O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ministro Dias Toffoli, defendeu que as ações afirmativas fundadas em critério étnico-racial para acesso às universidades públicas e aos cargos efetivos e empregos públicos são passos importantes para a ocupação democrática dos espaços de poder político e social. O ministro ressaltou, porém, que ainda é pequena participação dos negros na magistratura brasileira.
O ministro Toffoli participou nesta quinta-feira (8), em Brasília (DF), da abertura do II Encontro Nacional de Juízas e Juízes Negros, sediado no Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT), que será realizado até sábado. O evento, promovido pela Associação dos Magistrados do Distrito Federal e Territórios (Amagis-DF) e pela Associação de Juízes do Rio Grande do Sul (Ajuris), reúne magistrados, professores, membros do Ministério Público, defensores e advogados com o objetivo de fortalecer o debate em torno da promoção da igualdade racial.
Para o ministro Toffoli, no contexto de racismo estrutural ou institucional disseminado na sociedade brasileira, não há vontade deliberada de discriminar, o que existem são mecanismos e estratégias que dificultam a participação da pessoa negra nos espaços de poder. “Políticas afirmativas vão ao encontro da integração dos setores desfavorecidos, soerguendo em cidadania os indivíduos a quem dirigida a discriminação racial sistêmica”, disse.
Levantamento feito pelo CNJ em setembro deste ano sobre o perfil sociodemográfico da magistratura brasileira revelou que ela é majoritariamente formada por homens, brancos, católicos, casados e com filhos. O trabalho contou com a participação de 11.348 magistrados (62,5%) de um total de 18.168 juízes, desembargadores e ministros dos tribunais superiores. A maioria se declarou branca (80,3%), 18% negra (16,5% pardas e 1,6% pretas) e 1,6% de origem asiática. Apenas 11 magistrados se declararam indígenas. Dos que entraram na carreira a partir de 2011, 76% se declararam brancos. Para o ministro Dias Toffoli, os dados mostram a diminuta participação da população negra no sistema de Justiça.
Cotas para negros em concursos do Poder Judiciário existem desde 2015, quando o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) editou a Resolução CNJ nº 203, para cumprir o Estatuto da Igualdade Racial (Lei nº 12.288/2010). A primeira pesquisa desta natureza ocorreu em 2013, quando o CNJ realizou o primeiro Censo do Judiciário, que teve a participação de 10.796 dos 16.812 magistrados então em atividade, um percentual de 64,2% de resposta. O censo demonstrou que os negros representavam apenas cerca de 15% do total de juízes do Brasil. O próximo censo será feito em 2020.
O ministro Toffoli citou ainda o trabalho “Retrato das Desigualdades de Gênero e Raça”, elaborado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) a partir de dados coletados entre 1995 e 2015. O estudo mostra a diferença de renda familiar per capita média a partir dos critérios de gênero e raça dos chefes de família. “Em escala decrescente de renda tem-se: homem branco, mulher branca, homem negro e mulher negra. Da situação de maior desvantagem da mulher negra, conclui-se que a hierarquização e a desigualdade têm natureza complexa e não se restringem ao gênero”, disse.
O juiz Fabio Francisco Esteves, presidente da Amagis, contou, no evento, que as pessoas se surpreendem ao saber que ele é magistrado, por nunca terem visto um juiz negro. "Há, no mínimo, um constrangimento em servir uma sociedade em que 54% se declara negro e que tem 1,6% dos juízes pretos, em um universo de 18 mil magistrados. Esse encontro é uma oportunidade de 'catar' juízes pretos no país, que são sempre os mesmos, três ou quatro em cada estado. Em alguns estados não tem nenhum" , observou.