Sonegação fiscal. Carta Precatória. Prazo esgotado para sua devolução. Testemunha não encontrada nos endereços fornecidos. Pedido de suspensão do processo na fase do art. 499 do CPP objetivando diligências pelo juízo deprecante junto aos órgãos públicos no sentido de localizar e ouvir a referida testemunha. Indeferimento. Legalidade.
Rel. Des. Élcio Pinheiro De Castro
- Cuida-se de habeas corpus, com pretensão liminar, impetrado por Dorvalino Tizatto, em favor de Paulo Roberto Lisboa Triches, contra ato do MM. Juiz da Vara Federal Criminal de Caxias do Sul/RS. Segundo se depreende, o paciente, ao lado de Paulo Fernando Thumé e Delmar Basso, foi denunciado pela prática do delito tipificado no artigo 1º, incisos I, II, IV e V c/c 11 e 12, I, todos da Lei nº 8.137/90; além dos previstos nos artigos 293, V e 171, § 3º, ambos do Código Penal. Narra a peça acusatória que “PAULO ROBERTO LISBOA TRICHES e PAULO FERNANDO THUMÉ, na condição de sócios-diretores com poderes de administração da pessoa jurídica SULE ELETRODOMÉSTICOS S.A. (IPL nº 176/00) e DELMAR BASSO, na condição de responsável pela contabilidade da referida empresa, reduziram tributos e contribuições federais, nos períodos de apuração de agosto de 1998 a dezembro de 1999, no valor total de R$ 15.292.510,98 (quinze milhões, duzentos e noventa e dois mil, quinhentos e dez reais e noventa e oito centavos) pertinentes a Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI (R$ 14.090.898,38) Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social - COFINS (R$ 96.877,52) e Contribuição para o Programa de Integração Social - PIS (R$ 294.735,08) mediante prestação de declarações falsas às autoridades fazendárias, inserção de elementos inexatos em documentos exigidos pela lei fiscal e utilização de documentos que sabiam ou deviam saber ser ideologicamente falsos (...). Descreveu, ainda, que o paciente, “procurador constituído, com poderes de gerência da empresa MIL E DEZ RADIODIFUSÃO LTDA.; sócio-gerente da TRÍDIO RADIODIFUSÃO LTDA.; e da Importadora de Ferragnes TRICHES Ltda. (IPL nº 174/00) e DELMAR BASSO, na condição de responsável pela contabilidade de todas as empresas mencionadas, usaram as guias de arrecadação de contribuições falsificadas e os documentos de arrecadação de receitas federais adulterados, tendo ciência da falsidade, obtiveram para si e para outrem vantagem indevida mediante fraude, induzindo em erro os funcionários da Delegacia da Receita Federal (...)“ bem como houve tentativa de praticar o mesmo delito contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS. A denúncia foi recebida em 30.05.2005. Na fase instrutória, o ilustre julgador singular, em 20.04.2007, proferiu o despacho a seguir: “(...) Cumpra-se integralmente a decisão das fls. 1866-1867. Estando, há muito, esgotado o prazo para a oitiva das testemunhas residentes em São Paulo, determino o prosseguimento do feito, devendo a carta precatória ser juntada aos autos posteriormente, na forma do § 2º do art. 222 do CPP. Intimem-se as partes acerca desta decisão e, inclusive, da abertura do prazo do art. 499 do CPP, a iniciar pelo Ministério Público Federal.“ Em razão disso, a defesa, considerando a importância da oitiva da testemunha João Baptista Alves Mourão Júnior, e que a sua inquirição não foi efetivada na data aprazada (27.02.2007 - em São Paulo) por circunstâncias alheias a sua vontade (possível erro do cartório decorrente de suposto extravio de mandado de intimação) impetrou habeas corpus - protocolado nesta Corte sob o nº 2007.04.00.017595-5 - postulando que se aguarde “o retorno da precatória de oitiva da testemunha João Baptista para, somente depois dar por encerrada a fase probatória com o prosseguimento da Ação Penal.“ A liminar foi deferida em parte, cabendo transcrever o seguinte trecho: “(...) Diante desse quadro, considerando: (a) que o depoimento de João Baptista, em princípio, não se deu na data marcada por problemas 'cartorários'; (b) o conhecimento, em tese, da testemunha sobre os fatos; (c) inexistência de iminente prescrição da pretensão punitiva estatal (a denúncia foi recebida em 30.05.2005 - fl. 44) e (d) principalmente a circunstância de já ter sido designada nova audiência para sua oitiva (14.08.2007) inexiste óbice para que não se aguarde a realização do referido ato processual, prolatando-se posteriormente a sentença. Todavia, ao contrário do alegado na impetração, não é caso de suspender o processo na fase do artigo 499 do Código de Processo Penal, porquanto nada impede a realização de eventuais diligências que não tiverem relação com a oitiva da aludida testemunha. A apresentação das alegações finais, porém, deve aguardar o retorno da referida carta, pois se as razões forem anteriormente juntadas aos autos, haverá necessidade de abrir prazo para complementação. Ante o exposto, presentes os requisitos legais (fumus boni iuris e periculum in mora) defiro em parte a liminar para determinar, na fase do artigo 500 do CPP, o sobrestamento da ação penal nº 2000.71.07.005062-8 até o julgamento do presente mandamus pelo Colegiado. Solicitem-se informações à digna autoridade impetrada, que as prestará no prazo de 10 (dez) dias. Oficie-se à 9ª Vara Federal Criminal de São Paulo/SP para que esclareça se a testemunha João Baptista Alves Mourão Júnior já foi intimada da audiência designada para o dia 14.08.2007. Remeta-se, em anexo, cópia da fl. 107. Após, abra-se vista dos autos à douta Procuradoria Regional da República. Intimem-se. Publique-se.“ Na sessão de 13.06.2007, a Oitava Turma deste Regional, por unanimidade, não conheceu do mandamus, nos seguintes termos constantes do voto-condutor: “(...) Conforme se depreende, o presente habeas corpus foi impetrado objetivando a suspensão da ação penal até 'o retorno da precatória de oitiva da testemunha João Baptista para, somente depois dar por encerrada a fase probatória com o prosseguimento da Ação Penal.' Entretanto, respondendo à solicitação desta Corte, o ilustre Juiz da 9ª Vara Federal Criminal de São Paulo relatou o seguinte (fl. 128): 'Em atenção ao ofício nº 1746646-ST8, informo a Vossa Excelência que a testemunha JOÃO BAPTISTA ALVES MOURÃO JÚNIOR, arrolada pela defesa do paciente, não foi localizada por ocasião da diligência efetivada pelo Oficial de Justiça deste Juízo, pertinente ao mandado de intimação expedido para comparecimento à audiência designada para o dia 14 de agosto de 2007, uma vez que os endereços fornecidos não pertencem à testemunha. Esclareço, ainda, que em razão da não localização da testemunha, foi determinada a devolução da carta precatória ao Juízo Deprecante.' Corroborando a informação acima, em consulta efetuada ao sistema de acompanhamento processual da Justiça Federal de São Paulo, constata-se que na data de 30.05.2007 foi lançada a seguinte fase nos autos da Carta Precatória: 'Baixa Definitiva Deprecante/Ordenante/Rogante - conf. Guia nº 284/2007 (9ª Vara).' Frente a esse quadro, como o writ foi ajuizado para que o feito somente prosseguisse após retorno da aludida Carta, a restituição desta implica, logicamente, na perda de objeto do presente mandamus, tornando-o manifestamente prejudicado. Ante o exposto, revogo a liminar e não conheço do habeas corpus.“ No que pertine à matéria em debate, na fase do artigo 499, o MM. Juiz a quo assim se manifestou: “(...) Finalmente, considerando a certidão da fl. 2204, abra-se vista à defesa de Paulo Triches, na forma do art. 405 do CPP. Após, independemente da apresentação do endereço da testemunha faltante, considerando que o Habeas Corpus nº 2007.04.00.017595-5 perdeu o objeto (fls. 2073-2079) abra-se o prazo do art. 500 do CPP.“ Em razão disso, foi ajuizado o presente writ. Reiterando a importância da aludida prova, sustenta o Impetrante que “não há como o Magistrado a quo firmar opinião decisória apta a estribar o decisum final sem que se proceda a oitiva da testemunha mais importante do feito, Sr. João Baptista Alves Mourão“, mencionando ser a mesma “insubstituível“. Aduz também que não houve intenção de procrastinar o feito, havendo verossimilhança quanto aos endereços fornecidos, não tendo a defesa meios de localizar a testemunha. Logo, solicita que “as alegações finais do artigo 500 do CPP sejam propiciadas às partes após as diligências no sentido de localizar e ouvir a referida testemunha. Outrossim, para a perfectibilização da medida supra, requer seja determinado que os Órgãos Competentes (Justiça Eleitoral, Receita Federal, Polícia Civil, TELESP, etc) sejam oficiados, fornecendo o autal endereço do Sr. João Baptista“. A irresignação do Impetrante, ao menos neste juízo provisório, não merece trânsito, pois, como é cediço, não é incumbência do juízo diligenciar a respeito do correto endereço da testemunha, sendo ônus da parte que a arrolou. Nesse sentido: “PROCESSUAL PENAL. LATROCÍNIO. NULIDADE DO PROCESSO. PEDIDO DE ADIAMENTO DE INTERROGATÓRIO PARA QUE PUDESSE SER REALIZADA COM A PRESENÇA DO DEFENSOR INDEFERIDO. VIOLAÇÃO AO CONTRADITÓRIO FACE À REALIZAÇAÕ DE NOVO INTERROGATÓRIO NA FASE DO 499. NÃO REALIZAÇÃO DE OITIVA DE TESTEMUNHA. 1 e 2. 'omissis'. 3. Não configura ofensa ao princípio da ampla defesa o fato de não ter sido realizada a inquirição de testemunha requerida pela defesa, na fase do 499, em razão de não ter sido encontrada no endereço indicado. 4. Recurso a que se nega provimento.“ (STJ, Quinta Turma, RHC nº 10801/PE, Rel. Min. Edson Vidigal, public. no DJU de 12.03.2001, p. 155). Não se deve olvidar que o Juiz pode “determinar, de ofício, diligências para dirimir dúvida sobre ponto relevante“ (art. 156 do CPP). Contudo, o exame da necessidade e conveniência é próprio e exclusivo do Magistrado, porquanto ele é o destinatário da prova que fica ao seu prudente arbítrio. Ante o exposto, não vislumbrando, por ora, flagrante ilegalidade na decisão atacada, indefiro a liminar. Inexiste necessidade de solicitar informações à digna autoridade impetrada. Abra-se vista dos autos à douta Procuradoria Regional da República. Intimem-se. Publique-se. Porto Alegre, 16 de julho de 2007.
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