RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL NÉVITON GUEDES -
PENAL. PROCESSUAL PENAL. CRIME DE RESPONSABILIDADE DE PREFEITO. ART. 1º, INCISO IV, DO DECRETO-LEI 201/1967. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE DOLO NA CONDUTA DO AGENTE. JUÍZO DA CERTEZA. ABSOLVIÇÃO. APELAÇÃO DA DEFESA PROVIDA. 1. Apelação interposta pelo réu em face de sentença que julgou procedente a pretensão punitiva estatal para condená-lo pela prática do crime previsto no art. 1º, inciso IV, do Decreto Lei 201/1967, à pena definitiva de 03 (três) meses de detenção, que foi substituída por 01 (uma) restritiva de direitos, consistente em prestação de serviços à comunidade ou entidades públicas. 2. Segundo a denúncia o réu “empregou de maneira consciente e voluntária os recursos do FUNDEB e do FMS repassados pela União durante o ano de 2012 em desacordo com o programa a que se destinam, caracterizando crime de responsabilidade elencado no art. 1º, inciso IV do Decreto-Lei 201/67. Durante o exercício de 2012, o Município de Regeneração do Piauí, na gestão de EDUARDO ALVES DE CARVALHO, recebeu recursos financeiros do FUNDEB e FMS, os quais foram repassados das contas vinculadas do FUNDEB e FMS para contas da Prefeitura de livre movimentação”. 3. Não obstante esteja comprovada a materialidade delitiva, o mesmo não se pode dizer a respeito do elemento subjetivo do tipo, consistente no dolo. Não se pode afirmar, com a segurança que o caso requer, a vontade livre e consciente por parte do recorrente para a prática da conduta delituosa. 4. O apelante, ao ser interrogado, em juízo, sob o crivo do contraditório e ampla defesa, afirmou desconhecer qualquer irregularidade no seu procedimento em relação à execução financeira dos recursos públicos em questão, argumentando ter sido orientado pelo controle interno do município e por escritório de contabilidade no sentido de transferir os recursos momentaneamente, desde que houvesse posterior devolução à conta de origem. 5. Nesse sentido, é o depoimento da testemunha Maria Mendes da Silva: “(...) que no segundo semestre de 2012 teve uma dificuldade muito grande em honrar os pagamentos com a folha; que foram feito em acordo com o setor financeiro; que depois ficou sabendo; que, depois que soube, entrou em contato com o setor jurídico e com o escritório de contabilidade que acabaram tranquilizando, contanto que fossem devolvidos no mesmo exercício financeiro; que todos os valores foram ressarcidos; (....) que dinheiro que entrava no FUNDEB não dava pra pagar a folha; (...)”.6. Assim, não há que se falar em vontade livre e consciente em “empregar subvenções, auxílios, empréstimos ou recursos de qualquer natureza, em desacordo com os planos ou programas a que se destinam”. 7. Recentemente este Tribunal absolveu acusado de imputação de conduta criminosa prevista no Decreto-Lei 201/67, ante a inexistência cabal de dolo na conduta do agente, apesar de os valores recebidos pela prefeitura terem sido aplicados de maneira diversa do previsto originariamente em convênio (ACR 0001503-70.2010.4.01.3903, Desembargador Federal Néviton Guedes, TRF1 Quarta Turma, e-DJF1 26/09/2018). 8. Inexistente prova coesa contundente e inequívoca sobre a prática delitiva, o benefício da dúvida favorece o réu, em homenagem ao principio do in dubio pro reo. 9. De fato, no caso, o conjunto probatório constante dos autos não oferece elementos de prova hábeis a demonstrar, com a necessária segurança a fundamentar uma condenação, que o recorrente teria praticado ou concorrido, consciente e voluntariamente, para a prática do delito em análise, não sendo, portanto, suficiente para ensejar a condenação. 10. E nem poderia ser diferente, pois meros indícios, desprovidos de qualquer elemento de prova mais consistente, não são aptos a dar ensejo à condenação do acusado, parte apelante, resultando inevitável a absolvição, com supedâneo no princípio in dubio pro reo. 11. Ainda, cumpre destacar que no processo penal vige a regra do juízo de certeza, ou seja, as provas devem ser produzidas de maneira clara e convincente, não deixando margem para meras suposições ou indícios. Para que se chegue ao decreto condenatório, é necessário que se tenha a certeza da responsabilidade penal do agente, pois o bem que está em discussão é a liberdade do indivíduo. Sendo assim, meros indícios e conjecturas não bastam para um decreto condenatório, uma vez que, na sistemática do Código de Processo Penal Brasileiro, a busca é pela verdade real. 12. Recurso da defesa a que se dá provimento para, absolver o réu da prática do delito previsto no art. 1º, inciso IV, do DL 201/67, nos termos do art. 386, inciso VII, do CPP.
Para ler o documento na íntegra, clique aqui!