Habeas Corpus Nº 72.326/sp

Homicídio qualificado. Desaforamento. Matéria não deliberada pelo colegiado a quo. Liminar deferida pelo desembargador relator para suspender o curso da ação penal. Excesso de prazo. Ordem concedida em outro writ a fim de libertar o paciente, que se encontra segregado em função de outra ação penal. Pedido prejudicado. Testemunhas arroladas pela acusação que mentiram em juízo. Inviabilidade de discussão dessa matéria na presente via. Necessidade de revolvimento do conjunto fático-probatório. Nomeação de defensor ao paciente. Constituição superveniente de defensor particular. Riscos de morte suportados no presídio. Questão que deve ser apurada perante o juízo a quo.

Rel. Min. Jane Silva


RELATÓRIO - A EXMA. SRA. MINISTRA JANE SILVA (DESEMBARGADORA CONVOCADA DO TJ/MG) (Relator):
Trata-se de habeas corpus impetrado de próprio punho por MARLON LINO no qual alegou suportar constrangimento ilegal exercido pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Argumentou que se encontra provisoriamente constrito na Cidade de Sorocaba - SP, local onde se encontra jurado de morte pelos agentes penitenciários. Disse que será levado a julgamento perante o Tribunal do Júri e, caso venha a ser condenado, permanecerá no mesmo local. Portanto, pleiteou o desaforamento para outra Comarca. Também alegou que está preso provisoriamente por mais tempo do que autoriza a lei. Argüiu que a acusação que lhe foi feita não procede, sendo que as testemunhas da acusação mentiram em juízo para lhe prejudicar. Por fim, requereu a nomeação de um causídico para lhe representar, tendo em vista não possuir condições de contratar defensor particular. Prestadas as informações pela autoridade coatora (fl. 21/65, 77/93, 97/102, 106/122 e 130/173), o Ministério Público Federal opinou pelo não-conhecimento da ordem e, no mérito, por sua denegação (fl. 175/179). É o relatório. Em mesa para julgamento.

 
VOTO - A EXMA. SRA. MINISTRA JANE SILVA (DESEMBARGADORA CONVOCADA DO TJ/MG) (Relator):
Trata-se de habeas corpus impetrado de próprio punho por MARLON LINO no qual alegou suportar constrangimento ilegal exercido pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Argumentou que se encontra provisoriamente constrito na Cidade de Sorocaba - SP, local onde se encontra jurado de morte pelos agentes penitenciários. Disse que será levado a julgamento perante o Tribunal do Júri e, caso venha a ser condenado, permanecerá no mesmo local. Portanto, pleiteou o desaforamento para outra Comarca. Também alegou que está preso provisoriamente por mais tempo do que autoriza a lei. Argüiu que a acusação que lhe foi feita não procede, sendo que as testemunhas da acusação mentiram em juízo para lhe prejudicar. Por fim, requereu a nomeação de um causídico para lhe representar, tendo em vista não possuir condições de contratar defensor particular. Verifiquei cuidadosamente as razões apresentadas pelo impetrante e, ao compará-las com a decisão ora impugnada, com as informações prestadas e com os documentos acostados aos autos, não vejo como acolher sua pretensão. Inicialmente, cumpre-nos observar que o presente writ deve ser apenas parcialmente conhecido. Segundo informado pelo nobre Desembargador Presidente da Seção Criminal da Corte a quo (fl. 137/138), fora deferida, em 09 de outubro do corrente ano, medida liminar a fim de suspender a ação penal pela qual o paciente seria levado a Júri Popular em desaforamento postulado pela defesa, ainda pendente de apreciação pelo Colegiado. Cópia da mencionada se encontra encartada à fl. 167. Portanto, ainda não tendo o Tribunal a quo examinado definitivamente a questão, o exame do pleito por esta Casa configuraria manifesta supressão de instância. Ademais, a tutela de urgência fora deferida em benefício do próprio paciente, donde se infere que o pedido, nesse ponto, se encontraria prejudicado, por evidente perda de objeto. No que se refere ao alegado excesso de prazo, foi informado pelo Magistrado de 1º Grau (fl. 130/134) que o paciente foi denunciado e pronunciado, nos autos da ação penal 131/02, como incurso, em tese, nas penas do artigo 121, §2º, I, III e IV do Código Penal (por duas vezes, uma delas tentada), sendo que seu julgamento em plenário somente não ocorreu em razão dos pedidos de desmembramento e de adiamento feitos pela própria defesa. Acrescentou que esta Casa, nos autos do HC 62.520/SP, determinou a soltura do paciente por excesso de prazo, o que foi devidamente cumprido. Todavia, aduziu que ele não chegou a ser solto, eis que também se encontrava segregado em razão da ação penal 453/98. Portanto, consoante parecer exarado pela ilustre Subprocuradora-Geral da República, ainda que haja excesso de prazo para a realização do julgamento do paciente, ele não se encontra segregado em função da dita ação penal, mas sim por causa de outra, não havendo, portanto, qualquer ilegalidade a sanar nesse aspecto. Quanto à alegação de que as testemunhas arroladas pela acusação mentiram em juízo para prejudicar os interesses do paciente, sendo que o Magistrado de 1º Grau nada fez para resguardar seus direitos, entendo que a presente via não comporta seu exame, eis que demandaria o revolvimento do conjunto fático-probatório colhido nos autos da ação penal de conhecimento ajuizada pelo Ministério Público. Ademais, a documentação acostada aos autos não nos permite concluir que o paciente seja vítima de má-fé por parte das testemunhas e demais serventuários da Justiça, razão pela qual o pedido não comporta deferimento. Sobre o pleito de nomeação de defensor ao paciente, que impetrou a presente ordem de próprio punho, entendo que ele se tornou desnecessário. Consoante se infere à fl. 163, o paciente já constituiu defensor próprio, o qual, como visto, obteve êxito na liminar requerida no pedido de desaforamento deduzido. Logo, encontrando-se o paciente defendido por profissional gabaritado ao exercício desse mister, não mais há motivos para lhe nomear outro defensor. Por fim, sobre as alegações de que vem sofrendo risco de morte no presídio em que atualmente se encontra, o presente remédio constitucional não se mostra apto a dirimi-las. Portanto, deverá o Tribunal a quo diligenciar no sentido de apurar a veracidade e extensão dessas argüições. Ante tais fundamentos, conheço parcialmente da ordem e, nessa extensão, julgo parte prejudicada e denego o restante, recomendando ao Tribunal a quo a apuração das alegações referentes ao suposto perigo de morte do paciente na penitenciária em que se encontra. É como voto.

 
EMENTA -
PROCESSUAL PENAL – HABEAS CORPUS – HOMICÍDIO QUALIFICADO – DESAFORAMENTO – MATÉRIA NÃO DELIBERADA PELO COLEGIADO A QUO – LIMINAR DEFERIDA PELO DESEMBARGADOR RELATOR PARA SUSPENDER O CURSO DA AÇÃO PENAL – EXCESSO DE PRAZO – ORDEM CONCEDIDA EM OUTRO WRIT A FIM DE LIBERTAR O PACIENTE, QUE SE ENCONTRA SEGREGADO EM FUNÇÃO DE OUTRA AÇÃO PENAL – PEDIDO PREJUDICADO – TESTEMUNHAS ARROLADAS PELA ACUSAÇÃO QUE MENTIRAM EM JUÍZO – INVIABILIDADE DE DISCUSSÃO DESSA MATÉRIA NA PRESENTE VIA – NECESSIDADE DE REVOLVIMENTO DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO – NOMEAÇÃO DE DEFENSOR AO PACIENTE – CONSTITUIÇÃO SUPERVENIENTE DE DEFENSOR PARTICULAR – RISCOS DE MORTE SUPORTADOS NO PRESÍDIO – QUESTÃO QUE DEVE SER APURADA PERANTE O JUÍZO A QUO – ORDEM PARCIALMENTE CONHECIDA E, NESSA EXTENSÃO, PARCIALMENTE PREJUDICADA E DENEGADA NO RESTANTE, COM RECOMENDAÇÃO. 1. Inviável o debate de matéria não deliberada perante a Corte a quo nesta Casa, sob pena de supressão de instância, notadamente quando o Desembargador Relator deferiu a liminar a fim de acolher o pleito defensivo. 2. Encontrando-se preso por ordem contida em outra ação penal, impossível o relaxamento da prisão do paciente por excesso de prazo, até mesmo porque esta Casa já havia determinado sua soltura na ação penal ora questionada. 3. A estreita via do habeas corpus, desprovida de dilação probatória, não comporta o exame de questões que demandam o profundo revolvimento do conjunto fático-probatório colhido nos autos da ação penal de conhecimento ajuizada contra o paciente. 4. A superveniente constituição de causídico próprio pelo paciente inviabiliza seu pleito de nomeação de defensor dativo, feita de próprio punho no momento da impetração. 5. Os alegados riscos de morte sofridos pelo paciente no presídio em que se encontra devem ser apurados pela Instância a quo. 6. Ordem parcialmente conhecida e, nessa extensão, julgada prejudicada em parte e denegada no restante, com recomendação.

 
ACÓRDÃO -
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da QUINTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer parcialmente do pedido, julgando-o parcialmente prejudicado e, no mais, denegar a ordem, com recomendação, nos termos do voto da Sra. Ministra Jane Silva (Desembargadora Convocada do TJ/MG). Os Srs. Ministros Felix Fischer, Laurita Vaz, Arnaldo Esteves Lima e Napoleão Nunes Maia Filho votaram com a Sra. Ministra Relatora. Brasília, 11 de dezembro de 2007.(Data do Julgamento)

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