Habeas Corpus Nº 67.869/sp

Medida de segurança (aplicação). Vaga em hospital psiquiátrico (inexistência). Tratamento ambulatorial (possibilidade).

Rel. Min. Nilson Naves


RELATÓRIO -
O EXMO. SR. MINISTRO NILSON NAVES: No Tribunal de Justiça, o habeas corpus lá impetrado buscava fosse colocado o paciente em tratamento ambulatorial. Eis os fundamentos do acórdão: “O paciente foi absolvido, com fulcro no artigo 386, inciso V, do Código de Processo Penal, da imputação dos artigos 214 e 213 (este c.c. o artigo 14, inciso II), ambas as condutas na forma do artigo 71, caput, todos do Código Penal (Ação Penal n° 135/04), tendo-lhe sido imposta, por conseguinte, medida de segurança, consistente em internação em estabelecimento hospitalar, pelo prazo mínimo de três anos. Postula-se, na presente impetração, a possibilidade do paciente ser colocado em liberdade (submetendo-se a tratamento ambulatorial) enquanto aguarda a abertura de vaga para internação em hospital psiquiátrico. Inviável o acolhimento da pretensão. Das informações prestadas pela autoridade apontada como coatora (fls.48), constata-se que foram expedidos os competentes ofícios solicitando a vaga para internação do paciente em nosocômio adequado. E, mais. Relata-se que o MM. Juízo do DECRIM 5, em ofício resposta datado de 15.12.2005, informou que o reeducando já foi incluído na lista cronológica de espera de vaga em estabelecimento hospitalar estadual, encontrando-se, àquela época, na 691ª posição. Assim, intuitivo considerar-se que a abertura de vaga no nosocômio não se insere mais no âmbito de competência do magistrado de conhecimento e, sim, no campo das responsabilidades da autoridade administrativa. Não há, portanto, falar-se em ilegalidade cometida pelo Poder Judiciário, passível de ser corrigida em sede de habeas corpus. Além disso, voltando nossa atenção às peculiaridades do caso vertente, mister observar-se a gravidade concreta das condutas perpetradas pelo paciente quando se encontrava solto (tentativa de estupro e atentado violento ao pudor consumado, nas quais figuraram como vítimas duas crianças), circunstância essa que se presta a indicar a acentuada periculosidade do agente e a temeridade que estaria ínsita à sua imediata colocação em liberdade, ainda que vigiada. No entanto, levando-se em conta o lapso decorrido entre a data dos ofícios expedidos e o presente momento, recomenda-se que aqueles sejam reiterados, solicitando urgência à autoridade administrativa na disponibilização da vaga para o paciente.“ Daí o presente habeas corpus, com estes pedidos: “a) A concessão da medida liminar ora requerida, transferindo o paciente José Gilson da Costa que se encontra ilegalmente na penitenciária de Praia Grande-SP para submissão de tratamento ambulatorial, com liberdade vigiada, uma vez que há total impossibilidade de permanecer na penitenciária ou de ser transferido para um hospital de tratamento psiquiátrico, uma vez que não existem vagas. b) Intimação do Ministério Público; c) O julgamento procedente do pedido, colocando imediatamente em liberdade o paciente para a submissão de tratamento ambulatorial, com liberdade vigiada.“ Indeferi a liminar. Opinou o Ministério Público Federal pela denegação da ordem. Eis a ementa do parecer: “Habeas corpus . Estupro. Atentado violento ao pudor. Absolvição. Medida de segurança. Alegada falta de vaga em hospital psiquiátrico. Impossibilidade de liberdade assistida. Alta periculosidade. Paciente já na fila de vagas.“ Informações de 19.4.07 dão conta de que o paciente ainda está preso no Centro de Detenção Provisória de São Vicente, aguardando remoção para hospital de custódia e tratamento psiquiátrico. É o relatório.

 
VOTO - O EXMO. SR. MINISTRO NILSON NAVES (RELATOR):
Determinei se juntasse aos autos certidão da comarca de São Vicente – Ofício das Execuções Criminais – de teor seguinte: “Situação da Execução Penal: O reeducando encontra-se preso no Centro de Detenção Provisória de São Vicente, aguardando remoção para Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico, cuja listagem cronológica única é de responsabilidade do Decrim 5 (Vara das Execuções Criminais da Comarca de São Paulo, fone: 0-xx-11-2127-9552). Este Juízo solicitou a remoção do sentenciado para estabelecimento adequado, constando ofício resposta datado de 15/12/2005, oriundo do Juízo do Decrim 5/São Paulo informando que o reeducando encontrava-se na 691ª posição da lista única cronológica. Este Juízo ainda, nesta data, está requerendo agendamento em Órgão de Assistência Psiquiátrica local, data para nova avaliação para verificação da cessação ou não da periculosidade do reeducando.“ Vejam que o paciente está preso, conquanto devesse encontrar-se internado de acordo com o art. 96, I, do Cód. Penal; em situação tal, padece ele de constrangimento ilegal, ao ver de alguns comentários da Terceira Seção, entre os quais: “Habeas corpus . Sentenciado inimputável. Imposição de medida de segurança. Cumprimento em estabelecimento inadequado. Falta de vagas. Juízo da execução penal. Artigos 66, inciso VI, da LEP e 96, inciso I do Código Penal. Concessão parcial da ordem. 1. A medida de segurança imposta na sentença deve informar a sua execução, não importando, contudo, em constrangimento ilegal, o tempo de permanência necessário à transferência do inimputável do estabelecimento próprio da prisão provisória para aqueloutro ajustado ao decretado pelo Poder Judiciário. 2. Tal tempo deve subordinar-se ao princípio da razoabilidade, que faz injustificável transferência que se retarde por mais de 30 dias. 3. Cumpre ao juiz das execuções, por outro lado, à luz da norma insculpida no artigo 66, inciso VI, da Lei de Execuções Penais, que lhe reclama zelo pelo correto cumprimento da medida de segurança, decidir sobre a questão da inexistência de vaga ou de estabelecimento adequado, adotando providências para ajustamento de sua execução ao comando da sentença. 4. Ordem parcialmente concedida para que seja determinada a imediata internação do sentenciado em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico, ou, à falta de vagas, para que o Juízo da Execução, ajustando-a, à luz do artigo 96, inciso I, do Código Penal, transfira-o para outro estabelecimento adequado, permitindo, inclusive, em caso de total impossibilidade, com as cautelas devidas, a substituição da internação por tratamento ambulatorial.“ (HC-18.803, Ministro Hamilton Carvalhido, DJ de 24.6.02.) “Execução penal. Recurso ordinário de habeas corpus . Aplicação de medida de segurança de internação. Falta de vaga em hospital psiquiátrico. I - Sendo aplicada ao paciente a medida de segurança de internação, constitui constrangimento ilegal sua manutenção em prisão comum, ainda que o motivo seja a alegada inexistência de vaga para o cumprimento da medida aplicada. II – A manutenção de estabelecimentos adequados ao cumprimento da medida de segurança de internação é de responsabilidade do Estado, não podendo o paciente ser penalizado pela insuficiência de vagas. Recurso provido.“ (RHC-13.346, Ministro Felix Fischer, DJ de 3.2.03.) Tal o contexto, concedo a ordem a fim de que seja submetido o paciente a tratamento ambulatorial até que surja vaga em estabelecimento adequado.

 
EMENTA -
Medida de segurança (aplicação). Vaga em hospital psiquiátrico (inexistência). Tratamento ambulatorial (possibilidade). 1. Aplicada medida de segurança consistente em internação em hospital psiquiátrico, configura constrangimento ilegal a manutenção do paciente em centro de detenção provisória. 2. Quando não há vaga em estabelecimento adequado – hospital psiquiátrico –, deve-se submeter o paciente a tratamento ambulatorial. 3. Habeas corpus deferido a fim de que seja submetido o paciente a tratamento ambulatorial até que surja vaga em estabelecimento adequado.

 
ACÓRDÃO -
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da SEXTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conceder a ordem de habeas corpus nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Hamilton Carvalhido e Maria Thereza de Assis Moura votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Paulo Gallotti e Paulo Medina. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Nilson Naves. Brasília, 12 de junho de 2007 (data do julgamento).

 

No Comments Yet.

Leave a comment