Habeas Corpus Nº 2007.04.00.028827-0/sc

Termo circunstanciado. Delito de desobediência por não atendida requisição feita pelo Ministério Público quanto aos dados cadastrais de usuário de serviço de telefonia fixa. Ilegalidade. Necessidade de autorização judicial.

Rel. Des. Luiz Fernando Wowk Penteado


Cuida-se de habeas corpus, com pedido de provimento liminar, objetivando o trancamento do termo circunstanciado nº 2006.72.00.009874-4, instaurado em desfavor de Luiz Antônio da Costa Silva pela suposta prática do delito de desobediência (artigo 330 do Código Penal). Consta da inicial que requisitados pelo Ministério Público Federal dados cadastrais de determinado usuário de serviço de telefonia fixa comutada à empresa Brasil Telecom S.A., esta negou a informação ao argumento de que “os dados são sigilosos, dependendo, portanto, de ordem judicial expressa, para serem divulgado“. Renovado o pedido, novamente restou indeferido. Em decorrência, tendo sido recusada proposta de transação penal, instaurou-se termo circunstanciado. Impetrado habeas corpus em favor do paciente perante a 1ª Turma Recursal do Estado de Santa Catarina, foi denegada a ordem, o que motivou a presente impetração. A impetrante sustenta que somente por ordem judicial a empresa de telefonia pode fornecer os dados cadastrais de usuário que tenha solicitado sigilo em relação aos mesmos, pois “Uma vez proibida a publicação dos dados cadastrais por parte do detentor, tais informações tornam-se completamente abrangidas pela esfera de intimidade prevista no inciso X, do artigo 5º, da CF“. Afirma a inaplicabilidade da regra contida no artigo 8º, § 2º, da Lei Complementar nº 75/1993, “pelo fato de que não há como se afirmar em inoponibilidade de exceção de sigilo no que se refere à Brasil Telecom“, nem mesmo do inciso IV daquele mesmo artigo, pois o alcance a ser-lhe atribuído deve respeitar as limitações constitucionais. Alega, ainda, a atipicidade da conduta do paciente e a ocorrência de erro de proibição. Inicialmente evidencia-se a competência desta Corte para conhecer da presente impetração. Nesse sentido os precedentes do egrégio Supremo Tribunal Federal: EMENTA: Habeas corpus: incompetência do Supremo Tribunal para conhecer originariamente de habeas corpus no qual se imputa coação a Juiz de primeiro grau e a Promotor de Justiça que oficia perante Juizado Especial Criminal (CF, art. 102, I, i). II. Habeas corpus: conforme o entendimento firmado a partir do julgamento do HC 86.834 (Pl, 23.6.06, Marco Aurélio, Inf., 437), que implicou o cancelamento da Súmula 690, compete ao Tribunal de Justiça julgar habeas corpus contra ato de Turma Recursal dos Juizados Especiais do Estado. (Ag. Reg. no HC nº 90.905/SP, 1ª Turma, rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJU, ed. 11-05-2007) COMPETÊNCIA - HABEAS CORPUS - DEFINIÇÃO. A competência para o julgamento do habeas corpus é definida pelos envolvidos - paciente e impetrante. COMPETÊNCIA - HABEAS CORPUS - ATO DE TURMA RECURSAL. Estando os integrantes das turmas recursais dos juizados especiais submetidos, nos crimes comuns e nos de responsabilidade, à jurisdição do tribunal de justiça ou do tribunal regional federal, incumbe a cada qual, conforme o caso, julgar os habeas impetrados contra ato que tenham praticado. COMPETÊNCIA - HABEAS CORPUS - LIMINAR. Uma vez ocorrida a declinação da competência, cumpre preservar o quadro decisório decorrente do deferimento de medida acauteladora, ficando a manutenção, ou não, a critério do órgão competente. (HC nº 86.834/SP, Pleno, rel. Min. Marco Aurélio, DJU, ed. 09-03-2007) Quanto ao mérito, a questão já foi abordada por este Regional consoante decisão proferida pelo seu eminente Vice-Presidente, Desembargador Federal João Surreaux Chagas, em 06 de julho do ano em curso: Brasil Telecom S/A e outro propõem Medida Cautelar contra o Ministério Público Federal, pedindo a atribuição de efeito suspensivo a recursos especial e extraordinário interpostos contra acórdão proferido pela 4ª Turma do Tribunal que, em sede de agravo de instrumento, confirma antecipação de tutela deferida nos autos de ação civil pública proposta para o fim de obrigar os réus a fornecer ao MPF os dados cadastrais dos usuários de telefones celulares e fixos. O autores alegam estarem presentes os requisitos do fumus boni juris e do periculum in mora necessários à concessão da medida, pugnando pela concessão de liminar. A competência para o exame do pedido de medida cautelar é deste Tribunal, consoante dispõe a Súmula 635 do STF: Cabe ao Presidente do Tribunal de origem decidir o pedido de medida cautelar em recurso extraordinário ainda pendente do seu juízo de admissibilidade. Outrossim, o pedido de efeito suspensivo a recurso especial ou extraordinário não possui natureza jurídica de ação cautelar autônoma, tratando-se em verdade de incidente que se exaure com o acolhimento ou rejeição do pedido, sendo desnecessária a oitiva da parte contrária (STJ, Agravo Regimental na Medida cautelar 11.282, 3ª Turma, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJU de 05.06.2006) A atribuição de efeito suspensivo a recurso especial e/ou extraordinário constitui medida excepcional, visto que, em regra, tais recursos são recebidos apenas no efeito devolutivo (CPC, art. 542, § 2º). A configuração do fumus boni juris no caso de medida cautelar requerida para o fim de atribuir efeito suspensivo a recurso especial ou extraordinário depende da probabilidade de seu acolhimento nos Tribunais Superiores. Portanto, devem de um lado estarem satisfeitos os requisitos formais para a admissão do recurso, e de outro haver plausibilidade inequívoca na pretensão recursal. No caso do recurso extraordinário, por se tratar o acórdão recorrido de decisão apreciando antecipação da tutela, sua admissibilidade, à primeira vista, encontra óbice na Súmula 735 do Supremo Tribunal Federal: Não cabe recurso extraordinário contra acórdão que defere medida liminar . Tendo o STF se manifestado no sentido de que a Súmula se aplica aos casos de antecipação da tutela, visto que não há pronunciamento definitivo do Tribunal sobre o mérito (cabendo apreciação definitiva quando de eventual interposição de apelação), as chances de sucesso do recurso que se podem vislumbrar nesse momento processual são remotas. Portanto, no que tange ao recurso extraordinário, a medida é de ser indeferida. Quanto ao recurso especial, os requisitos formais estão, em primeira análise, atendidos. O Colendo STJ, apreciando situação análoga, já se pronunciou no sentido sustentado pelas autoras, ou seja, de que é necessária autorização judicial para que os dados sejam franqueados, nos autos do RHC 8.493/SP, Rel Min. Vicente Cernicchiaro, 6ª Turma, DJU de 02.08.1999, em julgado assim ementado: RHC. CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL PENAL INFORMAÇÕES CADASTRAIS. SIGILO Quando uma pessoa celebra contrato especificamente com uma empresa e fornece dados cadastrais, a idade, o salário, o endereço, é evidente que o faz a fim de atender às exigências do contratante. Contrata-se voluntariamente. Ninguém é compelido, é obrigado a ter aparelho telefônico tradicional ou celular. Entretanto, aquelas informações são reservadas e aquilo que parece ou aparentemente é algo meramente formal pode ter conseqüências seríssimas. Digamos uma pessoa, um homem, resolva presentear uma moça com linha que esteja em seu nome. Não deseja, principalmente se for casado, que isso venha a público. Daí, é o próprio sistema de telefonia tradicional, quando a pessoa celebra contrato, estabelece, como regra, que o seu nome, seu endereço, e o número constarão no catálogo; entretanto, se disser que não o deseja, a companhia não pode, de modo algum, fornecer tais dados. Da mesma maneira, temos o cadastro nos bancos, entretanto, de uso confidencial para a aquela instituição, e não para ser levada conhecimento de terceiros. Isso posto, julgo configurado o fumus boni juris. O periculum in mora, por sua vez, outro requisito necessário à concessão da medida cautelar, decorre da irreversibilidade da antecipação da tutela concedida no acórdão recorrido, que exaurirá seus efeitos no momento em que os dados cadastrais forem disponibilizados ao MPF. Em face do exposto, satisfeitos os requisitos legais, defiro em parte a medida cautelar requerida, atribuindo efeito suspensivo ao recurso especial interposto por Brasil Telecom S/A e Brasil Telecom Celular S/A nos autos do AI nº 2006.04.00.034026-3. Verifica-se, portanto, a plausibilidade da matéria sustentada na impetração. De outra parte, o periculum in mora decorre da audiência aprazada para o dia 11 de outubro do ano em curso. Presentes os requisitos, é de ser concedida a medida de urgência. Isso posto, defiro a liminar para suspender o curso do termo circunstanciado nº 2006.72.00.009874-4 até julgamento final do habeas corpus pela Turma. Comunique-se à autoridade impetrada, solicitando-lhe, na oportunidade, informações. Após, dê-se vista ao Ministério Público Federal. Publique-se. Intime-se.

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