O ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), deferiu liminar em Habeas Corpus (HC 94404) para suspender o decreto de prisão preventiva do iraniano Kiavash Joorabchian, ex-presidente da empresa MSI, antiga parceira do clube de futebol Corinthians paulista. A decisão vale até o julgamento final do habeas, sem data prevista.
No Brasil, o iraniano é acusado de lavagem de dinheiro e formação de quadrilha. A prisão dele foi decretada pela 6ª Vara Criminal Federal em São Paulo.
O magistrado federal aplicou o artigo 7º da Lei do Crime Organizado (Lei 9.034/95), que veda a liberdade provisória “aos agentes que tenham tido intensa e efetiva participação na organização criminosa [investigada]”, invocando também a Convenção de Palermo, que reforça a lei.
Os outros fundamentos da prisão preventiva decretada contra Kiavash foram a gravidade dos delitos supostamente praticados e a possibilidade de reiteração dos crimes, além da grande repercussão e do clamor público causados, o que, segundo o decreto, fragilizam a atividade jurisdicional e a ordem pública.
Em decisão de 17 laudas, o ministro Celso de Mello aponta falta de idoneidade a cada um desses argumentos.
Lei do Crime Organizado
Ao tratar sobre o artigo 7º da Lei do Crime Organizado, o ministro afirma que “a vedação apriorística de concessão de liberdade provisória é repelida pela jurisprudência do Supremo”. Ele acrescenta que a Corte considera essa vedação “incompatível, independentemente da gravidade objetiva do delito, com a presunção de inocência” e com a garantia do devido processo legal, entre outros princípios constitucionais.
Celso de Mello adverte que o dispositivo legal “incide na mesma censura” que o STF fez ao artigo 21 do Estatuto do Desarmamento, que impedia a concessão de liberdade provisória a acusados de posse ou porte ilegal de arma de uso restrito, comércio ilegal de arma e tráfico internacional de arma.
Em maio de 2007, a Corte considerou inconstitucional esse dispositivo do Estatuto. “O legislador não pode substituir-se ao juiz na aferição da existência, ou não, de situação configuradora da necessidade de utilização, em cada situação concreta, do instrumento de tutela cautelar penal [prisão preventiva]”.
Sobre a Convenção de Palermo, o ministro explica que, pela jurisprudência do STF, os tratados internacionais que não versam sobre direitos humanos, como é o caso, subordinam-se à Constituição. Por isso, diz Celso de Mello, tratados internacionais que impeçam a concessão de liberdade provisória “não podem prevalecer em nosso sistema de direito positivo, sob pena de gravíssima ofensa à garantia constitucional da presunção de inocência, dentre outros princípios constitucionais”.
Clamor público
Com relação aos outros argumentos da prisão preventiva de Kiavash, o ministro alega que eles parecem transgredir “os critérios que a jurisprudência do Supremo construiu em tema de privação cautelar da liberdade individual”.
Segundo ele, o Supremo tem advertido que a natureza da infração penal, por si só, não justifica a privação cautelar. Isso vale, inclusive, para acusados dos chamados crimes hediondos. Para ele,“não se reveste de idoneidade jurídica” a alegação de que o acusado deveria ser mantido preso para “garantir a credibilidade da Justiça”.
Ainda segundo o ministro, “a mera afirmação, desacompanhada de indicação de fatos concretos”, de que o acusado poderia interferir nas provas e no curso do processo também não é bastante para legitimar a prisão preventiva.
Celso de Mello lembra, ainda, que o clamor público, o estado de comoção social e de eventual indignação popular não podem “justificar, só por si, a decretação da prisão cautelar do suposto autor do comportamento delituoso”.
Habeas para estrangeiro
No início de sua decisão, o ministro Celso de Mello afirma que a condição de estrangeiro, incluindo aqueles que não possuem domicílio no Brasil, não “subtrai o direito de ver respeitadas, pelo Poder Público, as prerrogativas de ordem jurídica e as garantias de índole constitucional que o ordenamento positivo brasileiro confere e assegura a qualquer pessoa que sofra persecução penal instaurada pelo Estado”.
Assim, explica Celso de Mello, os estrangeiros têm “plena legitimidade” para impetrar habeas corpus e mandados de segurança, por exemplo.
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