Dois pedidos de liberdade foram deferidos, por unanimidade, pela Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) durante sessão realizada nesta terça-feira (12). Nos dois casos, os ministros determinaram a expedição de alvarás de soltura – caso os réus não estejam presos por outros motivos – ao considerarem que houve excesso de prazo de prisão dos réus. Um deles está preso há quatro anos e sete meses e o outro há nove anos e três meses sem que tenham sido julgados.
RHC 114743
No julgamento do Recurso Ordinário em Habeas Corpus (RHC) 114743, a Segunda Turma deferiu pedido de liberdade formulado pela defesa do policial militar capixaba E.S.L., preso preventivamente há quatro anos e sete meses sem que esteja marcada data de seu julgamento, por Tribunal do Júri, pela acusação de homicídio triplamente qualificado (artigo 121, parágrafo 2º, incisos I, II e IV, do Código Penal).
A Turma aplicou jurisprudência da própria Suprema Corte, segundo a qual, apesar da gravidade do crime, o excesso de prazo para julgamento de um delito configura violação da dignidade da pessoa humana, um dos fundamentos do Estado democrático de Direito e, portanto, constitui constrangimento ilegal. Nesse sentido, o relator, ministro Gilmar Mendes, reportou-se a diversos precedentes, entre eles o julgamento, pela própria Turma, do Habeas Corpus (HC) 113611, relatado pelo ministro Cezar Peluso (aposentado).
No mesmo sentido se manifestou a Procuradoria-Geral da República (PGR). O ministro Gilmar Mendes lembrou que a Suprema Corte somente tem concedido o pedido em hipóteses excepcionais, levando em conta, entre outros, a complexidade do processo, o comportamento das partes e as atitudes das autoridades.
O policial é acusado, juntamente com outros três policiais (integrantes das polícias civil e militar), do homicídio do empresário Sebastião Carlos de Oliveira, mediante paga ou promessa de recompensa. O crime ocorreu no centro da cidade de Mimoso do Sul (ES), e os supostos autores do crime foram identificados posteriormente, mediante escutas telefônicas, conforme consta dos autos.
A ordem de soltura somente se aplicará se o policial não estiver preso por outro motivo. A Turma decidiu, também, recomendar ao Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJ-ES) imprimir celeridade no julgamento do policial, ressaltando que o juiz do Tribunal do Júri poderá adotar as medidas cautelares previstas no artigo 319 do Código de Processo Penal (CPP). Entre tais medidas estão o comparecimento periódico do réu em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz; a proibição de ausentar-se da Comarca quando sua permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou inscrição; o recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos, bem como a monitoração eletrônica.
HC 109128
Já o Habeas Corpus (HC) 109128 foi impetrado, sob a alegação de excesso de prazo da prisão, contra decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que negou pedido feito pela defesa de D.B., preso cautelarmente há nove anos e três meses. Em 2003, ele e outra pessoa teriam sequestrado duas crianças com cinco anos de idade, estuprado uma delas, matado as duas e ocultado os corpos. O motivo do crime seria um desentendimento entre os corréus e a mãe de uma das vítimas.
A prisão preventiva do acusado foi determinada pelo juízo da Comarca de São Vicente (SP) em janeiro de 2004. No ano de 2010, o Tribunal de Justiça paulista (TJ-SP) negou habeas corpus no sentido de que não haveria excesso de prazo de prisão. O STJ também negou o pedido em razão das peculiaridades do caso.
“Por mais grave, e é gravíssimo o caso, eu concedo a ordem porque há nove anos e três meses ele está preso sem julgamento e sem se marcar o Júri”, entendeu a relatora, ministra Cármen Lúcia. “Por mais escabroso que seja o quadro, não é possível que haja a manutenção da prisão. Se ele tivesse sido condenado a 30 anos, já teria cumprido agora, em 2013, 10 anos de prisão”, ressaltou. “Este é o exemplo mais acabado de uma justiça que não se presta e isso é gravíssimo”, finalizou.
Ela lembrou que, segundo a jurisprudência do Supremo, com a pronúncia fica superado o suposto excesso de prazo. Contudo, a relatora salientou que o entendimento da Corte tem que ser interpretado constitucionalmente, ou seja, “o excesso de prazo após a pronúncia não pode ser para o resto da vida”.