Contrabando. Prisão preventiva. Necessidade da custódia demonstrada. Garantia da ordem pública. Reiteração delituosa. Quebra de fiança anteriormente concedida. Presença dos requisitos autorizadores. Liminar indeferida.
Rel. Des. Élcio Pinheiro De Castro
Cuida-se de habeas corpus, com pretensão liminar, impetrado por Emanoel Silveira de Souza, em favor de Júlio César Trindade, contra decisão do MM. Juiz Substituto da Vara Federal de Pato Branco/PR. Segundo se depreende, no dia 05.07.2007, o paciente foi preso pela prática, em tese, do delito tipificado no artigo 334 do Código Penal. Os fatos foram assim narrados no Auto de Prisão em Flagrante pelo condutor PM Vicente Carvalho Júnior (fl. 42): “O depoente está lotado no 3º Batalhão de Polícia Militar, com sede em Pato Branco-PR. Hoje, por volta das 04:00h, patrulhavam o Pátio do Posto de Combustíveis DOVAL, quando viram seis carros saírem rapidamente ao avistar a viatura; um dos carros, o Astra SW, caiu na valeta central da rampa do posto, ficando ali, os demais tentaram sair, mas ficaram encurralados num canto do pátio, sendo que foi possível impedir suas saídas com a viatura da PM; neste ato logo puderam ver que os carros estavam carregados com cigarros do Paraguai. Deu voz de prisão aos três indivíduos que foi possível deter naquele momento. Outros três fugiram pelo mato, sendo então realizado um cerco, com apoio de viaturas. Foi possível localizar mais dois indivíduos, que também receberam voz de prisão. Aquele que era o condutor do Astra SW que caiu na valeta não foi localizado. Cada indivíduo preso estava dirigindo um dos veículos, conforme Boletim de Ocorrência - BO - ora apresentado. Após dominada a situação puderam constatar que todos os carros estavam totalmente carregados com cigarros, sendo que também havia alguns equipamentos de informática. As cargas tomavam todos os espaços disponíveis dos carros, inclusive em cima dos bancos. Constataram também que os veículos estavam equipados com rádios PX dissimulados (...) pela sua experiência policial, sabe que são utilizados para comunicações entre eles, visando escapar de ações policiais. Após as prisões e apreensões, realizou contato com esta Delegacia, sendo orientado a trazer os presos e veículos até aqui para as providências legais, o que foi feito por orientação do Delegado. As mercadorias não foram contadas de forma específica, pois seria muito difícil tal diligência, ante o grande volume. Os carros foram apreendidos de forma conjunta, ou seja, carro e carga respectiva.“ Postulada a liberdade provisória, o Magistrado a quo indeferiu o pedido, em face da presença dos requisitos legais para a prisão preventiva. Face a tanto, foi ajuizado o presente writ. O Impetrante sustenta, em síntese, que o valor da mercadoria e dos impostos sonegados não ultrapassa R$ 10.000,00 (dez mil reais) sendo caso de aplicação do preceito da insignificância. Aduz também ausência dos requisitos para a custódia cautelar, pois Júlio é primário, tem bons antecedentes, trabalho lícito e residência fixa. Assevera ainda que a existência de outro procedimento criminal em desfavor do paciente não justifica a prisão provisória, em face do princípio da presunção de inocência. Diante disso, requer a concessão liminar da ordem e sua posterior confirmação pela Turma para que seja revogado o decreto prisional. Em que pesem as doutas razões de fls. 03-16, ao menos nesta quadra preambular, constata-se a presença dos pressupostos legais (fumus comissi delicti e periculum libertatis) para manutenção da prisão provisória. Com efeito, vejam-se os fundamentos da r. decisão monocrática, verbis: “JÚLIO CÉSAR TRINDADE, por meio de seu procurador constituído, ingressou com pedido de liberdade provisória com ou sem arbitramento de fiança. Refere que o requerente se encontra recolhido à prisão na Cadeia Pública do Município de Pato Branco/PR, tendo sido preso em flagrante delito na data de 05/07/2007 pela prática do delito tipificado no art. 334 do Código Penal. No entanto, o valor das mercadorias apreendidas é inferior a R$ 10.000,00 (dez mil reais), sendo, portanto, atípica a conduta. Além disso, possui domicílio fixo, atividade laboral ilícita, é primário e de bons antecedentes, não havendo motivos para a manutenção da custódia no curso do processo. Anexou os documentos necessários à comprovação do alegado (fls. 08/44). Realizada busca pela Secretaria desta Vara em cadastros públicos acerca do requerente, foi dada vista ao Ministério Público Federal, manifestando-se o Parquet pela concessão da liberdade mediante fiança. Relatei brevemente. Decido. No caso dos autos, descabe a concessão de liberdade provisória, com ou sem fiança. Com efeito, o requerente refere ter endereço fixo e ocupação lícita, anexando aviso de vencimento de energia elétrica, em nome de sua genitora (fl. 11) e declaração de seu empregador (fl. 12). Todavia, ainda que tenha atividade lícita e endereço fixo, é de ser mantida a custódia cautelar, quando presente alguma das hipóteses do art. 312 do Código de Processo Penal. Com efeito, Júlio César Trindade já foi preso em flagrante pela prática do delito de contrabando/descaminho em 08/09/2006, sendo deferido o pedido de liberdade provisória mediante fiança nos autos nº 2006.70.12.000737-3, em 12/09/2006 (fl. 54). Dispõem os arts. 341 e 343 do Estatuto Processual Penal que, aquele que, na vigência de fiança vier a praticar outra infração penal, deverá ser recolhido à prisão, vedada nova concessão do benefício (art. 324). Assim, se haverá revogação do benefício concedido nos autos nº 2006.70.12.000737-3, com a decretação de prisão preventiva, não há porque conceder aqui a liberdade provisória, com ou sem fiança. No mais, a prática do mesmo delito em tão pouco tempo indica que o requerente utiliza o crime como meio de manutenção e subsistência, o que impõe a decretação da prisão preventiva para garantia da ordem pública (artigo 312 do CPP), de forma a evitar a prática de fatos criminosos e a credibilidade da justiça que foi afetada com a quebra da fiança (...). Outrossim, quanto à alegação de atipicidade da conduta, deve ser referido que, tratando-se de reiteração delituosa do crime de contrabando/descaminho de cigarros (em tese), a jurisprudência vem afastando a aplicação do princípio da insignificância. A propósito: 'PENAL. DESCAMINHO. ART. 334, CAPUT, DO CP. EMENDATIO LIBELLI. AUTORIA. MATERIALIDADE. COMPROVADAS. PROVA PERICIAL. DESNECESSIDADE. DOLO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. REITERAÇÃO DA CONDUTA. CONDENAÇÃO. (...) 6. De acordo com a orientação adotada pela 4ª Seção desta Corte, é inaplicável o princípio da insignificância se o valor dos tributos suprimidos ultrapassa R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais). Não se aplica o princípio da insignificância quando o acusado utiliza a prática delituosa como modus vivendi. 7. Aplica-se a regra do art. 383 do CPP - emendatio libelli - quando a denúncia, embora descrevendo perfeitamente os fatos, atribui capitulação jurídica errônea aos fatos.' (TRF4, APELAÇÃO CRIMINAL, 2004.71.04.006126-5, Oitava Turma, Relator Paulo Afonso Brum Vaz, DJ 10/05/2006). Ante o exposto, indefiro o pedido de liberdade provisória.“ Como se vê, há certa persistência na prática delituosa por parte do paciente, pois embora já tenha sido anteriormente beneficiado com a liberdade provisória mediante fiança, voltou a praticar idêntica conduta ilícita. Nesse contexto, conforme entendimento jurisprudencial, justifica-se a custódia cautelar como forma de garantir a ordem pública, em face da recalcitrância do agente em práticas criminosas, mormente em infrações da mesma espécie. Sobre o tema, veja-se o Acórdão assim ementado: “CRIMINAL. HC. ROUBO. (...) PRISÃO PREVENTIVA. DECRETO FUNDAMENTADO. NECESSIDADE DA CUSTÓDIA DEMONSTRADA. RÉU FORAGIDO. GARANTIA À APLICAÇÃO DA LEI PENAL. REITERAÇÃO DELITUOSA. ORDEM PÚBLICA. PRESENÇA DOS REQUISITOS AUTORIZADORES. CONDIÇÕES PESSOAIS FAVORÁVEIS. IRRELEVÂNCIA. ORDEM DENEGADA. Não se vislumbra ilegalidade na decisão que decretou a custódia cautelar dos pacientes, se demonstrada a necessidade das prisões, atendendo-se aos termos do art. 312 do CPP e da jurisprudência dominante. A evasão do réu pode ser suficiente para motivar a segregação provisória a fim de garantir a aplicação da lei penal. Precedente. A reiteração delituosa do agente pode motivar a segregação cautelar para assegurar a ordem pública. Precedente. Condições pessoais favoráveis não são garantia de eventual direito à liberdade provisória, se a manutenção da custódia é recomendada por outros elementos constantes dos autos. Ordem denegada.“ (STJ, 5ª Turma, HC n.º 29.268/PA, Relator Ministro Gilson Dipp, public. no DJU de 28/10/2003). Por fim, não há informação nos autos a respeito do valor das mercadorias apreendidas, tampouco dos impostos não recolhidos, circunstância que impede qualquer análise no tocante à aplicabilidade do princípio da insignificância jurídica. Ante o exposto, não vislumbrando, por ora, flagrante ilegalidade ao status libertatis do paciente, indefiro a liminar. Solicitem-se informações à digna autoridade impetrada - principalmente cópia do laudo de avaliação das mercadorias e dos tributos sonegados - que as prestará no prazo de 05 (cinco) dias. Após, abra-se vista dos autos à douta Procuradoria Regional da República. Intimem-se. Publique-se. Porto Alegre, 16 de julho de 2007.
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