RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO CORDEIRO -
PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. SONEGAÇÃO FISCAL. DOLO ESPECÍFICO. DESNECESSIDADE. DOLO GENÉRICO APTO A CONFIGURAR O DELITO. ERRO DE TIPO. NÃO COMPROVAÇÃO. CONTINUIDADE DELITIVA CONFIGURADA. RECURSO IMPROVIDO. 1. Apelação criminal intentada pela defesa de RENAN em face de sentença que julgou parcialmente procedente a denúncia, decreto este proferido pelo juízo da 32ª Vara Federal do Ceará. 2. Segundo a denúncia, RENAN, de modo consciente e voluntário, nos anos de 2006 a 2007, na qualidade de administrador da empresa Restaurante Madrinha Suzana Ltda., teria suprimido/reduzido IRPJ, CSLL, PIS e COFINS mediante omissões de informações relativas a movimentações financeiras da aludida pessoa jurídica, nos termos do crime de sonegação fiscal. 3. Em resumo, como administrador da empresa citada, RENAN não teria apresentado Declaração de Imposto de Renda de Pessoa Jurídica - DIPJ nem Declaração de Débitos e Créditos Tributários - DCTF relativas aos anos de 2007 e 2008 e, bem por isto, não recolhera qualquer tributo federal no aludido período. 4. Ocorreu que, analisando os extratos bancários da empresa, o Fisco deu conta de movimentação financeira no montante de R$ 6.314.673,20 no ano de 2006 e de R$ 8.864.991,85 no ano de 2007, valores estes que, como dito, não haviam sido declarados à Receita Federal. 5. Em suma, pois, em face da aventada omissão de informações - ausência da apresentação da DIPJ e da DCTF -, apesar da vultosa quantia movimentada, o fato é que o acusado terminou sonegando todos os tributos que incidiriam sobre os valores, caso declarados ao invés de ocultados. 6. O juízo, após a merecida instrução processual penal, considerou presentes provas de tipicidadade, antijuridicidade e culpabilidade apenas em relação ao apelante, condenando-o pelo cometimento do crime previsto pelo art. 1º, I, c/c art. 12, I, todos da Lei 8.137/90 à pena privativa de liberdade de 02 anos, 07 meses e 03 dias de reclusão, além de multa. 7. Inconformada com a condenação, a defesa apresentou apelo. Na ocasião, destacou, resumidamente, que: 1) o réu não teria agido com dolo, mas sim incidido em erro de tipo/proibição; 2) a dosimetria teria sido desarrazoada ao aplicar causa de aumento de pena atinente à continuidade delitiva; bem como 3) no caso, teria ocorrido a prescrição da pretensão punitiva. 8. Sustenta, a defesa, que, para fins de cômputo da prescrição, deveria ser considerada apenas a pena-base, qual seja, a de 02 anos de reclusão, sem os demais acréscimos. 9. O único acréscimo que, no caso, não deve ser considerado para efeitos de cálculo do lapso prescricional é o inerente à continuidade delitiva, por expresso entendimento fixado na Súmula 497 do STF. 10. Tal assertiva permite outra: os demais acréscimos, inclusive o atinente ao art. 12, I, da Lei 8.137/90 devem sim ser considerados para efeitos de prescrição. 11. Partindo dessa premissa, é se ver que a pena cominada ao apelante, com a exclusão do montante atinente ao acréscimo inerente ao art. 71 do CPB, segue como sendo a de 02 anos, 02 meses e 20 dias de reclusão - que, em regra, prescreve em 08 anos, consoante art. 109, IV, do CPB - e não a pena-base de 02 anos - que prescreveria em 04 anos, consoante art. 109, V, do CPB. 12. Sob esse aspecto, é de se constatar ainda que, mesmo sendo o apelante, na data da sentença, maior de 70 anos, a redução da pena à metade não culminaria com a ocorrência da prescrição. A denúncia foi recebida em 17/08/2016, enquanto a sentença fora proferida em 19/15/2017, lapsos inicial e final entre os quais não decorreu período de 04 anos (metade de 08 anos). 13. Apenas por cautela, relembre-se que, nos crimes tributários de natureza material, a data considerada como da conduta é a correspondente à constituição definitiva do crédito tributário que, no caso, fora a de 30/11/2015. Em 30/11/2015, como se sabe, já havia sido extirpado do CPP a possibilidade de ter por marco inicial da prescrição qualquer data anterior à da sentença. Em outras palavras, a data do fato como marco inicial já não poderia ser considerada, em face da alteração legislativa trazida pela Lei 12.234/2010. Entretanto, ainda que assim não fosse, entre a data do fato (30/11/2015) e a do recebimento da denúncia (17/08/2016), não teria decorrido tempo hábil a fulminar a pretensão punitiva no caso em questão (04 anos, como visto). 14. Nos crimes contra a ordem tributária em sentido lato, de forma geral, é inexigível a comprovação de dolo específico, sendo necessária apenas a demonstração do dolo genérico. 15. Quanto ao argumento de que o réu teria incidido em erro de tipo, a defesa se limitou a dizer que o apelante havia agido por supor situação que, caso existisse de fato, tornaria a conduta legítima. Dizendo de outro modo, a defesa apenas transcreveu o art. 20 do CPB, que traz a aludida causa excludente de dolo, mas não explicou, tampouco comprova o que o agente supunha a ponto de pensar, de forma inevitável, que agia de forma legítima. Portanto, não restou configurado, muito menos comprovado o erro de tipo aduzido. 16. Como bem destacou o juízo, "as condutas delitivas reiteraram-se ao longo dos anos de 2006 e 2007, configurando, assim, a continuidade delitiva, a ensejar a aplicação do artigo 71 do Código Penal Brasileiro". De fato, assiste razão ao magistrado, na medida em que a sonegação perpetrada pelo apelante consistira em recorrentes ausências de informações ao Fisco, apesar de constantes movimentações financeiras, isto ao longo de dois anos. Em suma, o réu não praticou apenas uma conduta, senão várias, que foram perpetradas em cadeia, já que nas mesmas circunstâncias de tempo, modo de execução e outras similares, sendo exemplo típico de continuidade delitiva, nos termos do art. 71 do CPB. 17. Sentença mantida 18. Apelação improvida.
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