APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000676-77.2005.4.03.6005/MS

RELATOR: DES. FED. FAUSTO DE SANCTIS - 

PENAL. PROCESSUAL PENAL. RÉU BENEDITO. ARTIGO 15 DA LEI FEDERAL 7.802/1989. ATIPICIDADE DA CONDUTA AFASTADA. METSULFUROM METIL. HERBICIDA QUE, EMBORA POSSA TER O USO AUTORIZADO NO PAÍS, NÃO ESTAVA REGISTRADO NO MINISTÉRIO DA AGRICULTURA - SISTEMA AGROTÓXICO FITOSSANITÁRIO. CONDENAÇÃO. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. DOSIMETRIA DA PENA. REPRIMENDA ESTABELECIDA NO MÍNIMO LEGAL. REGIME INICIAL ABERTO. SUBSTITUIÇÃO DA PENA. REQUISITOS LEGAIS PREENCHIDOS. RÉU CÍCERO. ARTIGO 18 DA LEI FEDERAL 10.826/2003. MATERIALIDADE E AUTORIA INCONTROVERSAS. DOSIMETRIA DA PENA. REPRIMENDA ESTABELECIDA NO MÍNIMO. SUBSTITUIÇÃO DA PENA. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE. MANUTENÇÃO. PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA. REDUÇÃO. REALIDADE SOCIOECONÔMICA DO RÉU. JUSTIÇA GRATUITA DEFERIDA. SENTENÇA REFORMADA, EM PARTE. - Réu BENEDITO. O Laudo de Exame Pericial registrado sob o número 2020/05-INC, colacionado às fls. 91/94, é conclusivo no sentido de que a substância importada pelo réu é um herbicida do grupo químico da sulfoniluréia (MATSULFUROM METIL). Embora seu uso possa ser autorizado pela ANVISA no Brasil em Atividades Agropecuárias, fato é que, ao tempo do crime, segundo o laudo, ele não estava registrado no Ministério da Agricultura, mais especificamente no Sistema Agrotóxico Fitossanitários (AGROFIT), não sendo, desse modo, seu uso permitido no país. - Em outras palavras, trata-se de mercadoria proibida de ser produzida, comercializada, importada, exportada ou utilizada no Brasil, necessitando, para tanto, regular permissão e prévio registro em órgão federal, de acordo com as diretrizes e exigências dos órgãos federais responsáveis pelos setores da saúde, do meio ambiente e da agricultura, nos termos do artigo 3º da Lei Federal nº 7.802/1989.- Vale ressaltar que a comercialização e utilização desregradas de qualquer agrotóxico proibido trazem malefícios ao meio ambiente e à saúde das pessoas, bens jurídicos tutelados pelo citado Diploma Legal.- Portanto, sem sombra de dúvidas, o transporte de agrotóxico em desacordo com as determinações legais configura o crime do artigo 15 do citado Diploma Legal, com as penas neste crime cominadas. Precedentes.- A materialidade do crime previsto no artigo 15 da Lei nº 7.802/1989 está devidamente comprovada por intermédio dos documentos anexados aos autos, especialmente do Laudo de Exame Pericial registrado sob o número 2020/05-INC, conclusivo no sentido de que a substância recebida para análise resultou positiva para o herbicida MATSULFUROM METIL, do grupo químico da sulfoniluréia, produto este que não está registrado no Sistema Agrotóxico Fitossanitários (AGROFIT), disponível no sítio do Ministério da Agricultura.- A autoria delitiva, por sua vez, está demonstrada por intermédio da prova oral colacionada no bojo do caderno processual, que comprova o cometimento do crime pelo réu BENEDITO.- Com efeito, os testigos claros, harmônicos e coerentes dos policiais militares demonstraram a autoria e culpabilidade relacionada ao Apelante BENEDITO, especialmente quando afirmam que a substância herbicida foi localizada e apreendida no veículo em que trafegavam, em sede de minudente inspeção policial. Além disso, a confissão informal aos gendarmes, de que o herbicida provinha do Paraguai e pertencia ao réu BENEDITO, torna segura a sua responsabilidade criminal.- Regularmente interrogado acerca dos fatos em Juízo, o réu BENEDITO confessou a autoria delitiva, bem assim esclarecendo que comprou o mencionado herbicida, afirmando que é agricultor e pretendia utilizá-lo em sua lavoura. Pagou a quantia de R$ 198,00 (cento e noventa e oito reais) pelo quilo do produto e acreditou que a aquisição fosse regular.- Dosimetria da Pena. Na primeira fase da dosimetria da pena, não se consideram negativas as circunstâncias judiciais previstas no artigo 59 do Código Penal. Assim, fixa-se a pena-base no patamar mínimo de 02 (dois) anos de reclusão e pagamento de 10 (dez) dias-multa, estes fixados no patamar mínimo legal unitário e corrigidos monetariamente até a data do efetivo pagamento.- Na segunda fase, embora o réu tenha confessado parcialmente a prática do crime, contribuindo para a formação do convencimento do julgador, não há como conduzir a redução da pena abaixo do mínimo legal, nos termos da Súmula nº 231 do Superior Tribunal de Justiça: a incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal. Também não há agravantes que interfiram na pena.- Na terceira fase, não há causas de aumento ou diminuição que interfiram na dosimetria da pena.- Regime inicial ABERTO. Uma vez preenchidos os requisitos legais presentes no artigo 44, incisos I a III, do Código Penal, substituo a pena privativa de liberdade por 02 (duas) restritivas de direitos, consistentes na prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas (art. 46 do CP), pelo mesmo tempo de duração da pena privativa de liberdade, em organização, entidade ou associação a ser determinada pelo juízo da execução penal, assim como pela prestação pecuniária equivalente a 02 (dois) salários-mínimos, levando-se em consideração a situação financeira do réu evidenciada pelo Boletim de Vida Pregressa, a ser destinada a entidade social, atendendo o art. 45, § 1º, do Código Penal, uma vez que a União é sempre vítima estanque de todo e qualquer delito e o encaminhamento sistemático a ela faria com que as demais hipóteses do artigo mencionado jamais tivessem aplicação.- Réu CÍCERO. Não houve impugnação quanto à autoria e materialidade do delito do artigo 18 da Lei Federal nº 10.826/2003, pelo que incontroversas. Não se verifica, tampouco, a existência de qualquer ilegalidade a ser corrigida de ofício por este Tribunal. De rigor, portanto, a manutenção da condenação do Recorrente, aliás, como não poderia deixar de ocorrer, ante o enorme arcabouço fático-probatório constante destes autos em seu desfavor.- Dosimetria da pena. Na primeira fase da dosimetria da pena, o magistrado a quo não considerou negativas as circunstâncias judiciais previstas no artigo 59 do Código Penal. Assim, fixou a pena-base no patamar mínimo de 04 (quatro) anos de reclusão e pagamento de 10 (dez) dias-multa, estes fixados no mínimo legal e corrigidos monetariamente até a data do efetivo pagamento. Inexistente apelo defensivo nesse aspecto, e considerando-se que a pena foi fixada no mínimo legal, mantenho-a.- Na segunda etapa, embora o réu tenha confessado a prática do crime, contribuindo para a formação do convencimento do julgador, não há como conduzir a redução da pena abaixo do mínimo legal, nos termos da Súmula 231 do E. Superior Tribunal de Justiça. Também não há agravantes que interfiram na pena. Assim, mantém-se a pena fixada na r. sentença.- Na terceira etapa, não há causas de aumento ou diminuição que interfiram na dosimetria da reprimenda.Reprimenda fixada no patamar mínimo de 02 (dois) anos de reclusão, porquanto favoráveis as circunstâncias judiciais e a inexistência de agravantes ou causa de aumento.- Substituição da pena. Cabe ao juiz, dentro do seu prudente critério, invocando as circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal, e atendendo ao caráter retributivo da pena, estabelecer as penas restritivas de direitos a que o condenado ficará submetido.- Não se pode esquecer também que o princípio da individualização da pena (art. 5º, XLVI, da Constituição Federal, e arts. 5º, 8º, 41, XII, e 92, parágrafo único, II, todos da Lei de Execução Penal, e art. 34 do Código Penal) determina que a sanção penal deve ser suficiente à reprovação da conduta e à prevenção do delito. Em outras palavras, as penas substitutivas devem ser fixadas de forma suficiente à reprovação da conduta e à prevenção do delito, de acordo com o critério da razoabilidade do sentenciante, sob pena de propagação do sentimento de impunidade e desprestígio da norma penal.- No caso concreto em análise, a gravidade do delito (tráfico internacional de munições) impõe resposta severa do Estado-Juiz, sob pena de transformar o escarmento em vã reprimenda estatal ao comportamento socialmente danoso.- Além disso, o Apelante não provou que a pena substituída (prestação de serviços à comunidade) é incompatível com sua jornada laborativa ou, acaso cumprida aos fins de semana, privar-lhe-ia do convívio familiar, por exemplo.- Assim, imperiosa a manutenção da pena restritiva de direitos, consistente na prestação de serviços à comunidade, pelo mesmo período da pena privativa de liberdade imposta (quatro anos), por ser medida que se coaduna com as finalidades da reprimenda, notadamente seu caráter retributivo.- Por outro lado, há notícias nos autos de que o réu aferia renda de R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais) mensais no ano de 2005, o que equivalia a 05 (cinco) salários mínimos à época da prática do crime, consoante se extrai do Boletim de Vida Pregressa (fl. 25). É certo também que o Apelante possui dois filhos e sustenta sua família com a renda advinda da agricultura, razão pela qual a pena pecuniária de 15 (quinze) salários mínimos mostra-se inadequada à sua realidade e incompatível com seus rendimentos.- Assim, fixa-se a pena de prestação pecuniária em 02 (dois) salários mínimos, reformando-se a r. sentença nesse aspecto.- A defesa requereu, por fim, a reforma da sentença no tocante à condenação ao pagamento das custas do processo, por se tratar de pessoa hipossuficiente, requerendo a gratuidade da justiça.- Em princípio, consigno que a condenação ao pagamento das custas processuais decorre do comando normativo inserto no artigo 804 do Código de Processo Penal, sendo devida mesmo ao acusado que seja beneficiário da Assistência Judiciária Gratuita.- NO CASO DOS AUTOS, inexistem elementos que infirmam a hipossuficiência do réu CÍCERO e, conforme vimos acima, seus vencimentos, à época do cometimento do delito, não eram grandiosos. Portanto, suas declarações de hipossuficiência devem ser suficientes para a concessão do benefício. Dessa forma, devida a concessão da assistência judiciária gratuita ao réu CÍCERO, nos termos especificados.- Apelação ministerial provida e Apelação defensiva do réu Cícero parcialmente provida.

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