Transação penal. Descumprimento do acordo. Fato que enseja o retorno ao status quo ante a fim de possibilitar ao Ministério Público a persecução penal. Suspensão do processo. Revogação. Decisão que pode ser proferida após o prazo final para cumprimento das condições fixadas desde que os motivos estejam compreendidos no intervalo temporal delimitado pelo juiz para a benesse.
Rel. Min. Eros Grau
RELATÓRIO - O SENHOR MINISTRO EROS GRAU (Relator): Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, no qual é apontada como autoridade coatora o Colégio Recursal do Juizado Especial Criminal da Comarca de São Bernardo do Campo. 2. O paciente é acusado da prática do crime descrito no artigo 129, caput, c/c o § 7º desse mesmo artigo e com o artigo 61, II, e, todos do Código Penal.3. Aceitou a proposta de transação penal de prestação pecuniária no valor de R$ 67,00 (sessenta e sete reais), a ser paga a uma instituição de caridade, ficando ciente de que o inadimplemento acarretaria oferecimento de denúncia pelo Ministério Público. Requereu a prorrogação do prazo para efetuar o pagamento, no que foi atendido. Como mais uma vez não cumpriu a proposta, foi intimado pessoalmente para fazê-lo, permanecendo inerte. 4. Ante a desídia, Ministério Público ofereceu denúncia e propôs a suspensão condicional do processo (art. 89 da Lei n. 9.099/95), o que foi aceito pelo paciente e seu defensor. Entre as condições, o compromisso de apresentar-se mensalmente em juízo para informar e justificar suas atividades. Face ao não-comparecimento, foi intimado pessoalmente a apresentar justificativa, mas não atendeu ao chamado judicial, sobrevindo a revogação do benefício. 5. À decisão revocatória seguiram-se recurso de apelação e habeas corpus; ante a denegação deste, a impetração do presente writ. 6. A impetrante alega, em síntese, que (i) o Juiz, “ao condicionar homologação da transação penal ao cumprimento da obrigação avençada“, não agiu corretamente; (ii) não havendo que se condicionar a homologação ao cumprimento da obrigação, a sentença homologatória produz coisa julgada, impedindo a propositura de ação penal, conforme entendimento doutrinário e jurisprudencial; (iii) a execução da pena de prestação pecuniária deve ser buscada no juízo competente; (iv) admitir nova tutela jurisdicional através de nova punição ao acusado por fato já devidamente apenado anteriormente, caracteriza ‘bis in idem’; e (v) a revogação da suspensão condicional do processo e o indevido andamento do feito configuram constrangimento ilegal. 7. Requer a concessão de liminar para que sejam anulados o despacho que recebeu a denúncia e todos os atos subseqüentes. No mérito, requer a concessão definitiva da ordem, a fim de o processo seja trancado. 8. A liminar foi indeferida. 9. A PGR é pela denegação. É o relatório.
VOTO - O SENHOR MINISTRO EROS GRAU (Relator): A jurisprudência pacífica de ambas as Turmas desta Corte é no sentido de que, descumprida a transação penal, há de se retornar ao status quo ante, possibilitada ao Ministério Público a persecução penal (HHCC 79.572, Marco Aurélio, 1ª Turma, DJ de 22.2.2002; 80.802, Ellen Gracie, 1ª Turma, DJ de 18.5.2001; 84.976, Carlos Britto, 2ª Turma, Informativo n. 402 e o RE 268.320, Octavio Gallotti, 10.11.2000). 2. No que tange à revogação da suspensão condicional do processo, há autorização legal para tanto (cf. art. 89, § 1º, IV, da Lei n. 9.099/95), sendo ela possível até mesmo após o prazo final para o cumprimento das condições fixadas, desde que os motivos estejam compreendidos no intervalo temporal delimitado pelo juiz para a suspensão do processo (cf. os HHCC 80.747, Sepúlveda Pertence, DJ de 19.10.2001; 84.890, Sepúlveda Pertence, DJ de 3.12.2004; 84.660, Carlos Britto, DJ de 25.11.2005 e 84.746, Marco Aurélio, DJ de 31.3.2006). 3. É perfeita a observação, do Subprocurador-Geral da República, de que “não é demais lembrar que o paciente, por várias vezes beneficiado com os favores legais, quedou-se inerte ao seu cumprimento, sendo esclarecedora a afirmação constante do acórdão impugnado no sentido de que ‘Aliás, o que pretende o combativo defensor é um passaporte para a impunidade. O paciente fez acordo de transação penal e não honrou. Novamente beneficiado com a suspensão condicional do processo não o cumpriu’.“ Denego a ordem.
EMENTA - HABEAS CORPUS. LEI DOS JUIZADOS ESPECIAIS. TRANSAÇÃO PENAL. DESCUMPRIMENTO: DENÚNCIA. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. REVOGAÇÃO. AUTORIZAÇÃO LEGAL. 1. Descumprida a transação penal, há de se retornar ao status quo ante a fim de possibilitar ao Ministério Público a persecução penal (Precedentes). 2. A revogação da suspensão condicional decorre de autorização legal, sendo ela passível até mesmo após o prazo final para o cumprimento das condições fixadas, desde que os motivos estejam compreendidos no intervalo temporal delimitado pelo juiz para a suspensão do processo (Precedentes). Ordem denegada.
ACÓRDÃO - Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Senhor Ministro Celso de Mello, na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, indeferir o pedido de habeas corpus, nos termos do voto do Relator. Brasília, 13 de junho de 2006.
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