RELATOR: DESEMBARGADOR VLADIMIR SOUZA CARVALHO -
Processual Penal. Recurso da ré, condenada pela prática dos delitos desenhados no inc. I, do art. 1º, da Lei 8.137, de 1990, e art. 168-A, do Código Penal, à pena privativa de liberdade de quatro anos e oito meses de reclusão. Inicialmente, chama à atenção o fato de a denúncia, f. 06, e as razões finais, f. 88, ter o Ministério Público Federal requerido a condenação da acusada nas penas também do art. 337-A, do Código Penal, sem que a r. sentença sobre ao delito em curso tenha feito qualquer referência, omissão que não mereceu do demandante nenhum inconformismo, de forma que o crime, embrenhado no referido art. 337-A, do Código Penal, desapareceu dos autos. São duas situações fáticas bem distintas. Uma, no deixar de repassar à previdência social as contribuições recolhidas dos contribuintes, no prazo e forma legal ou convencional; outra, de omitir informação ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias. Alicerça a acusação dois procedimentos administrativos instaurados pela Receita Federal, ambos com a data de 1º de fevereiro de 2011. Em um, se consigna: No exame da documentação, a auditoria constatou que a empresa deixou de informar e recolher parte das contribuições devidas à seguridade social do período fiscalizado, tendo em vista ter a mesma informado indevidamente as GFIP's do período de 01/2009 a 12/2009 como optante pelo simples - código de opção "2", onde tal informação levou o sistema da GFIP WEB a calcular somente o desconto dos segurados devidos e deixando de cobrar a Contribuição Patronal e a Contribuição para outras entidades e fundos, reduzindo, dessa forma,, os valores devidos à Previdência Social, ou seja, não informou em GFIP todos os fatos geradores de contribuição previdenciária, na forma do que dispõe a Lei 8.212/91 em seu art. 32, inciso IV, combinado com o art. 225 inciso IV do Regulamento da Previdência Social (Decreto 3,048/99). Concomitantemente, deixou de recolher a contribuição previdenciária a seu cargo, o que, em tese, configura o tipo penal desse crime, f. 06, da Representação Fiscal para fins penais processo 10.380.000730/2011-06, vol. 2, do apenso. No outro, o registro: A empresa fiscalizada declarou mensalmente nas GFIP - 01/2009 a 13/2009, a opção Empresa optante pelo simples - código de opção "2", onde tal informação levou o sistema da GFIP WEB a calcular somente o desconto dos segurados devidos e deixando de cobrar as contribuições destinadas à Outras Entidades e Fundos - Terceiros (fiscalizadas pela RFB), incidentes sobre as remunerações apuradas através de férias e rescisões, f. 11, Representação fiscal para fins penais, processo 10.380.000853/2011-39, do vol. 1, do apenso. Antes de tudo, o fato, no seu nascedouro, exibe uma conduta, - na declaração como optante pelo Simples -, que a empresa já não mais ostentava. No aspecto, o Contribuinte foi excluído do Simples, com efeito a partir de 01/02/2009 pelo Ato Declaratório Executivo - ADE nº 00019613, publicada em Edital em 30/10/2008, f. 60, do vol. I, do apenso. A empresa, portanto, era optante do Simples. A sua exclusão causou prejuízo ao Erário, na medida em que alguns descontos deixam de ser efetuados pelo sistema. No entanto, no cotejo dos fatos, trasladados do campo tributário, para o penal, é preciso navegar com muito cuidado, porque aquilo que é uma infração tributária, para ser encarada como delito, exige a presença do dolo, na deliberação de uma atitude que se reveste da consciência do ilícito tributário, com finalidades específicas de obter proveito de ordem econômica. A Lei 8.137, no inc. I, do art. 1º, coloca na mesa do delito a declaração falsa que o contribuinte presta à autoridade fazendária. Aqui, a declaração falsa, como antônimo de verdadeira, repousa no fato de se inserir ser optante do Simples, quando, em verdade, já não era mais, embora tivesse sido. Não se vê, no caso, como falsa a declaração, mas sim como errada ou equivocada, fruto de um erro no preenchimento de guias, geralmente obra de terceiros, onde, muitas vezes, predomina o repeteco do que foi inserido nos meses anteriores, sem que ninguém, em princípio, seja chamado à atenção para o fato. Só que, em consequência, o erro não se cubra de qualquer má intenção, porque, mais cedo ou mais tarde, a Receita Federal perceberia. Encara-se mais como um mero equívoco, do que pela intenção de tentar enganar o fisco. Não há, assim, como pincelar o fato com as cores do inc. I, do art. 1º, da Lei 8.337. Por outro lado, no que tange a falta de repasse das contribuições previdenciárias - infração consagrada no art. 168-A, do Código Penal -, fundamental que haja a prova material do desconto realmente feito. O fato de constar, em formulários apropriados, a inserção dos valores pagas aos empregados e os descontos efetuados, não significa que tais descontos foram, efetivamente, realizados. No aspecto, a acusação e a r. sentença trabalham com essa premissa, na materialização de ser real o desconto que as folhas de pagamento exibem. No entanto, o que o panorama colhido revela é que o desconto é simplesmente fictício, simples exigência que a formalidade reclama, sem traduzir a verdade que atrás dos aludidos descontos se esconde, ou seja, de uma empresa em falência, bombardeada por oito execuções fiscais na Justiça Federal do Ceará, em Fortaleza, f. 194-195, vinte e sete reclamações trabalhistas, f. 195, e cinco execuções fiscais na Justiça Estadual de Fortaleza, f. 196, a proclamar um desconto que não ocorria. O dispositivo em foco, ao apregoar o deixar de repassar à previdência social as contribuições recolhidas dos contribuintes, reclama, de um lado, que o desconto tenha, de fato, existido, e que esse quantum venha parar nas mãos do dono da empresa, no caso, da acusada, ora apelante, demonstrações que, aqui, não foram sedimentadas. Não se pode conceber a aplicação do dispositivo em foco calcada em folhas de pagamentos a empregados, quando tais folhas já se apresentam com modelo próprio, no qual se enfia um bocado de números, no caso, os descontos, que, em realidade, deveriam existir, e, aqui, ante o quadro de falência, não ocorreram, revelando-se um castigo a mais à empresa que, por qualquer motivo, tenha suas atividades atingidas pelo vírus do declínio, com o fantasma da falência a bater à porta. Enfim, em um caso, o valor que deixou de ser recolhido foi de R$ 97.117,77, f. 07, do apenso I, e R$ 26.517,50, f. 11, do apenso II, observando-se que, no primeiro caso, a empresa chegou a recolher parte das contribuições devidas à seguridade social no período fiscalizado, demonstrando que, enquanto pôde, a empresa cumpriu suas obrigações. Não se consegue vislumbrar, no caso, o delito desenhado no art. 168-A, do Código Penal. O fato, colhido no campo tributário, nem sempre é delito no campo penal. Provimento ao apelo, para julgar improcedente a presente ação.
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