APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0002401-38.2014.4.03.6118/SP

RELATOR:  DES. FED. FAUSTO DE SANCTIS -  

PENAL. PROCESSUAL PENAL. ARTIGOS 38, 38-A E 48 DA LEI DE CRIMES AMBIENTAIS. CONSTRUÇÃO DE UMA CASA EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. CONDUTA TÍPICA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA NÃO APLICÁVEL. CONSUNÇÃO. CRIMES-MEIO ABSORVIDOS PELO CRIME-FIM. DESCLASSIFICAÇÃO DA CONDUTA PARA AQUELA PREVISTA NO ARTIGO 64 DA LEI 9.605/1998. CRIME DE MENOR POTENCIALIDADE OFENSIVA. EVENTUAL PROPOSTA DE TRANSAÇAÕ OU SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO.- No trato das questões que envolvem o meio ambiente, há de se ter extrema cautela na aplicação do princípio da insignificância. Como bem reconhecido em diversos precedentes jurisprudenciais, em matéria ambiental, esta deve ficar reservada a situações excepcionalíssimas, em que sejam ínfimas a ofensividade e a reprovabilidade social da conduta e nas quais os princípios de precaução e prevenção possam ser mitigados.- Na natureza, nada é isolado ou independente, tudo depende de tudo e se interrelaciona com o todo, de modo que um dano que, isoladamente, pareça ínfimo, pode se revelar capaz de alcançar todo um ecossistema, por exemplo. Ademais, não se deve perder de vista que o escopo da norma é impedir a atitude lesiva ao meio ambiente, devendo-se evitar que a impunidade leve à proliferação de condutas a ele danosas. O objetivo é proteger não apenas as gerações presentes, mas também as futuras (inteligência do art. 225, caput, da CF), de modo que a aplicação do princípio da insignificância deve se restringir a casos efetivamente diminutos.- A denúncia descreve que o réu, em data não especificada, compreendida entre agosto de 2012 a 13 de agosto de 2013, realizou intervenção ambiental ilegal (construção de uma casa) em área de preservação permanente do Bioma da Mata Atlântica, situada à margem esquerda do Rio Paraíba do Sul, sem licença ou autorização de órgão competente. Diante disso, imputou-lhe as condutas delitivas previstas nos artigos 38, 38-A e 48 da Lei de Crimes Ambientais.- Dos elementos colhidos, entretanto, verifica-se que a degradação ambiental na área ocorreu única e exclusivamente com o intuito de construir no local uma casa para a moradia do acusado e sua família, o que amolda sua conduta perfeitamente àquela prevista no artigo 64 da Lei de Crimes Ambientais.- Assim, no caso concreto, a suposta destruição da vegetação nativa mostrou-se como mera etapa inicial do único crime pretendido de construção em local não edificável (in casu, em área de preservação permanente e do Bioma da Mata Atlântica), razão pela qual incide a absorção do crime-meio de destruição de vegetação pelo crime-fim de edificação proibida. O mesmo ocorre com relação ao delito de impedir a regeneração natural da flora, que configura mero exaurimento do crime de edificação indevida a partir do efetivo gozo da coisa construída.- Não há qualquer ação autônoma de destruir floresta ou impedir sua regeneração, mas tão somente o ato de promover construção em local de edificação proibida. A destruição mostra-se, assim, condição necessária para a realização da obra no local e o impedimento à regeneração, pós fato impunível pela fruição natural da construção realizada.- Assim, mostra-se mais acertada a aplicação do princípio da consunção dos delitos do artigo 38, 38-A e 48 da Lei de Crimes Ambientais, e a desclassificação da conduta do acusado para o crime-fim previsto no artigo 64 da mesma Lei.- Esse foi o entendimento proferido pelo E. Superior Tribunal de Justiça em precedente de caso bastante semelhante, no qual também entendeu que o crime de destruir área de preservação permanente e o pós fato impunível de impedir sua regeneração tratam-se tão somente de crime-meio para o crime-fim de construir em local não edificável. Devendo ser, assim, aplicado o princípio da consunção e classificada a conduta do acusado como incurso tão somente no art. 64 da Lei nº 9.605/1998.Precedente.- Sendo o réu ALEXANDRE primário e, diante da desclassificação de sua conduta para o delito previsto no artigo 64 da Lei de Crimes Ambientais, cuja pena prescrita é de 06 (seis) meses a 01 (um) ano de detenção, configurando, portanto, crime de menor potencial ofensivo, é de rigor que seja oportunizada a manifestação do Ministério Público Federal sobre o eventual cabimento dos benefícios da Lei Federal nº 9.099/1995.Nesse sentido, diversos precedentes, inclusive das C. Cortes Superiores, já se manifestaram para declarar a nulidade das sentenças que, ao mudar a classificação jurídica da denúncia ou absolver parcialmente o réu da imputação inicialmente prevista, deixaram de dar vista dos autos ao Ministério Público Federal passando diretamente à condenação e dosimetria da pena de delitos que, em tese, fazem jus aos benefícios da Lei Federal nº 9.099/1995.- Procedida a desclassificação da conduta do réu para aquela amoldada no artigo 64 da Lei de Crimes Ambientais, devem os autos ser remetidos ao r. juízo de origem com posterior encaminhamento ao Ministério Público Federal para que se manifeste acerca da eventual possibilidade de oferecimento de proposta de transação ou suspensão condicional do processo, atentando-se ao prazo prescricional.

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