O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Celso de Mello determinou, liminarmente, a imediata soltura de M.A.S., preso preventivamente desde agosto de 2009 por ordem do juiz da 2ª Vara Criminal da Comarca de Piracicaba (SP), sob acusação de tráfico de drogas e associação com o tráfico (artigos 33 e 35 da Lei 11.343/2006 - Lei de Drogas).
A decisão, tomada em medida liminar concedida nos autos do Habeas Corpus (HC) 107108, estende a M.A.S. a liberdade concedida pelo próprio ministro Celso de Mello nos autos do HC 105437, também por medida liminar, a E.A.T., denunciada juntamente com M.A.S. e outros 13 corréus acusados do mesmo crime.
Ao decidir, o ministro aceitou o argumento da defesa no sentido de que M.A.S. estaria sofrendo constrangimento ilegal, porquanto se encontrava preso já há um ano e meio, sem que se tivesse encerrado a instrução do processo e sem que houvesse, sequer, um prazo previsível para que isso aconteça. E essa demora, conforme reconheceu o ministro, ocorreu não por culpa da defesa, mas sim por culpa do aparelho judiciário.
O caso
Conforme relato da defesa, M.A.S. e outros corréus foram presos em 20 de agosto de 2009, mas a denúncia do Ministério Público contra eles somente foi recebida em 24 de março de 2010. A primeira audiência de instrução, interrogatório, debates e julgamento, realizada em 19 de abril de 2010, foi interrompida diante da ausência de testemunhas de acusação (policiais federais que atuaram na prisão).
Nessa audiência, não foram apresentados três acusados, um deles (a ré E.A.T.) por falta de viatura para conduzi-la ao distrito da culpa. Por essa razão, o juiz de primeiro grau determinou o desmembramento do processo referente a esses três réus.
Em 15 de julho de 2010, nova audiência foi suspensa pelo juiz, diante da não apresentação dos réus em juízo. Em 12 de agosto de 2010 foi realizada uma terceira audiência, esta de início de instrução do processo pelo qual responde a ré E.A.T.,, mas a instrução não se encerrou, porque o Ministério Público insistiu na oitiva de testemunhas de acusação que não compareceram a ela. Acresce que foram expedidas cartas precatórias para oitiva de testemunhas em Campinas e São Paulo, mas foram devolvidas sem cumprimento, porque as testemunhas não foram localizadas.
Decisão
Diante dessa situação fática que, conforme entendimento do ministro Celso de Melo, não foi provocada por culpa do réu, ele decidiu conceder a liminar. “Tenho ressaltado, em diversos julgamentos, que o réu – especialmente aquele que se acha sujeito, como sucede com o ora paciente, a medidas cautelares de privação de sua liberdade - tem o direito público subjetivo de ser julgado pelo Poder Público, dentro de um prazo razoável, sob pena de caracterizar-se situação de injusto constrangimento ao seu status libertatis (situação de liberdade)”, lembrou o ministro Celso de Mello.
“O direito ao julgamento, sem dilações indevidas, qualifica-se como prerrogativa fundamental que decorre da garantia constitucional do “due processo of law’ (devido processo legal)”, observou ainda o ministro, reportando-se ao disposto no artigo 7º, nºs 5 e 6, da Convenção Americana sobre Direitos Humanos.
No entender do ministro Celso de Mello, o caso presente caracteriza uma situação “abusiva e inaceitável”, porquanto o réu permanece na prisão, sem julgamento de seu processo, por período superior àquele que a jurisprudência dos Tribunais tolera, levando a injusto constrangimento, no sentido do artigo 648, inciso II, do Código de Processo Penal (CPP).
Por outro lado, ao conceder a liminar, o ministro aplicou jurisprudência da Suprema Corte que julgou inconstitucional o artigo 21 da Lei 10.826/2003 (dispõe sobre ao registro, a posse e a comercialização de armas de fogo) e, por consequência, também o artigo 44 da Lei de Drogas (Lei 11.343/2006) que, ambas, vedam a concessão de liminar a autores de crimes hediondos.
A decisão quanto ao artigo 21 da Lei 10.826 foi tomada no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 3112, relatada pelo ministro Ricardo Lewandowski, e a referente ao artigo 44 da Lei 11.343, entre outros, no julgamento do HC 100872, relatado pelo ministro Eros Grau (aposentado).
O ministro Celso de Mello lembrou que, conforme a jurisprudência firmada pela Suprema Corte quanto a essa questão, a vedação contida nos dois dispositivos legais “não pode ser admitida, eis que se revela manifestamente incompatível com a presunção de inocência e a garantia do devido processo legal, dentre outros princípios consagrados pela Constituição da República, independentemente da gravidade objetiva do delito”.
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