EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO CRIMINAL Nº 0004458-58.2019.4.03.6181/SP

RELATOR: DESEMBARGADOR FAUSTO DE SANCTIS -  

PROCESSO PENAL. EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DO JUIZ NATURAL. IMPARCIALIDADE COMO PRESSUPOSTO PROCESSUAL PARA O DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DE UMA RELAÇÃO PROCESSUAL. HIPÓTESES ENSEJADORAS DE SUSPEIÇÃO. ART. 254 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. IMPOSSIBILIDADE DE AMPLIAÇÃO INTERPRETATIVA DAS HIPÓTESES ENSEJADORAS DE SUSPEIÇÃO. ANÁLISE DO CASO CONCRETO. REFUTAMENTO DA ARGUIÇÃO DE SUSPEIÇÃO. PEDIDO JULGADO IMPROCEDENTE.- O princípio do juiz natural, com assento constitucional em dois incisos do art. 5º do Texto Magno de 1988 (XXXVII e LIII), sufraga a necessidade do Poder Judiciário ser imparcial quando do julgamento das demandas que lhe são apresentadas ao mesmo tempo em que atua como mecanismo de segurança ao jurisdicionado ante a prescrição impossibilitadora de que haja a designação de magistrado ad hoc para apreciar um caso concreto específico. A efetiva interpretação do postulado em tela deve abarcar a vedação de criação de juízos ou de tribunais de exceção, bem como deve impor o devido e o necessário respeito às regras de competência dispostas nas legislações processuais, tudo com o objetivo de que não sejam maculadas a independência e a imparcialidade do órgão julgador, aspectos tão caros ao Estado de Direito (tal qual o existente na República Federativa do Brasil) e que evidenciam pressupostos processuais que devem concorrer no caso concreto para que o desenvolvimento da relação processual seja válido.- O direito fundamental assegurado ao cidadão no sentido de ver-se julgado por um juiz imparcial e competente serve de pressuposto para o exercício da jurisdição pelo Estado-juiz, de modo que somente pode ser afastado em situações excepcionais em que evidenciada a existência de causa reveladora de impedimento ou de suspeição do magistrado previamente designado pelas leis distribuidoras de competência. Assim, acaso presente uma situação apta a ofender as necessárias imparcialidade e independência que devem permear a atuação do Estado-juiz (na pessoa do magistrado constitucionalmente designado para assumir a relação processual posta a julgamento), tem cabimento a arguição, sempre excepcional e por meio do veículo processual adequado, de hipótese caracterizadora de impedimento ou de suspeição. Precedentes do C. Superior Tribunal de Justiça e deste E. Tribunal Regional Federal.- Justamente porque se refere ao afastamento do magistrado natural designado de acordo com as regras de competência, as hipóteses de impedimento e de suspeição do juiz não podem ser interpretadas ampliativamente, sob pena de se alargar exceções a desvirtuar a garantia constitucional (e direito fundamental do cidadão) a um julgamento da lavra do juiz natural contido nas normas processuais. Nesse diapasão, o art. 254 do Código de Processo Penal elenca as situações previamente estabelecidas pelo legislador aptas a tergiversar acerca da imparcialidade do magistrado para a condução de um caso concreto distribuído originariamente a sua competência.- O C. Supremo Tribunal Federal (RHC 131544, Rel. Min. DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, julgado em 21/06/2016) já teve oportunidade de decidir não configurar hipótese caracterizadora de suspeição a prolação de decisão judicial fundada em interpretação possível e razoável de texto legal, ressaltando que eventual revisão por instâncias superiores não teria o condão de indicar que o magistrado originário teria atuado de forma a prejudicar aquele que se insurgiu, pois o exercício da atividade jurisdicional pressupõe a possibilidade de se decidir de acordo com tese jurídica considerada correta pelo prolator do provimento judicial guerreado.- Insurge-se o excipiente em face do atuar jurisdicional do MM. Juiz Federal Titular da 9ª Vara Federal Criminal de São Paulo/SP, responsável pela Ação Penal nº 0008230-63.2018.403.6181, na justa medida em que referido magistrado já o teria condenado em outra Ação Penal, empregando, para tanto, argumentação ao arrepio do posicionamento prevalente tanto na doutrina como na jurisprudência, aspecto que denotaria sua vontade de condená-lo a qualquer custo. Salienta, ademais, que referido juiz teria distorcido depoimento prestado pelo Excipiente com o nítido desiderato de o enquadrar nas penas do respectivo tipo penal em que incorrido, sendo tal proceder mais uma manifestação de sua parcialidade, bem como induzido o reconhecimento de testemunha em sede de audiência de instrução, desrespeitando, também, o art. 226 do Código de Processo Penal.- As situações anteriormente retratadas apontadas pelo Excipiente guardam semelhança entre si na justa medida em que foram levadas a efeito em decorrência do exercício da ínsita função jurisdicional investida àqueles Juízes Federais a partir do momento em que aprovados em concurso público específico da carreira e nomeados para exercerem tal cargo. Dentro de tal contexto, impossível creditar-se a pecha de parcial ao juiz que simplesmente cumpre com seu mister funcional e, ademais, apenas implementa no caso concreto preceitos constantes na legislação (de acordo com sua livre convicção motivada) a culminar, nos termos da interpretação que pressupõe ser a mais consentânea àquele caso concreto, com a prolação de édito penal condenatório.- Em outras palavras, não se mostra lícito o manejo de Exceção de Suspeição com o nítido objetivo de manifestar inconformismo com o que restou decidido em outra Ação Penal, pretensão esta que deverá, a tempo e a modo escorreitos, ser aviada naquela relação processual penal, à luz de que o sistema processual brasileiro garante a faculdade de apresentação de recurso em face de uma r. sentença com a qual não se concorda (seja fática, seja juridicamente). Assim, temas como os aventados pelo Excipiente (quais sejam, qual o elemento subjetivo necessário para a configuração do crime de estelionato previdenciário, se é possível majorar a pena-base tendo como supedâneo a existência de inquéritos policiais e de ações penais ainda não transitadas em julgado, potencial distorção do depoimento gravado prestado em juízo quando da exaração de r. provimento judicial condenatório e dever de aplicar a regra constante do art. 226 do Código de Processo Penal em sede de reconhecimento judicial) deverão ser apresentados na via processual prevista pelo Código de Processo Penal como apta a tal mister (recurso de Apelação) e não por meio da suscitação de Exceção de Suspeição que não encontra fundamento de validade em qualquer das taxativas hipóteses previstas no art. 254 do Código de Processo Penal.- Em última instância, acaso fosse possível dar azo às ilações tecidas nesta Exceção de Suspeição, chegar-se-ia ao absurdo lógico de imputar parcialidade ao juiz que profere qualquer espécie de comando judicial (porque sempre haverá o desagrado de uma das partes) como, por exemplo, aquele que recebe a inicial acusatória ofertada pelo Ministério Público, aquele que defere (se a favor da acusação) ou indefere (se contra a defesa) a produção de qualquer prova pugnada ou que, em última consideração, não aquiesce com pretensão deduzida por quaisquer dos atores processuais, haja vista que, com tal proceder e principalmente porque desferido juízo de valor à luz do caso concreto, o atuar jurisdicional já estaria indicando uma pretensa linha a ser tomada ao longo do tramitar de uma Ação Penal.- Exceção de Suspeição julgada improcedente.

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