais em nosso país. Para o decano do Supremo, os ministros precisam revisitar esse tema, cujo entendimento predominante prevaleceu pelo menos desde 2009, até que abruptamente sobreveio a reformulação, que a todos surpreendeu, no entender do ministro.
Mesmo tema
Sobre o mesmo tema, os ministros da Segunda Turma iniciaram a análise do HC 144717, que tramita sob segredo de justiça. Nesse caso, após o voto do relator, ministro Lewandowski, concedendo o habeas corpus, o julgamento foi suspenso por pedido de vista do ministro Edson Fachin.