Habeas Corpus Nº 2007.04.00.029811-1/rs

Trancamento de ação penal. Falsidade ideológica e uso de documento falso. Habeas corpus. Exame aprofundado do contexto fático-probatório. Impossibilidade.

Rel. Des. Luiz Fernando Wowk Penteado


Trata-se de habeas corpus, com pedido de provimento liminar, objetivando o trancamento da Ação Penal nº 2007.71.01.000019-6, proposta em desfavor de Karime Hauqui Tonin Dalla Roza e outro, pela suposta prática dos delitos dos artigos 299 e 304, ambos do Código Penal. Consta da denúncia que a paciente, juntamente com o outro sócio da empresa MIB - Com. Imp. Exp. e Transp. Ltda., em conjugação de esforços e comunhão de vontades com o sócio-administrador da empresa F. Menezes Indústria, Comércio, Importação e Exportação Ltda., declararam falsamente que aquela empresa era a importadora de discos de embreagem, quando na verdade era essa última. Também inseriram declaração falsa com o fim de alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante em documentos utilizados para promover o despacho aduaneiro relacionado com aquelas mercadorias. O impetrante sustenta que “a exordial acusatória é completamente infundada, inverídica e não possui qualquer sustentação fática ou adminículo de prova, para que possa ser imputado a Denunciada os delitos de falsidade ideológica e uso de documento falso“, havendo “manifesta ilegitimidade da parte para responder os termos da ação penal proposta, tratando-se, pois, de coação ilegal“. Acrescenta que “Se é certo que, nos delitos perpetrados por pluralidade de agentes, não é de se exigir que a denúncia descreva pormenorizadamente a conduta participativa de cada um, não é menos certo que não se pode admitir uma acusação que consagre mera responsabilidade objetiva em matéria penal, como fez a denúncia em questão, já que a paciente fora denunciada pelo simples fato de ser, à época dos fatos, 'sócia majoritária da mesma empresa, responsável pela administração da sociedade'“. Refere, ainda, que a paciente, não obstante a condição de sócia majoritária da citada empresa “havia outorgado procuração ao Sr. Darlan Dalla Roza, seu marido na época, para que este, na condição de administrador, gerisse a empresa, com total poderes relativos aos negócios e interesses, inclusive relativos a operações de importação e exportação“, além de “que na época dos fatos, a Sra. Karine já estava residindo em Balneário Camboriú, SC, não tendo qualquer participação na operação objeto do feito“. Para o trancamento de ação penal em curso, como objetivado no caso em tela, a parte interessada deve demonstrar, de pronto, a inexistência de indícios suficientes para caracterizar a autoria do delito, que a conduta não constitui crime ou ainda que se trata de hipótese de extinção da punibilidade. Caso contrário, somente no decorrer da instrução criminal é que a acusação poderá confirmar sua tese, com a produção das provas que entender necessárias e que a defesa, por sua vez, terá oportunidade de atacar a imputação proposta, demonstrando a inocência do denunciado ou a atipicidade da ação/omissão, não sendo, diante de matéria fática controversa, onde se faz necessária instrução criminal ou o exame aprofundado de provas, o habeas corpus a via apropriada para solução do litígio.Nesse sentido, confira-se a jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça: HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. CRIME DE FALSIDADE IDEOLÓGICA. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. IMPOSSIBILIDADE. DENÚNCIA FORMALMENTE CORRETA. 1. A denúncia ora atacada é formal e materialmente correta, ou seja, satisfaz as exigências do art. 41, do Código de Processo Penal. A conduta dos denunciados é típica, pois se encontra consubstanciada na prática do núcleo do tipo “fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante “. 2. A falta de justa causa para a ação penal somente pode ser reconhecida quando, em juízo de cognição sumária, sem a necessidade de exame valorativo do conjunto fático ou probatório, evidenciar-se a atipicidade do fato, a ausência de indícios e fundamentos da acusação ou, ainda, a extinção da punibilidade, hipóteses não verificadas no caso vertente. 3. Ordem denegada. (HC nº 40.467/MT, 5ª Turma, relª. Minª. Laurita Vaz, DJU, ed. 09-05-2005, p. 444) PENAL E PROCESSUAL PENAL. HOMICÍDIO CULPOSO. ALEGAÇÃO DE INÉPCIA DA DENÚNCIA E FALTA DE JUSTA CAUSA PARA A AÇÃO PENAL. TRANCAMENTO DE AÇÃO PENAL. EXAME APROFUNDADO DO CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. O trancamento de ação penal, pela via estreita do writ, somente é possível quando, pela mera exposição dos fatos narrados na denúncia, constata-se que há imputação de fato penalmente atípico, inexistência de qualquer elemento indiciário demonstrativo da autoria do delito ou extinta a punibilidade. Marcado por cognição sumária e rito célere, o habeas corpus não comporta o exame de questões que, para seu deslinde, demandem aprofundado exame do conjunto fático-probatório dos autos, posto que tal proceder é peculiar ao processo de conhecimento. ORDEM DENEGADA. (HC nº 35.369/GO, 6ª Turma, rel. Min. Paulo Medina, DJU, ed. 05-04-2005, p. 366) Ainda que o impetrante afirme que a administração da empresa estava a cargo do outro denunciado, em decorrência de procuração outorgada, e que a paciente, à época dos fatos, residia em Balneário Camboriú/SC, estando portanto afastada dos negócios, o enfrentamento da matéria importa revolver matéria fático-probatário, o que, como dito, não se coaduna com o rito célere do habeas corpus. Desde logo não se pode afastar eventual envolvimento da paciente com os fatos narrados na denúncia, pois, como sócia majoritária, não obstante alegar estar desvinculada da administração, remanescia com poderes inerentes àquela condição. Por isso, não há se falar, nesta oportunidade, em ilegitimidade passiva ou ausência de descrição da sua conduta, pois a inicial acusatória descreve o fato delituoso e suas circunstâncias, permitindo a ampla defesa dos réus. Ademais, a realização do interrogatório, que constitui oportunidade de defesa, permitirá que a acusada apresente a sua versão dos fatos ao juízo, demonstrando a alegada inocência. Isso posto, em exame perfunctório da matéria, como exigido para as medidas de urgência, não se evidenciando os requisitos, indefiro a liminar postulada. Solicitem-se informações a autoridade impetrada. Após, dê-se vista ao Ministério Público Federal. Publique-se. Intime-se.

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