Habeas Corpus Nº 2007.04.00.023406-6/rs

Trancamento de ação penal. Crime ambiental. Art. 34 da Lei 9605/98. Prática de pesca predatória. Ajuizamento de segunda ação relacionada ao mesmo fato. Hipótese de litispendência. Suspensão do processo tão-só quanto aos réus que foram duplamente ddenunciados.

Rel. Des. Élcio Pinheiro De Castro


Cuida-se de Habeas Corpus, com pretensão liminar, impetrado por FAUSTO GOMES ALVAREZ, em favor de MARCOS ANTÔNIO OCKER, objetivando o trancamento da ação penal nº 2005.71.00.037065-6, em trâmite na Vara Federal Ambiental de Porto Alegre. Consoante se depreende dos documentos juntados, o Ministério Público Federal, com apoio no IPL nº 166/04, ofereceu denúncia em desfavor do Paciente e de MÁRCIO ANDRIANI, dando-os como incursos nas sanções do artigo 34 da Lei 9.605/98 (fls. 114/7). A peça acusatória, que deu origem à Ação Penal nº 2004.71.00.010404-6, distribuída a 3ª VF Criminal de Porto Alegre, assim narrou os fatos: “No dia 15 de maio de 2003, por volta das 11 horas, policiais da Patrulha Ambiental da Brigada Militar e funcionários do IBAMA, em atividade de fiscalização flagraram os denunciados utilizando a embarcação Giovana IV, com 135 metros de rede de parelha com malha de 120mm e 150mm, e aproximadamente 120 quilos de peixes de diversas espécies, na prática da pesca predatória dentro dos limites das 3 milhas marítimas, na praia do Município de Arroio do Sal/RS. Após decisão declinatória de competência do Juízo da Comarca de Torres/RS, sobreveio a distribuição do processo-crime nº 2005.71.00.037065-6, em que o Ministério Público Estadual, com base no Inquérito Policial nº 298/2003 instaurado perante a Delegacia de Polícia Civil de Arroio do Sal, denunciou MARCOS e mais 22 (vinte e dois) réus, relatando os eventos, em suma, nas seguintes letras: “Em 15 de maio de 2003, no mar, aproximadamente a uma milha marítima da costa, no Litoral Norte do Estado, Município de Arroio do Sal, os denunciados (...) em acordo de vontades e conjugação de esforços, pescaram utilizando meio proibido pela autoridade competente (...). Na oportunidade, os denunciados, tripulantes das embarcações Giovana I, Giovana II, Giovana III e Giovana IV, pescavam com redes de arrasto. O fato foi constatado pela Patrulha Ambiental (PATRAM), que realizou a abordagem das embarcações (...) constatando-se a presença de aproximadamente seis toneladas de pescado na embarcação Giovana III e de cinco toneladas de peixes na Giovana IV (...) Assim agindo, incorreram os denunciados nas sanções do art. 35, II, parte final, da Lei 9.605/98.“ Diante disso, a Procuradoria da República requereu o apensamento dos autos, ratificou a denúncia ofertada perante o Juízo Estadual, bem como aditou a exordial para incluir Márcio Andriani no feito nº 2005.71.00.037065-6, na condição de proprietário das embarcações. Mediante decisão proferida em 30.04.2007, a peça em debate e o respectivo aditamento foram recebidos pela ínclita autoridade apontada como coatora (fls. 206/9) que designou o dia 25 de julho corrente para o interrogatório de ambos os acusados. Daí o ajuizamento do presente mandamus. Nas razões, aduz o Impetrante, em síntese, que o fato atribuído a MARCOS (pesca em local proibido no dia 15 de maio de 2003) já é objeto da Ação Penal nº 2004.71.00.010404-6, caracterizando-se manifesto bis in idem. Alega que a pesca com rede de arrasto não representa utilização de “meio proibido pela autoridade competente“, não se configurando, no caso, o delito previsto no art. 35, II, da Lei nº 9.605/98. Afirma, também que os Autos de Infração lavrados pelo IBAMA foram anulados por sentença da mesma Vara Federal Ambiental, afastando a materialidade do crime em tese ocorrido, porquanto inexiste a posição geográfica exata da suposta prática ilegal, não sendo possível definir se o local da pesca era ou não permitido. Nesse contexto, requer o deferimento de liminar para suspender o andamento da ação penal nº 2005.71.00.037065-6 e a posterior concessão da ordem pela Turma para que seja trancado o processo. Em que pese a manifestação do Ministério Público perante o Juízo de primeiro grau, defendendo “a permanência e integridade das duas ações penais, porque substancialmente distintas e autônomas, embora se afigurem desdobramentos de uma mesma conjuntura fática, eis que os comportamentos bosquejados em ambas as normas conduzem a penas discordantes“, é indiscutível que o Paciente já foi denunciado em juízo pelo evento ocorrido em 15 de maio de 2003, no mar territorial próximo à praia de Arroio do Sal/RS, mostrando-se inadmissível a repetição de ações sobre o mesmo fato, o que caracteriza hipótese de litispendência. Constata-se que a denúncia, no feito nº 2004.71.00.010404-6, foi recebida em 18/05/2005 (fl. 113). Ou seja, desde aquela data, o Paciente encontra-se respondendo a ação penal por delito contra a fauna previsto na Lei 9.605/98, especificamente relacionado à pesca. Se, posteriormente ao recebimento da exordial, surgiram novas provas ou se o Parquet pretende o reenquadramento típico da conduta, a toda evidência poderá, antes da sentença, suprir tais omissões no tocante à primeira peça ajuizada, nos termos do art. 569 do CPP. Contudo, revela-se absolutamente inadequada a propositura de segunda ação penal relacionada ao mesmo fato, por configurar, sem sombra de dúvida, o alegado bis in idem. Por outro lado, a análise das teses do Impetrante no que tange à ausência de materialidade do delito e não-ocorrência da pesca de modo proibido mostra-se impróprio nesta via de cognição sumária, pois depende do aprofundado exame de provas. Logo, a quaestio deve ser objeto de apuração pelo Juízo monocrático, após a instrução criminal, assegurando-se a regular observância aos princípios da ampla defesa e contraditório. Registre-se, por oportuno, que a indigitada ação penal merece ser suspensa somente quanto aos réus que foram duplamente denunciados, devendo prosseguir em relação aos demais. Por fim, com apoio no art. 580 do CPP, os efeitos da presente decisão devem ser estendidos ao acusado Manoel Gumercino da Silva, que se encontra em idêntica situação jurídico-processual. Ante o exposto, defiro a liminar para suspender a ação penal nº 2005.71.00.037065-6, inclusive a realização da audiência designada para o dia 25/07/2007, no que pertine aos denunciados Marcos Antônio Ocker e Manoel Gumercino da Silva. Comunique-se com urgência, solicitando informações ao Juízo impetrado, a serem prestadas no prazo de cinco dias. Após, abra-se vista dos autos ao Ministério Público Federal. Intimem-se. Publique-se. Porto Alegre, 23 de julho de 2007.

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