Um pedido de vista da ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha adiou o julgamento do Habeas Corpus (HC 107090) impetrado por M.M.N., acusado de cometer homicídio triplamente qualificado motivado por ciúme. O HC foi analisado pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) na sessão extraordinária desta quarta-feira (13). A defesa do acusado pretendia afastar a incidência do motivo fútil, aplicando o entendimento de que o ciúme não qualifica o crime, pois não pode ser considerado motivo fútil ou torpe.
O caso
O homicídio foi cometido às duas horas da madrugada após M.M.N. encontrar sua ex-mulher no quarto com um homem em trajes íntimos. Eles estavam na casa da mãe da ex-mulher, mas o acusado invadiu a casa e, após agredir o homem que tentou se esconder embaixo da cama, M.M.N. levou-o até seu carro e, em local afastado, atropelou-o por diversas vezes até matá-lo. A defesa informou que o acusado teve um relacionamento de 16 anos com a ex-mulher, do qual nasceu um filho, sendo que a separação teria ocorrido há apenas três meses antes do crime.
Os advogados sustentaram ainda que havia um indício de reconciliação no relacionamento e, por essa razão, o acusado teria sido tomado pela surpresa ao flagrar sua ex-mulher com outro homem. “É evidente que tal fato não é insignificante e pífio”, sustentou ao pedir que não seja aplicado o motivo fútil para qualificar o crime. “Trata-se de uma qualificadora absolutamente excessiva e inadequada em razão dos fatos apresentados”, sustentou a defesa.
Voto
O relator do caso, ministro Ricardo Lewandowski, votou para negar o HC, pois em seu entendimento “cabe ao Conselho de Sentença decidir se o paciente praticou o ilícito motivado por ciúme, assim como analisar se o referido sentimento no caso concreto constitui motivo torpe que qualifica crime de homicídio”. Para ele, “não se deve usurpar do Tribunal do Júri o pleno exame dos fatos da causa”.
Em outras palavras, o ministro considerou que somente o juiz natural do processo, que no caso é o Tribunal do Júri por se tratar de crime doloso contra a vida, poderia analisar se houve ou não o motivo fútil.
Divergência
O ministro Luiz Fux abriu divergência ao conceder o habeas corpus e afastar a incidência do motivo torpe. Ele destacou que o acusado estava movido de uma “violenta emoção” e já está respondendo por homicídio e também pelo meio cruel utilizado na prática do crime.
No entanto, para o ministro Fux, o ciúme causado pelo intento de reconciliação e pela constatação de um homem escondido embaixo da cama, para quem alimenta o refazimento de um amor, não parece um motivo fútil.
“Nesse caso, entendo que o réu vai responder exatamente pelo que praticou, homicídio e meio cruel, mas, no meu modo de ver, não foi inspirado por motivo fútil”, ressaltou.
O ministro Marco Aurélio acompanhou a divergência, pois, em seu entendimento, caso fique assentado que ficou configurado ciúme a ponto de ser enquadrado como qualificadora, em todo e qualquer homicídio por traição se terá essa qualificadora. “A meu ver, se defrontou o agente com um quadro que o levou a ficar fora de si e cometer o desatino”, destacou.
“Considerado o subjetivismo desse sentimento que é o ciúme, devemos, para reconhecer a qualificadora do motivo fútil, atuar com parcimônia. Talvez eu ficasse na dúvida se a vítima tivesse sido a mulher, mas não. A demonstrar que tudo resultou de uma violenta emoção na constatação do fato, tem-se que a vítima foi aquele que estava com a companheira”, disse o ministro Marco Aurélio, que ainda acrescentou: “eu não aponto essa reação verificada como um motivo fútil, ou seja, um motivo sem importância. Ele realmente foi compelido ao desatino ante o contexto presenciado”.
O julgamento será retomado com o voto-vista da ministra Cármen Lúcia.
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