Por José Antonio Dias Toffoli -
A maturidade institucional que se consolidou no Brasil já não admite experimentos ou dúvidas. Queremos um Estado presente e soluções para nossos problemas com o melhor custo-benefício. Nosso sistema penal, por exemplo, precisa se modernizar; seus problemas estruturais, serem corrigidos. Eles agravam o quadro de insegurança pública e demandam intervenções coordenadas e sistêmicas não de uma, mas de várias gestões.
A massa carcerária do país triplicou nos últimos 16 anos. É a terceira maior do mundo! O encarceramento tem cumprido seu propósito? Desprovido de recursos e carente de transparência, o sistema acaba por agravar problemas que deveria resolver.
Responsável por determinar prisões e acompanhar o cumprimento das penas, o Judiciário pouco conhece sobre as mais de 700 mil pessoas privadas de liberdade no país. Muitos chegam ao sistema carcerário sem documentação ou com documentação pouco confiável. Pouco se sabe também sobre os mais de 1,5 milhão de processos de execução penal em tramitação. Além do enorme passivo em meio físico, os sete sistemas informatizados criados por diferentes tribunais pouco dialogam entre si e sobrecarregam os atores da Justiça que os operam.
É justamente para garantir um salto na gestão desses processos que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) está investindo em expansão e constante melhoria do Sistema Eletrônico de Execução Unificada(SEEU), que padroniza o controle informatizado da execução penal.
Adotado como política nacional pelo CNJ em 2016, o SEEU já é realidade em oito unidades da federação com mais de 436 mil processos cadastrados e deve chegar a todo o país até o final do ano. Varas que operam o SEEU relatam o fim das pilhas de processos e do trabalho braçal, com melhoria da gestão de recursos e do controle do cumprimento das penas. Outras prioridades atuais do CNJ são garantir que todos os presos do país tenham identificação biométrica até julho de 2020 e articular estruturas permanentes para a emissão de documentos básicos.
Pesquisa recente junto a tribunais de Justiça constatou que ao menos nove estados não possuem levantamento da documentação civil das pessoas presas. Garantir esses documentos é uma medida fundamental não apenas para se conhecer a situação dos presos, mas para se facilitar sua reintegração social. Sem a documentação básica, o indivíduo não pode, por exemplo, tirar carteira de trabalho ou se matricular em um curso de formação.
A identificação biométrica, por seu turno, confere confiabilidade e segurança à gestão de dados sobre as pessoas privadas de liberdade. Esse controle deve facilitar, inclusive, a monitoração da reincidência, um dado, até hoje, impreciso no Brasil. Com a integração dos dados biométricos ao SEEU, será possível traçar o perfil da população carcerária de forma mais minuciosa, com vistas à elaboração de políticas públicas mais eficientes.
As ações descritas acima integram o programa Justiça Presente, que chega agora a todas as unidades da federação. O programa é resultado de acordo de cooperação inédito entre o CNJ e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), com o suporte dos recursos repassados pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública.
O programa, estruturado em 18 iniciativas, leva em consideração todos os gargalos do ciclo penal e aposta no amplo envolvimento de atores do poder público e da sociedade civil. O intuito é fortalecer instituições e órgãos locais para garantir a adequação e a sustentabilidade das iniciativas, as quais são essenciais para a transformação da realidade penal a longo prazo.
O Judiciário está ciente de sua responsabilidade para reverter o estado de coisas inconstitucional das prisões brasileiras, tal qual apontado pelo Supremo Tribunal Federal em 2015 (ADPF 347 MC/DF). A oportunidade para avançarmos em ações concretas nos foi dada. Precisamos garantir que a justiça seja não apenas um valor almejado, mas um valor presente na realidade de todos os brasileiros.