APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0002619-78.2005.4.03.6119/SP

RELATOR: Desembargador HÉLIO NOGUEIRA -  

PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME DO ARTIGO 288 DO CP. PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO REJEITADA. ART. 402, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL: FASE INADEQUADA PARA O REQUERIMENTO DE DILIGÊNCIAS CUJA NECESSIDADE OU CONVENIÊNCIA JÁ ERA CLARA NO MOMENTO DO OFERECIMENTO DA DEFESA PRÉVIA. PRELIMINAR DE ILICITUDE DAS INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS REJEITADA. NULIDADE DA SENTENÇA. AUTORIA COMPROVADA QUANTO A IZAÍDE. CRIME DO ARTIGO 288 DO CÓDIGO PENAL NÃO CONFIGURADO EM RELAÇÃO A VILSON. AUSÊNCIA DE PROVAS DO VÍNCULO ASSOCIATIVO. PENA-BASE MAJORADA. PERDA DO CARGO PÚBLICO. 1. Apelação da Acusação e Defesa contra a sentença que condenou os réus à pena de 01 ano e 03 meses de reclusão e 12 dias-multa como incursos no artigo 288 do Código Penal. 2. Preliminar de prescrição que se rejeita. Ainda que mantida a pena no julgamento da apelação, a consideração da pena assim fixada somente pode ser feita após o trânsito em julgado para a Acusação. Ou seja, a verificação de ocorrência de prescrição, calculada com base na pena em concreto, somente pode ser feita em momento posterior ao julgamento da apelação, e respectivo trânsito em julgado para a Acusação. 3. O artigo 402 do Código de Processo Penal, na redação da Lei nº 11.719/2008, se presta para que as partes requeiram "as diligências, cuja necessidade ou conveniência se origine de circunstâncias ou de fatos apurados na instrução". Não é a fase adequada para o requerimento de diligências cuja necessidade ou conveniência já era clara no momento oferecimento da defesa prévia. 4. O indeferimento de prova não implica ilegalidade, na medida em que a aferição da necessidade da produção da prova é mister do juiz da causa, que tem ampla visão sobre o desenrolar da ação penal. O juiz é o destinatário das provas e tem o dever de indeferir as inúteis e meramente protelatórias. 5. Alegação de falta de fundamentação das decisões que deferiram a interceptação telefônica rejeitada. Verifica-se que as interceptações telefônicas foram deferidas e renovadas com a devida motivação. A pertinência e relevância da interceptação telefônica ainda revelou-se na deflagração de diversas ações penais contra quadrilha voltada para o esquema de fraude contra o INSS mediante uso de documentos falsos para o fim de obter benefícios indevidos, contando inclusive com a participação de servidores do INSS. 6. A Lei n° 9.296/1996 não limita a possibilidade de prorrogação a um único período, sendo certo que tal interpretação inviabilizaria investigações complexas, como a que se cuida nos presentes autos. As prorrogações foram devidamente fundamentadas e justificadas, em razão da complexidade das investigações. Precedentes. 7. Não há que se falar em invalidade das provas colhidas na fase pré-processual, não havendo ainda que se falar que a condenação está lastreada unicamente nas provas indiciárias, uma vez que as provas produzidas na fase investigativa são submetidas ao contraditório diferido, podendo as partes sobre elas se manifestar na fase judicial 8. Assim, a condenação baseada em prova produzida na fase investigativa não é pautada exclusivamente em elementos colhidos na investigação, pois o artigo 155 do CPP ressalva expressamente as provas "cautelares, não repetíveis e antecipadas". E as interceptações telefônicas são provas, pela sua própria natureza, irrepetíveis, mas que, no entanto, são submetidas ao contraditório judicial. 9. Além disso, a interceptação telefônica não é a única prova carreada aos autos: há, ainda, as apreensões na residência dos acusados e em seus locais de trabalho de diversos laudos médicos, atestados, exames fraudados, carteiras de trabalho, bem como a prova testemunhal uníssona e coerente, colhida sob o crivo do contraditório e ampla defesa. 10. Restou comprovado que a acusada Izaíde fazia parte de uma associação criminosa destinada à prática de crimes de estelionato contra a Previdência Social, entre outros crimes, devendo ser mantida sua condenação pela prática do crime do artigo 288 do Código Penal. 11. O crime de quadrilha ou bando, atualmente denominado associação criminosa, por sua natureza, é autônomo e se perfaz independentemente da prática dos crimes a que os agentes objetivam perpetrar a partir da união associativa, sendo prescindível a comprovação de que houve o cometimento de crimes por integrantes da associação. 12. Desnecessária a comprovação dos crimes que os integrantes da associação teriam praticado em unidade de desígnios e, ainda que o fim do grupo criminoso fosse a prática de crimes. 13. É imprescindível a prova do vínculo entre os indivíduos, o que não se dá com o simples fato de Vilson buscar conselhos com Izaide sobre eventual investigação que viria a sofrer, sendo certo que, aparentemente, esse contato destinava-se apenas para buscar informações em como se livrar de apuração por parte da auditoria do INSS. 14. No caso, não se comprovou a estabilidade e a permanência da associação de Vilson com os demais corréus a ensejar a absolvição, nos termos do art. 386, inc. VII, do CPP. 15. Dosimetria da pena. A motivação apresentada para a avaliação negativa da personalidade da ré revela-se absolutamente incongruente, diante do reconhecimento, na própria sentença, da inexistência de registros criminais anteriores em seu nome. Com efeito, reiteração criminosa pode constituir fundamento para a decretação da prisão preventiva, mas não pode servir de justificativa para a conclusão de que seu grau de periculosidade para delitos do gênero, portanto, é mais alto que o normal, considerando-se que o exame da personalidade do agente, deve pautar-se precipuamente em registros criminais anteriores ao crime. Nem mesmo inquéritos e ações penais em andamento justificam a valoração negativa da personalidade do réu. Precedentes. 16. Por outro lado, o fato de acusada ter se valido da condição de servidora pública para captar "clientes" dentro da própria agência do INSS, aproveitando-se da fragilidade das pessoas que procuravam o posto do INSS para obter benefício por conta de alguma incapacidade para o trabalho, merece viés negativo. 17. As circunstâncias do delito se apresentam desfavoráveis à acusada, considerada a forma de atuação da quadrilha, que envolveu estrutura organizada, instalada na agência do INSS em Suzano, destinada a praticar crimes contra a Previdência Social, consistentes na intermediação de benefícios previdenciários fraudulentos, corrupção ativa e passiva, tráfico de influência e falsificação de documentos, com duração da prática delituosa por tempo considerável, uma vez que, conforme as degravações, a atuação do acusada se perpetrou ao menos nos anos de 2005 e 2006, a comportar maior reprovabilidade da conduta. 18. A consequência de suas ações foi de intensa relevância, tendo a acusada causado prejuízo de elevada monta à Previdência Social, tendo a denúncia relacionado oito fraudes praticados pela quadrilha em benefícios previdenciários. 19. Incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, em face do não preenchimento dos requisitos subjetivos do art. 44 do Código Penal, considerando que as circunstâncias judiciais não são favoráveis a ré, tanto que fixada a pena-base acima do mínimo. 20. Tendo em mira as circunstâncias judiciais desfavoráveis, ponderadas na primeira fase da dosimetria da pena e a pena final, de rigor a manutenção do regime inicial de cumprimento de pena semiaberto, tendo por fundamento o disposto no artigo 33, § 3º, do Código Penal. Exclusão, de ofício, da pena pecuniária aplicada, já que não prevista no tipo penal. 21. A acusada praticou o crime valendo-se do cargo público que ocupava na Administração Pública, violando deveres inerentes às funções desempenhadas. Considerando a incompatibilidade da infração penal com o exercício de cargo público na Previdência Social, é de se decretar a perda do cargo público da acusada, com fundamento artigo 92, I, "a" do Código Penal. 22. Preliminares rejeitadas. Apelações da defesa de Vilson e da acusação providas. Apelação da defesa de Izaíde desprovida. Afastamento, de ofício, da pena pecuniária.

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