Os ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) indeferiram pedido de Habeas Corpus (HC 105181) impetrado pela defesa do empresário Márcio Cardoso, condenado em primeira instância por crime contra a ordem tributária, descaminho e uso de documento falso, praticados entre 1996 e 1997, em Blumenau (SC). Administrador da empresa Fly Importadora Ltda., Márcio solicitava a anulação do processo quanto ao crime contra a ordem tributária.
O relator do HC, ministro Celso de Mello, negou o pedido por entender que os fatos devem ser examinados “no âmbito do processo penal de conhecimento, onde isso se torna viável”. Ele explicou que descaminho é um crime cometido contra a administração pública e o delito de sonegação fiscal é aquele que ofende um bem jurídico que é a ordem tributária.
Nos autos, a defesa alegava bis in idem sob o argumento de que o mesmo fato teria ensejado dupla condenação penal. No entanto, segundo o ministro, esses dois crimes apesar de apresentarem elementos comuns, são distintos no caso.
O ministro Celso de Mello afirmou que o Ministério Público Federal (MPF), ao descrever a prática do crime de descaminho, afirmou que as mercadorias importadas clandestinamente foram avaliadas em R$ 107.333,17 [valores corrigidos à época]. O crime de sonegação fiscal envolvendo a redução de tributos como o ICMS teria ocorrido mediante falsificação de notas fiscais e, conforme o ministro, “somaram não os R$ 107 mil, mas R$ 10 milhões”. “A discrepância é evidente”, considerou.
O relator observou que as datas do cometimento dessas condutas delituosas divergem entre si. O descaminho teria ocorrido em 25 de julho de 1997 e a sonegação fiscal teve notas emitidas em período anterior, entre 4 de dezembro de 1996 a 14 de junho de 1997. “Há uma incompatibilidade, primeiro, quanto aos valores – R$ 107 mil em relação ao descaminho e R$ 10 milhões referente à sonegação – e quanto à sequência temporal do cometimento dessas condutas uníveis”, avaliou o ministro Celso de Mello.
O relator ressaltou que o exame dos autos permite reconhecer que, na verdade, teria ocorrido a prática de delitos autônomos, em circunstâncias de tempo completamente diversas entre si e com valores discrepantes. “O caráter sumaríssimo da via do habeas corpus não permite que se proceda neste âmbito estreito do writ a uma indagação mais aprofundada de ordem probatória. Não há como fazer uma incursão para sopesar esses vários dados. Uma análise superficial revela que não há essa identidade de situação”, entendeu.
Para o ministro, “tudo isso denota, ao menos na via sumaríssima do HC, a impossibilidade de verificar se as condutas teriam sido realmente distintas e autônomas ou não”. Assim, ele indeferiu o pedido formulado pela defesa do empresário, e foi seguido por unanimidade.