ACR – 14383/AL – 0000951-83.2014.4.05.8000

RELATOR: DESEMBARGADOR EDILSON PEREIRA NOBRE JÚNIOR -  

PENAL. PROCESSO PENAL. CRIME DE INSERÇÃO DE DADOS FALSOS EM SISTEMA DE INFORMAÇÃO (CP, ART. 313-A). CONCESSÃO FRAUDULENTA DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. AUTORIA E MATERIALIDADE DELITIVA AMPLAMENTE COMPROVADA. UTILIZAÇÃO DE SENHA PESSOAL. DEPOIMENTOS DE TESTEMUNHAS. CRIME DE FORMAÇÃO DE QUADRILHA NÃO CARACTERIZADO (CP, ART. 287). AUSÊNCIA DE CIRCUNSTÂNCIA ELEMENTAR. COMPENSAÇÃO ENTRE CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS FAVORÁVEIS E DESFAVORÁVEIS NO CÁLCULO DA PENA-BASE. IMPOSSIBILIDADE. INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. REVISÃO DO CÁLCULO DA PENA-BASE DOS CRIMES COMETIDOS PELOS DENUNCIADOS. PERDA DE CARGO PÚBLICO. ART. 92, I, "A" DO CP. CABIMENTO EM RELAÇÃO A UM DOS DOIS RÉUS SERVIDORES PÚBLICOS. PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DOS RÉUS E DA ACUSAÇÃO. 1. Apelações criminais interpostas pelo MPF e pela defesa de dois cinco réus condenados contra sentença proferida pelo Juízo da 13ª Vara Federal de Alagoas, que os condenou a uma pena de 03 (três) e 02 (dois) anos de reclusão, pela prática do crime de inserção de dados falsos em sistema de informação (art. 313-A do CP) e os absolveu pelo crime de formação de quadrilha. 2. Conforme ficou comprovado nos autos, ambos os recorrentes, na qualidade de funcionários do INSS trabalhando na APS Monte Máquinas/AL, concorreram dolosamente para concessão indevida do benefício previdenciário de nº 700.015.017-0, em nome de Rita Maria dos Anjos, mediante a inserção de dados falsos no sistema da autarquia previdenciária, confirmando a tese acusatória. 3. A autoria do réu José Arnaldo está caracterizada na medida em que promoveu a habilitação do benefício a pedido de Mário Jorge, conforme afirmou perante o juízo no seu interrogatório, sabendo que concedia um beneficio de forma indevida. 4. A conduta dolosa do corréu Mário Jorge também está suficientemente comprovada, pois este teria repassado o processo de concessão do benefício fraudado ao réu José Arnaldo, conforme afirmado por este último em sede policial e judicial, a fim de que este habilitasse um beneficio de segurado que sequer havia comparecido ao posto do INSS, ocasião em que o réu Mário Jorge teria assegurado a veracidade dos documentos. Corroborando tal conclusão, ao prestar o seu depoimento, a denunciada Maria José declarou que o servidor do INSS Mario Jorge estava envolvido nas fraudes, sendo ele quem cobrava o valor de R$ 150,00 (cento e cinquenta reais) para conceder benefícios fraudados, tendo entregue a ele o requerimento do beneficio de Maria Rita, cobrando-lhe o referido valor pela sua concessão, e que o réu sabia que o beneficio era indevido. 5. Com relação ao pedido do MPF de condenação dos denunciados pelo crime de formação de quadrilha (CP, art. 288), as provas apresentadas não trazem, com segurança, a convicção de participação de pelo menos quatro integrantes associados com o intuito de praticar delitos de forma estável e organizada. No caso, muito embora a partir dos depoimentos extrajudiciais e judiciais dos acusados se possa concluir que entre os corréus Maria José, Mário Jorge (servidor do INSS) e Márcio dos Santos, em cuja casa foram encontradas documentos e cartões de saques do INSS, houvesse um vínculo associativo com a finalidade de práticas de fraude contra a autarquia previdenciária, tal ilação não pode ser estendida ao outro acusado, José Arnaldo, também servidor do INSS, em relação ao qual as provas indicam que a sua participação se deu de forma episódica para o cometimento de um único crime, não havendo elementos de prova suficientes, reitere-se, quanto a este último, de ser parte integrante de uma associação criminosa estável e permanente. 6. Nos termos da jurisprudência até então consolidada, para caracterização do crime de quadrilha ou bando previsto no art. 288 do CP, com a redação dada à época dos fatos, é indispensável a presença dos seguintes elementos: a) concurso necessário de, pelo menos, quatro pessoas; b) finalidade específica dos agentes de cometer crimes indeterminados; c) estabilidade e permanência da associação criminosa. Portanto, no caso concreto, não ficando caracterizada, para além de uma dúvida razoável, a associação de pelo menos quatro integrantes do grupo com a nota de estabilidade e permanência com a finalidade específica de cometer crimes, o caso é de simples concurso de agentes. 7. Prospera a apelação do MPF no ponto em que requer a revisão da pena-base dos condenados, pois inexiste previsão legal que autorize a compensação das circunstâncias judiciais favoráveis com as desfavoráveis para fixação da penabase, como acontece, por expressa autorização legal do art. 67 do CP, quando concorrem atenuantes e agravantes na segunda fase da dosimetria, hipótese na qual a pena deve aproximar-se do limite indicado pelas circunstâncias preponderantes. Portanto, não há como admitir possa, nesta fase, haver a compensação das circunstâncias judiciais entre si, tendo em vista que na primeira fase a fixação da pena já parte da presunção de que todas as circunstâncias judiciais são favoráveis. 8. Com relação ao pedido do MPF de que seja decretada a perda do cargo de ambos os réus servidores do INSS, com base no art. 92, I, do CP, no caso em análise, o grau de envolvimento de cada um dos réus servidores públicos (José Arnaldo Alves e Mário Jorge Oliveira) na prática da fraude na concessão do beneficio objeto dos autos desta ação penal, demanda solução distinta em relação a cada um. 9. A partir do que ficou comprovado, ao se examinar os depoimentos e provas colacionadas, conclui-se que o réu Mário Jorge Oliveira possuía um vínculo associativo criminoso com os corréus Maria José e Márcio dos Santos voltado à prática de fraudes contra o órgão previdenciário em que exercia a sua função pública, onde passava a exigir valores para concessão de benefícios fraudulentos, a evidenciar grave violação e desprezo do dever para com a Administração Pública. 10. Já no que se refere ao réu José Arnaldo, apesar da pena privativa de liberdade superior a 2 (dois) anos de reclusão que lhe foi imposta, e da reprovabilidade da conduta praticada, sua participação criminosa revelou-se de forma pontual na concessão do benefício fraudulento de que trata a presente ação penal, ao ter promovido a habilitação do benefício a pedido de Mário Jorge, mesmo sabendo que não era devido. Neste caso, apesar de ter agido dolosamente, mas sopesando-se todas as circunstâncias em relação ao servidor José Arnaldo, não ficou caracterizada, com a gravidade suficiente, situação que recomende a perda do cargo público como efeito extrapenal da condenação. 11. Como decorrência do afastamento da compensação entre as circunstâncias judiciais no cálculo da pena-base, a pena final de todos os 5 (cinco) réus desta ação penal fica, ao final, assim quantificada: (i) Márcio dos Santos Guimarães - 4 (quatro) anos e 8 (meses) meses de reclusão, pelos crimes de falsificação de documento público (CP, art. 297), estelionato tentado (CP, art. 171, §3º c/c 14, II) e de inserção de dados falsos em sistema de informação (CP, art. 313A), em concurso formal; (ii) Maria José da Silva - 6 (seis) anos 10 (dez) meses e 10 (dez) dias de reclusão, pelos crimes de falsificação de documento público (CP, art. 297), estelionato tentado (CP, art. 171, §3º c/c 14, II) e de inserção de dados falsos em sistema de informação (CP, art. 313-A), em concurso material; (iii) Cícera Belo da Conceição - 3 (três) anos 2 (dois) meses e 20 (vinte) dias de reclusão pelos crimes de falsificação de documento público (CP, art. 297) e estelionato tentado (CP, art. 171, §3º c/c 14, II), em concurso material, substituída por duas restritivas de direito; (iv) José Arnaldo Alves de Oliveira - 2 (dois) anos e 3 (três) meses de reclusão pelo crime de inserção de dados falsos em sistema de informação (CP, art. 313-A), substituída por duas restritivas de direitos; (v) Mário Jorge Oliveira da Silva - 3 (três) anos de reclusão, substituída por duas restritivas de direitos. 12. Parcial provimento às apelações dos réus Mário Jorge da Silva e José Arnaldo Alves de Oliveira e parcial provimento à apelação do Ministério Público Federal para decretar a perda do cargo público ocupado pelo réu Mário Jorge Oliveira da Silva, com base no art. 92, I, "a" do CP e afastar o critério de compensação no cálculo da pena-base dos réus condenados nesta ação.

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