Em caso de divergência entre o voto do relator e as notas taquigráficas, essas têm primazia, uma vez que refletem a convicção da Turma, que é o juiz natural do processo. Com esse entendimento, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por maioria, deu provimento ao recurso interposto pela Symantec Corporation e Microsoft Corporation para condenar a empresa Serrarias Campos de Palmas S/A não apenas à indenização por danos materiais, mas também à indenização por perdas e danos equivalente a dez vezes o valor de mercado de cada programa utilizado ilicitamente.
As empresas de informática entraram na Justiça contra a serraria sustentando que esta usava 58 programas de computador “piratas”. Alegaram que eram titulares de direitos autorais desses programas de computadores, cuja legitimidade de reprodução deveria ser comprovada com a respectiva licença, sob pena de violação de direitos autorais, conforme o artigo 13 da Lei n. 9.609/1999.
A sentença tornou definitiva a apreensão dos programas irregulares, além de condenar a serraria ao pagamento do preço correspondente a cada programa de computador encontrado e utilizado de forma ilegal (valor a ser apurado em liquidação de sentença). A empresa foi condenada também a indenizar a Symantec e Microsoft, por perdas e danos, em dez vezes o valor de mercado de cada programa utilizado ilicitamente.
O Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) reformou a sentença somente para excluir a indenização por perdas e danos e as astreintes, bem como para reduzir os honorários sucumbenciais.
No STJ, o caso foi relatado pelo ministro Fernando Gonçalves, agora aposentado, que determinou a restauração da sentença para o pagamento do valor de cada programa usado irregularmente. As empresas de informática opuseram embargos de declaração contra o voto do relator, alegando haver omissão quanto à alteração da sentença no tocante ao pagamento de dez vezes o valor dos softwars, segundo ficou registrado nas notas taquigráficas.
O recurso foi negado e novos embargos foram opostos, dessa vez ,sob a relatoria do ministro Raul Araújo. Ele reconheceu a contradição entre o voto e as notas, mas decidiu pela prevalência do voto do então relator, ministro Fernando Gonçalves. Para o ministro Araújo as notas não foram suficientemente esclarecedoras no ponto, indicando haver equívoco momentâneo do relator original quanto ao teor da sentença.
O ministro Luis Felipe Salomão pediu vista. No seu voto, o ministro afirmou que, ao seu juízo, as notas taquigráficas são muito claras quanto a tratar o caso de mera quantificação do dano, o qual, consoante unânime decisão dos ministros então presentes, seria devido nos termos da sentença.. Ele lembrou que as notas tornam clara a intenção do ministro Fernando Gonçalves em restaurar a multa de dez vezes o valor do programa.
O ministro Salomão também salientou que o artigo 103 do Regimento Interno do STJ aponta que, nas contradições entre notas e voto do relator, as primeiras têm primazia por refletirem a convicção da Turma. “A atuação do relator dá-se mediante delegação do órgão fracionário do qual faz parte, tanto que o abreviamento do procedimento recursal dos tribunais, com o julgamento monocrático de recursos é medida excepcional prevista pelo legislador com vistas à desobstrução das pautas dos tribunais”, disse Salomão.
Assim, o ministro Salomão divergiu do relator e acolheu os embargos para dar provimento ao recurso especial das empresas de informática. Os ministros Maria Isabel Galloti, Antônio Carlos Ferreira e Marco Buzzi votaram com a divergência.