Execução provisória. Recurso extraordinário. Efeito devolutivo. Paciente em prisão domiciliar em razão de preventiva. Princípio da presunção de inocência. Trânsito em julgado.
Rel. Des. Élcio Pinheiro De Castro
Cuida-se de habeas corpus, com pretensão liminar, ajuizado por Cezar Roberto Bitencourt e outros em favor de Roberto Bertholdo, objetivando, em síntese, o trancamento do processo de Execução Penal Provisória nº 2006.70.00.030606-3, que tramita junto à 1ª Vara Federal de Curitiba/PR. Segundo se depreende da leitura do feito, nos autos da ação penal nº 2005.70.00.029545-0 o paciente foi denunciado pela prática do crime de interceptação telefônica previsto no artigo 10 da Lei 9.296/96, porque, segundo a denúncia, “entre dezembro de 2003 e maio de 2004, interceptou de forma clandestina comunicações de telefones instalados na casa e no gabinete do Juiz Federal Sérgio Moro, com a finalidade de obter informações privilegiadas acerca de processos em trâmite perante esse Juízo“. Na sentença, proferida em 31 de março de 2006, ROBERTO foi condenado a 5 (cinco) anos e 3 (três) meses de reclusão, no regime semi-aberto com apoio no art. 33, § 2º, alínea 'b', do CP, além de 480 (quatrocentos e oitenta) dias-multa, no valor de 5 (cinco) salários mínimos. Ainda na sentença, o julgador estabeleceu a necessidade da permanência do réu na prisão, bem como ordenou a transferência para outro estabelecimento carcerário. No julgamento da ACR nº 2005.70.00.029545-0, em 25/10/2006, a 8ª Turma desta Corte decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento aos apelos, reduzindo as reprimendas aplicadas para 02 (dois) anos e 08 (oito) meses de reclusão, no regime prisional aberto, bem como 126 dias-multa, mantido o valor unitário. A Turma também indeferiu a substituição da pena privativa de liberdade por sanções restritivas de direitos, entendendo ausentes os requisitos legais (fls. 33/71). Tendo em vista os termos do Acórdão, em 23 de novembro de 2006, o MM. Juiz Substituto da 2ª Vara Federal Criminal de Curitiba, proferiu decisão nas seguintes letras (fls. 30/2): “Consoante acórdão anexo, o eg. TRF da 4ª Região condenou ROBERTO BERTHOLDO ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 02 anos e 08 meses, além de cominar multa equivalente a 126 unidades diárias, no importe de 05 salários mínimos cada. Considerando a Resolução nº 19, de 29 de agosto de 2006, do Conselho Nacional de Justiça, promova-se a elaboração dos autos de execução provisória da pena. Anoto, por oportuno, que guardo algumas reservas quanto à execução provisória, levando em conta o disposto no art. 5º, LVII, da CF. Contudo, julgo cabível a prisão provisória, quando presentes os requisitos de cautelaridade, nos termos de recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (HC 67.608/SP, Rel. Min. Paulo Galotti, publicado no DJU em 10/10/2006). (...) A tanto acorre, ademais, a constatação de que a falta de efeito suspensivo - reconhecida aos recursos extraordinários - decorre de opção infraconstitucional, não podendo infirmar a opção expressa do referido art. 5º, LVII, da Constituição, concessa venia ao majoritário entendimento em sentido oposto. De qualquer sorte, sem prejuízo de angariar maior reflexão sobre tema tão polêmico, vê-se que, no presente caso, o réu já se encontra preso, por força das medidas cautelares decretadas em outros processos (p. ex. autos nº 2005.70.00.34324-9) lhe sendo, aparentemente, inclusive mais benéfica a imediata expedição do Processo de Execução Provisória (PEP). Cumpre, por outro lado, que oportunamente sejam sopesados os efeitos da decisão do e. TRF/4ª, sobre a situação processual do executado, ao que novamente calha a lucidez do seguinte precedente do e. STJ: (...) - HC nº 30.590, Relator Min. Hamilton Carvalhido, DJU de 14/02/2005. Para tanto, por óbvio, não se poderá olvidar a eventual submissão do acusado a cautelares privativas de liberdade em outros feitos, que não aqueles atingidos pelo acórdão em tela. Considerando, destarte, a mencionada Resolução nº 19/2006, do CNJ: 1) certifique a Secretaria em quais autos consta decretada cautelar privativa de liberdade em desfavor de ROBERTO BERTHOLDO; 2) Promova-se a autuação do caderno de execução provisória da pena do acusado, acompanhada da presente decisão; 3) autuado, remetam-se à Contadoria, para cômputo do valor efetivo da sanção pecuniária; 4) Apresentado o cálculo, remetam-se os autos à 1ª Vara Federal Criminal desta Subseção de Curitiba. Intimem-se as partes a respeito da expedição da guia de execução provisória.“ Sobreveio a notícia do deferimento de liminar em writ impetrado na Suprema Corte (HC nº 90.108-5/PR, Relator Ministro Ricardo Lewandowski) determinando a permanência do paciente em prisão domiciliar (fls. 73/5). Nos autos do procedimento de execução penal provisória, foi realizada audiência admonitória, em 29/01/2007, na qual foi concedida a detração de 01 ano, 02 meses e 20 dias de pena já cumprida. Em junho do corrente ano, a defesa do réu apresentou pedido de livramento condicional (fl. 306) tendo o Ministério Público solicitado a melhor instrução do feito, com a realização de diligências (fl. 309). Diante dessa ordem de acontecimentos, foi ajuizado o presente mandamus. Nas razões, sustentam os Impetrantes a inconstitucionalidade da execução provisória, pois, em face do princípio da presunção de inocência expresso na Magna Carta, a sentença penal condenatória só pode ser executada após o trânsito em julgado, conforme precedentes dos Tribunais Superiores. Por outro lado, aduzem que, recentemente, a 8ª Turma desta Corte revogou a custódia preventiva imposta nos autos da Ação Penal nº 2005.70.00.029546-2, em que Roberto Bertholdo foi condenado pela prática do crime de exploração de prestígio inscrito no art. 357, § único, do CP (ACR nº 2005.70.00.029546-2, julg. em 16/05/2007, Relator para o Acórdão Des. Luiz Fernando Wowk Penteado). Alegam, por isso, “que apesar de inexistir, tanto prisão cautelar pendente, como trânsito em julgado da condenação, o Paciente está cumprindo provisoriamente a pena imposta, o que se afigura ilegal“. Afirmam que, no caso, a execução antecipada da reprimenda implica em constrangimento indevido à liberdade do Paciente, porquanto está obrigado a recolher-se ao seu domicílio no período das 20:00 às 06:00 horas nos dias úteis, bem como nos sábados, domingos e feriados, estando proibido de ausentar-se de Curitiba, o que vem prejudicando sobremaneira suas atividades profissionais, no exercício da advocacia. Frente a esse quadro, postulam a concessão liminar da ordem, bem como sua confirmação pelo Colegiado, para obstar a execução penal provisória. Na hipótese sub judice, verifica-se ter o Paciente permanecido segregado preventivamente durante todo o processo, não só em face da prisão determinada nos próprios autos da ACR nº 2005.70.00.029545-0 (relacionado à interceptação telefônica clandestina) a qual foi mantida pela 8ª Turma no julgamento de habeas corpus anterior, mas também por força da custódia cautelar decretada no processo nº 2005.70.00.034324-9 (objeto de exame pela 7ª Turma, HC nº 2005.04.01.058140-4, Relator Des. Tadaaqui Hirose, ordem denegada, julg. em 07.02.2006) além daquela decorrente da decisão proferida nos autos da Ação Penal nº 2005.70.00.029546-2, recentemente revogada por esta Corte. Portanto, a manutenção do encarceramento após a sentença decorre de previsão expressa do Diploma Processual Penal, verbis: Art. 393. São efeitos da sentença condenatória recorrível: I - Ser o réu preso ou conservado na prisão, assim nas infrações inafiançáveis, como nas afiançáveis enquanto não prestar fiança; II - Ser o nome do réu lançado no rol dos culpados. In casu, por força da presença dos requisitos da preventiva (art. 312, CPP) ROBERTO detém a condição de “preso provisório“. Na lição de Júlio Fabbrini Mirabete, “são presos provisórios, nos termos do Código de Processo Penal: a) o autuado em flagrante delito (arts. 301 a 310); b) o preso preventivamente (arts. 311 a 316); c) o pronunciado para julgamento perante o Tribunal do Júri (art. 408, § 1º) e d) o condenado por sentença recorrível (art. 393, I). A finalidade da prisão provisória é apenas a custódia daquele a quem se imputa a prática do crime, a fim de que fique à disposição da autoridade judicial durante o inquérito ou ação penal e não para o cumprimento da pena, que não foi imposta ou não é definitiva.“ (Execução Penal, p. 270). Em verdade, não se há de confundir a prisão provisória, que é medida processual, de natureza cautelar, com a execução provisória do decreto condenatório, que depende, a toda evidência, de ser o decisum confirmado na segunda instância, por ocasião do exame do apelo. Na espécie, conforme se depreende do decisum monocrático, o início da execução provisória da pena foi determinado somente após o julgamento de segundo grau proferido por esta Corte, por mostrar-se mais favorável ao agente, tendo em conta o disposto na Resolução nº 19, do Conselho Nacional de Justiça, que assim estabelece no seu artigo primeiro: “A guia de recolhimento provisório será expedida quando da prolação da sentença ou acórdão condenatórios, ainda sujeitos a recursos sem efeito suspensivo, devendo ser prontamente remetida ao Juízo da Execução Criminal.“ Com efeito, na expressa dicção da norma regulamentar acima transcrita, a guia de recolhimento provisório deve ser expedida na pendência de condenação sujeita a recursos que não possuem efeito suspensivo (v.g. dirigidos aos Tribunais Superiores) quando revelar-se mais benéfica ao réu, vale dizer, se a medida for indispensável para a obtenção de benefícios legais, tais como a progressão de regime, liberdade condicional, etc. (V. Mirabete, op. cit., p. 279). Na mesma linha, o seguinte julgado do e. STJ: PROCESSUAL PENAL. EXECUÇÃO. HABEAS CORPUS. GUIA DE RECOLHIMENTO. EXPEDIÇÃO. TRÂNSITO EM JULGADO APENAS PARA A ACUSAÇÃO. POSSIBILIDADE. COMPETÊNCIA. TRIBUNAL DE 2º GRAU. É possível a execução provisória da pena quando a sentença transitou em julgado para a acusação, cabendo a expedição da guia de recolhimento, nessa hipótese, ao Tribunal competente para apreciar o recurso interposto pela defesa. Precedentes. (HC nº 30.783/MG, Relator Ministro FELIX FISCHER, 5ª Turma, julg. em 16/12/2003, public. no DJU em 09.02.2004). Nesse contexto, não se vislumbra manifesta ilegalidade na decisão monocrática que determinou a execução provisória do acórdão condenatório, inclusive beneficiando o Paciente com a detração do tempo de pena cumprida, considerando-se ademais que a manutenção do encarceramento provisório, no regime de prisão domiciliar, ocorre em face das citadas preventivas, ou até mesmo de outras decisões cautelares das quais não se tem conhecimento. Tendo em conta o afastamento da custódia cautelar na Ação Penal nº 2005.70.00.029546-2, pretende a defesa seja suspensa a execução provisória da reprimenda aplicada nos autos da ACR nº 2005.70.00.029545-0, que deu origem ao Procedimento (PEP) nº 2006.70.00.030606-3, ora impugnado. Contudo, não há notícia no presente caderno processual a respeito da manutenção (ou eventual revogação) do decreto prisional imposto nesta ação penal, o que inviabiliza a concessão da tutela de urgência requerida, até que sejam prestados esclarecimentos pela ínclita autoridade apontada como coatora. Com essas considerações, indefiro a liminar. Solicitem-se informações ao Juízo da 1ª Vara Federal Criminal de Curitiba, a respeito do andamento atual do referido processo de execução penal provisória, bem como ao Juízo Substituto da 2ª Vara Federal Criminal de Curitiba quanto à existência de prisão preventiva em relação ao Paciente ROBERTO BERTHOLDO, a serem prestadas no prazo de 5 (cinco) dias. Intimem-se. Publique-se. Após, abra-se vista dos autos à Procuradoria Regional da República. Porto Alegre, 20 de julho de 2007.
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