A BANALIZAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA

Por César Dario Mariano da Silva -  

Alguns ministros do Supremo Tribunal Federal têm sistematicamente absolvido autores de furto de coisas de pequeno valor por ausência de tipicidade material, aplicado o princípio da insignificância.

Com o devido respeito, a aplicação de referido princípio foi banalizada em nosso país, notadamente pela Excelsa Corte.

De acordo com o princípio da insignificância, para que haja crime se exige efetiva lesão a bem juridicamente protegido pela norma penal. Em algumas situações a lesão é tão insignificante que não há interesse para o Direito Penal. Há, nesses casos, os chamados crimes de bagatela, que são fatos atípicos.

Pode parecer à primeira vista que seria absurdo condenação por ter alguém furtado ou tentado furtar bens de pequeno valor, como peças de picanha, de queijo, bebidas, entre outros.

No entanto, a questão não se resume apenas ao valor dos bens, que, para muitos, não é insignificante, notadamente em país em que boa parte da população aufere um salário mínimo.

Imaginem se a moda pega e todos os ladrões souberem que poderão furtar à vontade objetos com valores pequenos, já que a Excelsa Corte será condescendente e os absolverá.

Serão dezenas de milhares de pessoas furtando os diversos estabelecimentos comerciais pelo país, que terão prejuízo substancial, podendo levar os pequenos comércios à falência, e causar grande perda patrimonial para os maiores, com reflexo nos preços das mercadorias.

Por isso, esse princípio, que é criação doutrinária e jurisprudencial, só deve ser aplicado em situações excepcionais.

A insignificância da lesão deve ser aferida pela consideração de todo o contexto da ordem jurídica vigente. Não basta apenas a insignificância do objeto jurídico ou material tutelado pela norma, mas o grau de intensidade em que esses bens jurídicos são atingidos pela conduta.

Somente nos casos em que o autor não for pessoa useira e vezeira da prática de crimes patrimoniais e o valor do dano for inexpressivo pode-se aplicar o princípio da insignificância. Posso citar como exemplos o furto de uma banana, de um alfinete, ou seja, quando não houver nenhum reflexo patrimonial para a vítima. Além disso, o crime não pode ser cometido com o emprego de violência ou grave ameaça à pessoa, e não ser o ladrão reincidente ou possuidor de maus antecedentes criminais. Ou seja, somente quando não houver periculosidade do agente.

Lembro que o artigo 155, §2º, do Código Penal prevê a figura do furto privilegiado se o furtador for primário e de pequeno valor a coisa subtraída, justamente para essas situações. Nessas hipóteses, o juiz pode substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuir a pena de um a dois terços, ou aplicar somente a pena de multa.

O Direito Penal deve ser veículo para a prevenção de delitos, e não para seu estímulo. A ausência de punição ou punição insuficiente para condutas previstas no Código Penal contribuem decisivamente para o incremento da criminalidade, podendo, em alguns casos, estimular a vingança privada, com o ressurgimento dos matadores de aluguel ou "pés de pato", muito comuns na década de 90 nas periferias das grandes cidades.

Com efeito, a fim de que não haja incentivo à prática de crimes patrimoniais, notadamente furto, o princípio da insignificância deverá ser aplicado apenas em situações extraordinárias, quando o grau de ofensividade for mínimo, a periculosidade social da conduta, inexistente, a reprovação social, diminuta e a lesão ao bem jurídico, inexpressiva.

 

Comments are closed.