Por unanimidade, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) negou provimento ao Recurso Ordinário em Habeas Corpus (RHC) 132115, interposto por Lilian de Oliveira Lisboa, condenada pelo envolvimento na prática de irregularidades vinculadas a duas Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip) com sede em Curitiba (PR). No julgamento, os ministros confirmaram entendimento da Corte segundo o qual o sigilo da comunicação de dados por meios telemáticos (e-mail), assim como os demais direitos individuais, não é absoluto.
De acordo com os autos, Lilian Lisboa foi condenada, em julho de 2014, às penas de 22 anos e 7 meses de reclusão e 4 anos e 1 mês de detenção pelos crimes de peculato, lavagem de dinheiro, corrupção ativa, falsidade ideológica, fraude em licitação e associação criminosa. O esquema envolvia desvios de verbas públicas federais e apropriações indevidas. Pedidos de habeas corpus foram rejeitados, sucessivamente, no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) e no Superior Tribunal de Justiça (STJ).
No STF, a defesa sustentou, entre outros argumentos, a ausência de fundamentação da decisão do juízo da 2ª Vara Criminal Federal de Curitiba que autorizou a realização de interceptações telefônicas. Alegou que as diligências foram realizadas sem investigação preliminar e baseadas somente em denúncia anônima. Pediu ainda a nulidade das interceptações telemáticas sob o argumento de que o parágrafo único do artigo 1º da Lei 9.296/1996 seria incompatível com o sigilo da correspondência (artigo 5º, inciso XII, da Constituição Federal).
Voto do relator
Em voto apresentado na sessão desta terça-feira (6), o ministro Dias Toffoli (relator) afirmou que, segundo os autos, apesar de apócrifo, o documento que noticiou as ilicitudes indica como seu autor o então presidente do Instituto de Defesa dos Direitos Humanos – IDDEHA. O ministro verificou também que, antes das interceptações, já havia investigações em curso para apurar as movimentações financeiras das Oscips. A partir da denúncia, enfatizou Toffoli, a autoridade policial realizou diligências preliminares e recebeu informações do Ministério da Justiça e dados enviados pela Controladoria Geral da União (CGU).
“O procedimento tomado pela autoridade policial está em perfeita consonância com o entendimento desta Suprema Corte, segundo o qual a denúncia anônima, por si só, não serve para fundamentar a instauração de inquérito, mas, a partir dela, poderá a autoridade competente realizar diligências preliminares para apurar a veracidade das informações obtidas anonimamente e então instaurar o procedimento investigatório”, destacou Toffoli. Segundo ele, tanto a decisão que autorizou as interceptações quanto as que as prorrogaram foram devidamente fundamentadas.
Interceptações telemáticas
A respeito da alegada incompatibilidade das interceptações telemáticas com o direito individual do sigilo de correspondência, o ministro destacou que nenhuma garantia constitucional é absoluta. “Sigilo da comunicação de dados por meios informáticos, assim como os demais direitos individuais, não é absoluto, podendo ser afastado para apuração de crime por meio de decisão judicial devidamente fundamentada”, afirmou.
Ele lembrou ainda que a Primeira Turma do STF, no julgamento do HC 70814, reconheceu que o sigilo de correspondência não é absoluto e conferiu validade à interceptação da correspondência remetida pelos sentenciados, entendendo que a inviolabilidade do sigilo não pode constituir instrumento de salvaguarda de práticas ilícitas. Assim, para Toffoli, a exceção constitucional ao sigilo alcança as comunicações de dados telemáticos, não havendo qualquer vício no caso em análise. A decisão da Segunda Turma foi unânime.
Processos relacionados RHC 132115 |