Incidente de restituição de bens. Falta de instrumento conferindo mandato aos procuradores que subscrevem a irresignação. Apelo não conhecido.
Rel. Des. Paulo Afonso Brum Vaz
Trata-se de apelação, tempestivamente interposta por Adud Turismo Ltda., contra a r. sentença da Vara Federal Criminal da Subseção Judiciária de Florianópolis, em Santa Catarina, a qual julgou extinto o pedido deste incidente de restituição de coisas apreendidas, frente à existência de coisa julgada. Aduz a recorrente, em síntese, ter se operado a coisa julgada sobre o anterior pedido de restituição, cuja rejeição foi motivada pela dubiedade quanto à lícita origem dos bens e valores pretendidos. Avançando, observa insurgir-se, neste momento, quanto ao excesso de prazo para oferecimento da denúncia, prestes a atingir um biênio. Adverte, assim e ao abrigo desse novel argumento, inexistir sobre tal questão a propalada coisa julgada, motivo pelo qual pode ser processado o presente pedido. Noticia ter sido efetivada a apreensão em 15.12.2005 e, nada obstante o silêncio da lei penal substantiva quanto ao lapso para oferecimento da exordial acusatória, menciona incidir ao caso a previsão do artigo 4º, parágrafo 1º, da Lei nº 9.613/98. Arremata observando sobre a ilegalidade da constrição, ante a fluência de prazo superior a 120 (cento e vinte) dias para que iniciada a persecução no âmbito judicial. Menciona derivar dessa situação ofensa aos incisos LIV e LXXVIII, ambos do artigo 5º da Constituição, os quais asseguram, respectivamente, propriedade e liberdade, e a razoável duração do processo. Enfim, após citar precedentes da jurisprudência deste Regional e discorrer sobre a lícita origem da quantia apreendida, fruto do trabalho de 01 (um) ano, almeja seja ela e os demais bens restituídos, conforme prevê o artigo 118 da lei penal adjetiva (fls. 18/30). O Ministério Público Federal, em preliminar de suas contra-razões, observa inexistir nos autos instrumento conferindo mandato aos ilustres procuradores que subscrevem a irresignação. No mérito, especificamente quanto ao ventilado excesso de prazo para o oferecimento da denúncia, deduz estar prejudicado o argumento, frente ao recebimento da inicial acusatória em 16.5.2007. Conclui ser tal fato suficiente para gerar o improvimento do recurso, acaso desacolhida a preliminar (fls. 32/34). Recebido o apelo (fl. 35), foram os autos encaminhados a esta Corte e remetidos à douta Procuradoria Regional da República, a qual emitiu parecer pugnando pelo acolhimento da preliminar de não conhecimento do inconformismo e, no mérito, pelo desprovimento do apelo (fls. 38/42). É o breve Relatório. Decido. Antes de se adentrar no mérito desta controvérsia, cumpre aferir acerca da pertinência, ou não, da preliminar suscitada pelo Ministério Público Federal e concernente à regularidade da representação do apelante (fls. 33/34 e 38/42). Pois bem. Compulsados os autos, autentica-se a informação no sentido de neles inexistir instrumento de mandato conferindo poderes de representação, pelo presentante da empresa, aos ilustres advogados que subscrevem a inicial e o inconformismo ora sob apreciação (fls. 09, 19 e 30). Nesse caso, da conjugada leitura dos artigos 31, 577 e 578, parágrafo primeiro, todos da Lei Penal Adjetiva, percebe-se a viabilidade de ser a irresignação manejada pelo próprio interessado. Essa, entretanto, não é a realidade dos autos, consoante acima afirmado, porquanto as peças existentes no processo restaram firmadas por experts detentores de legal habilitação para fazê-lo. Nessa senda, essencial para o prosseguimento do feito é a comprovação da outorga do mandato, meio pelo qual implementada a representação processual. Objetiva conseqüência disso é a da impossibilidade de conceder-se trânsito ao apelo, frente a sua manifesta inadmissibilidade. Nesse sentido, os precedentes de jurisprudência abaixo transcritos, ambos referidos pelo eminente Júlio Fabbrini Mirabete, em comentário ao artigo 593 da lei penal adjetiva, verbis: Firmada a petição da apelação por advogado não constituído pelo réu e nem dativo, não podendo, em conseqüência, postular em nome de terceiros, não se conhece do recurso interposto (RT 558/382 – TJMG Não se conhece de apelação interposta por advogado sem procuração nos autos, pressuposto para legitimá-lo a praticar tal ato processual (JTAERGS 90/36)(in Código de Processo Penal Interpretado. 8ª ed. São Paulo: Atlas, 2001. p. 1238) A esse propósito, aliás, já tive oportunidade de decidir, quando exarei decisão nos autos do Mandado de Segurança nº 2005.04.01.025185.8/PR. Assim, pela pertinência temática, permito-me reproduzir abaixo breve excerto do aludido decisum, vertido nas seguintes letras: Por derradeiro, ressalta-se que, como é cediço, o instrumento de mandato é documento essencial sem o qual são considerados inexistentes os atos processuais praticados pelo advogado. Realmente, a lei processual civil, em seu artigo 37, exige que a parte esteja representada tecnicamente, ou seja, por quem tenha capacidade postulatória, não podendo o advogado, assim, esquivar-se da obrigação de exibir a procuração outorgada por seu cliente, como se verifica no caso, não tendo o causídico, tampouco, protestado pela concessão de prazo para a sua juntada aos autos. (TRF 4ª Região, MS nº 2005.04.01.025185.8/PR, 8º Turma, Rel. Desembargador Federal Paulo Afonso Brum Vaz, DJ 13.7.2005) Arrematando esta preliminar, cumpre destacar ter constado o alerta condizente com a ausência de capacidade postulatória dos advogados do recorrente, explicitamente, no corpo da decisão cuja cópia guarnece a fl. 11-verso dos autos. Em outras palavras, já em anterior oportunidade, igualmente visando à restituição dos mesmos bens objeto destes autos, os advogados não demonstraram a sua habilitação para estar em juízo. E, aqui, renovaram o procedimento, desconsiderando essa cautela. Prosseguindo, tendo em mente a instrumentalidade e a efetividade do processo, poder-se-ia cogitar da conveniência de serem os autos devolvidos ao juízo de origem, onde, intimados os ilustres defensores, haveria oportunidade para sanação do vício ora apontado. Tal diligência, ademais, encontraria perfeito amparo na eficácia que se pretende imprimir ao princípio pas de nullité sans grief, não fossem, além do argumento já expendido, outros dois obstáculos hábeis a refletirem sua inutilidade. O primeiro deles - e assim já se permeia o próprio mérito -, é relativo à documentada circunstância de ter havido oferta e recebimento da exordial acusatória (fls. 12-verso e 43/45). Aliás, vale destacar que o oferecimento dessa denúncia ocorreu em 03.5.2007 (fl. 12-verso), materializando-se em 16.52007 o seu recebimento (fl. 43). Independentemente desse quadro, contudo, e da eventual análise de má-fé processual, o termo de apelo foi protocolado em 19.6.2007 (fl. 17), insistindo-se, no corpo de suas razões, na tese de excesso de prazo. Essa realidade, dessa forma, é suficiente para inibir e qualificar de prejudicado o debate acerca do invocado (fl. 30), ventilado excesso de prazo para a ultimação das averiguações na seara inquisitorial. Enfim, acerca da licitude dos bens apreendidos, fruto do árduo trabalho de um ano inteiro, segundo narrativa do recorrente (fl. 28), convém reproduzir a síntese formulada pelo insigne representante do Parquet (fl. 40): Todavia, a defesa não foi capaz de comprovar nem a origem lícita dos bens em questão (que, frise-se são objeto de análise de crimes contra o sistema financeiro) e nem o real prejuízo que a ADUD TURISMO LTDA. enfrenta com a apreensão dos mesmos. Com efeito, excetuadas as alegações da recorrente concernentes à licitude dos bens, nos autos inexistem quaisquer documentos hábeis a autenticar essa frágil asserção. Sobre isso, ao revés, somente consta a afirmação da ínclita Julgadora a quo, na já referida cópia da decisão emitida nos autos do incidente de restituição de coisas apreendidas nº 2006.72.00.011750-7/SC (fl. 11-verso). Nessa linha, acolho a preliminar ventilada pela Procuradoria Regional da República e, ao abrigo da previsão do artigo 37, § 1º, inciso II do Regimento Interno deste Tribunal, nego seguimento ao apelo, porquanto manifestamente inadmissível o inconformismo e, além disso, prejudicado o seu objeto (reconhecimento do excesso de prazo no oferecimento da denúncia). Deverá a parte, interessando-se-lhe, propor nova medida perante o magistrado primevo, discutindo, e produzindo farta prova de suas alegações (art. 156 do CPP), a licitude da procedência do patrimônio constrito, de forma a elidir a dubiedade no decisum outrora proferido. Intimem-se. Publique-se.