Pedido de vista do ministro Ricardo Lewandowski suspendeu, nesta quinta-feira (31), no Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), o julgamento do Inquérito (INQ) 2559, em que o deputado José Saraiva Felipe (PMDB-MG) é denunciado pelo Ministério Público Eleitoral (MPE) da suposta prática do crime eleitoral, consubstanciado em falsidade ideológica, previsto no artigo 350 do Código Eleitoral (Lei nº 4737/1965).
O deputado é acusado de – após ver rejeitadas, pelo Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais (TRE/MG), as contas do Diretório Regional do Partido do Movimento Democrático daquele estado (PMDB/MG) referentes ao exercício de 2004, quando presidido por ele – ter assinado, em 2006, novos livros-diário de prestação de contas encaminhados ao TRE/MG, contendo dados diversos daqueles contidos nos livros diários originais.
O MPE entende que foi irregular a substituição dos livros contábeis, uma vez que a legislação pertinente não contempla a possibilidade de substituição de um livro-diário por outro.
Votos
O pedido de vista foi formulado quando o relator, ministro José Antonio Dias Toffoli, havia rejeitado a denúncia, acompanhado do ministro Gilmar Mendes, e o ministro Marco Aurélio havia aberto divergência, votando pelo recebimento da denúncia.
Em seu voto, o ministro Dias Toffoli acolheu o argumento da defesa de Saraiva Felipe, de que não haveria o elemento subjetivo do tipo, isto é, o fator dolo, para justificar a aceitação da denúncia.
Isto porque Saraiva Felipe, que é médico de formação, teria recebido do contador e do advogado do diretório regional do PMDB a informação de que a rejeição das contas se deveria ao fato de que os gastos de pessoal da entidade teriam superado em 20% a arrecadação do Fundo Partidário.
Diante disso, o diretório teria recebido do TRE intimação para retificar a prestação de contas e a sugestão de funcionário do próprio Tribunal para que apresentassem novos livros-diário contendo as retificações.
Os novos livros foram encaminhados ao TRE, juntamente com os antigos que foram rejeitados por ele, e teriam sido assinados por Saraiva Felipe em 2006, quando ele estava licenciado do cargo por ter assumido o de ministro da Saúde do governo federal. A assinatura teria sido por ele aposta a pedido do então presidente do diretório, deputado Fernando Diniz, já falecido, sob o argumento de que, afinal, se tratava das contas referentes ao período em que Saraiva Felipe ocupara a presidência do diretório.
Por outro lado, teria havido um equívoco nas contas, pois se teriam computado como gastos de pessoal despesas efetuadas com serviços técnicos, como honorários advocatícios.
Segundo a defesa de Saraiva Felipe, a utilização de livros-diário de contas era uma inovação, em 2004, pois antes o diretório preenchia um formulário fornecido pelo TRE -MG, contendo as diversas rubricas. E, durante algumas décadas, os honorários advocatícios, por exemplo, vinham sendo computados como despesas de pessoal.
Dolo
A questão central da discussão em torno da denúncia é se houve dolo (intenção) de falsear os livros-diário ou não. A corrente iniciada pelo relator, ministro Dias Toffoli, sustentou a ausência de dolo, enquanto o ministro Marco Aurélio, que abriu a divergência, sustentava que houve dolo, sim, já que os dados corretos deveriam constar dos primeiros livros.
Ele ponderou, também, que a aceitação da denúncia é a fase inicial do processo, não representando uma condenação. Isto porque, na fase posterior, de instrução, caberá ao MPE provar as denúncias por ele formuladas, enquanto o deputado terá toda oportunidade de sustentar ausência de culpa e dolo.
Ainda segundo o ministro Marco Aurélio, os novos livros foram elaborados diante da desaprovação das contas pelo TRE-MG, não só por causa de uma exigência de retificação.
Rejeição
Ainda sem proferir seu voto, o presidente do STF, ministro Cezar Peluso, ponderou sobre a viabilidade de receber ou não a denúncia, “pois ela não diz onde está, nos novos livros, o diverso da realidade”. Segundo ele, é esse o ponto central da discussão: se houve ato omissivo ou comissivo, conforme previsão do artigo 350 do Código Eleitoral.
Define esse artigo como crime eleitoral, punido com reclusão de até cinco anos e pagamento de cinco a 15 dias-multa, se o documento é público, e reclusão até três anos e pagamento de três a dez dias-multa, se o documento é particular: “Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, para fins eleitorais”.
Ainda conforme o mesmo artigo, a pena é agravada se o agente é funcionário público e comete o crime prevalecendo-se do cargo, ou se a falsificação ou alteração é de assentamentos de registro civil.
Para o ministro Gilmar Mendes, que antecipou seu voto para acompanhar o do relator, “não há dolo”. Segundo ele, os segundos livros foram acompanhados dos primeiros, o que prova que não houve intenção de falsear. “Não há dolo capaz de justificar o recebimento da denúncia”, sustentou ele. “A denúncia tem um significado, um alcance para a vida pública. A denúncia inepta deve ser afastada, porque a denúncia, em si só, já é um fardo para o homem público. Não se pode receber a denúncia só para instruir o processo e depois absolver”.
Vista
O ministro Ricardo Lewandowski justificou seu pedido de vista com o argumento de que quer estudar melhor o caso. Disse ter em mãos um documento subscrito pelo presidente do TRE mineiro e encaminhado a ele, na qualidade de presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), segundo o qual o diretório regional do PMDB mineiro efetuou alterações na prestação de contas referente a 2004, após encerrado aquele exercício. E, ainda conforme o ministro, do mesmo documento consta que haveria, na nova prestação de contas, registros que não constavam no livro original de 2004.
Conforme essa informação do TRE, segundo ainda o ministro Ricardo Lewandowski, “há divergência clara entre os livros originais e os posteriormente apresentados”.