Apelo em liberdade. Réu que permaneceu preso durante a instrução do processo. Excesso de prazo na remessa dos autos ao Tribunal. Razoabilidade tendo em conta o grande número de acusados. Execução provisória. Possibilidade independentemente do recurso interposto pela acusação.
Rel. Des. Élcio Pinheiro De Castro
- Cuida-se de habeas corpus, com pretensão liminar, impetrado por Emerson Guerra Carvalho, em favor de José Doniseth Balan. Segundo se depreende, o paciente foi condenado nos autos do processo referente à operação denominada 'Hidra' (2005.70.03.000284-9) estando o feito nesta Corte para exame dos recursos interpostos pelo Ministério Público e defesa. Sustenta o Impetrante, em síntese, que, em face do princípio da presunção de inocência, o paciente possui o direito de aguardar em liberdade o julgamento da apelação criminal, porquanto ausentes os requisitos da prisão preventiva, inexistindo, ainda, provas concretas de seu envolvimento no esquema criminoso. Aduz, também, excesso de prazo na detenção de José Doniseth, “que está encarcerado há mais de 27 meses“. Diante disso, requer a concessão liminar da ordem e sua posterior confirmação pela Turma para que seja expedido alvará de soltura. A irresignação do Impetrante não merece trânsito. No que pertine à manutenção da custódia cautelar, a matéria já foi objeto de análise pela Oitava Turma desta Corte, conforme se verifica da decisão proferida em 15.12.2006, nos autos da referida ação penal, verbis: (..) 2. Indefiro o pedido de revogação da prisão preventiva formulado às fls. 8395-8403, bem como de progressão de regime (fls. 8404-8425) porquanto tais questões já foram analisadas por ocasião do julgamento do habeas corpus nº 2006.04.00.020234-6/PR (public. no DJU de 16.08.2006) cuja ementa foi lavrada nas seguintes letras: 'PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. OITIVA DE TESTEMUNHAS NO JUÍZO DEPRECADO. INTIMAÇÃO. NULIDADE. INOCORRÊNCIA. APELO EM LIBERDADE. RÉUS PRESOS DURANTE A INSTRUÇÃO PROCESSUAL. EXCESSO DE PRAZO NA REMESSA DOS AUTOS AO TRIBUNAL PARA JULGAMENTO DO RECURSO. RAZOABILIDADE. PROGRESSÃO DE REGIME. 1. 'Intimada a defesa da expedição de carta precatória, torna-se desnecessária intimação da data da audiência no juízo deprecado.' (Súmula nº 273/STJ). 2. In casu, a tese de que a preventiva deve ser revogada, por não subsistirem motivos a ensejá-la, não passa de mera reiteração da matéria já tratada e decidida em diversos outros habeas corpus impetrados em favor dos pacientes, sendo mera reiteração de pedido. Ademais, consoante pacífico entendimento jurisprudencial, os réus que permaneceram presos durante a instrução processual não têm direito de apelar em liberdade da sentença condenatória. 3. Os prazos processuais penais devem ser considerados sob a perspectiva da razoabilidade, ao invés de adotar-se parâmetros rígidos e imutáveis. Portanto, poderá haver mitigação do limite de tempo para manutenção da custódia preventiva, frente às peculiaridades de cada caso concreto. 4. Na espécie, o tempo transcorrido entre a prolação da sentença e a remessa dos autos a esta Corte resta plenamente justificado, em face da complexidade do feito, envolvendo grande número de acusados, e a necessidade de realização de vários atos processuais (intimação da sentença, expedição de cartas precatórias, embargos de declaração, apresentação de razões recursais, etc.). 5. A matéria atinente à progressão de regime prisional é da competência do Juízo da Execução, ex vi do artigo 66, inc. III, 'b', da Lei nº 7.210/84, sendo inviável seu exame em sede de habeas corpus, mormente quando não restou comprovado, de plano, o preenchimento dos requisitos legais.“ De igual forma, a questão relativa ao alegado excesso de prazo foi objeto de recente decisão, lavrada na data de 22.08.2007, nos termos seguintes: 1. Às fls. 8404-8425, a defesa dos réus Kleber Lazari, Cícero Venâncio da Silva e Valdemir Antônio Zaine requer a execução provisória da sentença condenatória, alegando que já houve o cumprimento de tempo de pena suficiente a autorizar a progressão do regime prisional, mormente em face do trabalho desenvolvido no local da prisão, o que autoriza a remissão, na forma prevista no artigo 126, § 1º, da Lei nº 7.210/84. Aduz inexistir óbice ao deferimento do pedido ora veiculado, aplicando-se ao caso a Súmula nº 716 do STF, constituindo-se constrangimento ilegal a manutenção do condenado em regime prisional mais gravoso, por prazo superior ao previsto em lei. Ab initio, mister referir que a pretensão da defesa seria analisada no julgamento do presente apelo pela Turma. Todavia, em face das características do presente feito - tais como o grande número de réus (vinte e dois) e vários crimes (quadrilha, corrupção, descaminho, estelionato) - revela-se inevitável certa demora na apreciação de todos os recursos interpostos - inclusive pelo Ministério Público - comparativamente a processos de menor complexidade. Registre-se que o juiz criminal, no desempenho de seu ofício, deve ter tempo para formar sua persuasão, amparada em raciocínio lógico, cotejando os preceitos legais, doutrina e jurisprudência, com as provas coligidas no processo. Função dessa magnitude não pode ser automatizada, como linha de produção de uma fábrica, principalmente quando está em jogo a liberdade do cidadão. Por outro lado, também não se mostra razoável que os réus sejam prejudicados por eventual retardo no exame da apelação, principalmente quando se vislumbra a possibilidade, em tese, de progressão de regime prisional. Conforme decidiu a Suprema Corte no julgamento do HC nº 72162/MG (Rel. Min. Sepúlveda Pertence) “a prisão decorrente de decisão condenatória recorrível - quando admitida, conforme o entendimento majoritário no STF ( e não obstante a presunção constitucional de não culpabilidade) independentemente da demonstração de sua necessidade cautelar - constitui verdadeira execução provisória da pena que não se deve efetivar em regime mais severo que o da eventual condenação definitiva. Conseqüentemente, admite-se a progressão do regime de cumprimento da pena ou aplicação imediata do regime menos severo determinado na sentença.“ Sobre o tema em debate, veja-se recente julgado desta Turma: PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. RÉU QUE RESPONDEU AO PROCESSO PRESO. NEGATIVA DO DIREITO DE APELAR EM LIBERDADE. LEGITIMIDADE DA MEDIDA. O sentenciado que permaneceu segregado durante o trâmite da ação penal deve permanecer preso para apelar, se não verificada qualquer alteração na situação fática que levou à decretação de sua prisão preventiva. Assegurado o direito à execução provisória da sentença, não há qualquer ilegalidade a ser sanada no writ, já que assim estará garantido o direito de cumprir o condenado a pena no regime prisional imposto na sentença, podendo, inclusive, postular a progressão de regime. (HC nº 2007.04.00.011559-4/RS, Rel. Des. Paulo Afonso Brum Vaz, public. no D.E. em 10.05.2007). A par disso, consoante atual entendimento jurisprudencial, o fato de haver recurso por parte do Ministério Público não constitui óbice para a execução provisória da reprimenda. Nesse sentido, observem-se os seguintes precedentes do egrégio STJ: CRIMINAL. HC. EXECUÇÃO. LIVRAMENTO CONDICIONAL. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. PROGRESSÃO DE REGIME. PENDÊNCIA DE APELO ACUSATÓRIO. IRRELEVÂNCIA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL CONFIGURADO. ORDEM PARCIALMENTE CONHECIDA E, NESTA PARTE, CONCEDIDA. Pleito de concessão do benefício do livramento condicional aos pacientes. A matéria sequer foi suscitada perante o Tribunal a quo, não tendo sido objeto de debate e decisão em 2º grau de jurisdição. A análise do tema ocasionaria indevida supressão de instância. A pendência de julgamento do recurso de apelação interposto pelo Ministério Público não obsta a progressão de regime prisional. Entendimento recentemente consolidado no enunciado da Súmula nº 716 do Supremo Tribunal Federal. Deve ser cassado o acórdão recorrido, reconhecendo-se o direito dos pacientes de pleitear o benefício da progressão de regime perante a Vara de Execuções Penais. Ordem parcialmente conhecida e, nesta parte, concedida, nos termos do voto do Relator. (Quinta Turma, HC nº 39381/RJ, Rel. Min. Gilson Dipp, public. no DJU de 04.04.2005). PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. 171 (41 VEZES) NA FORMA DO ART. 71, E ART. 288, ART. 29, 69, 61, INCISO I, E ART. 62, TODOS DO CÓDIGO PENAL. PRISÃO PROVISÓRIA. RÉU QUE PERMANECEU CUSTODIADO AO LONGO DO PROCESSO. EXCESSO DE PRAZO NO JULGAMENTO DA APELAÇÃO. APELO DO MP. EXPEDIÇÃO DE RECOLHIMENTO PROVISÓRIO. I - O atraso no julgamento do recurso de apelação interposto pelo ora paciente, não se constitui, por ora, em constrangimento ilegal, tendo em vista o princípio da razoabilidade. II - A pendência de julgamento de recurso de apelação interposto pelo Ministério Público não obsta a formação do Processo de Execução Criminal provisória. Precedentes. III - “Admite-se a progressão de regime de cumprimento da pena ou a aplicação imediata de regime menos severo nela determinada, antes do trânsito em julgado da sentença condenatória“ (Súmula nº 716 do Pretório Excelso). Ordem parcialmente concedida. (Quinta Turma, HC nº 71.739/SC, Rel. Min. Felix Fischer, public. no DJU de 04.06.2007). Do voto-condutor desse último julgado, cabe transcrever os seguintes fundamentos: “Busca-se no presente habeas corpus substitutivo de recurso ordinário a soltura imediata do paciente e/ou a expedição da carta de recolhimento provisória. Inicialmente, os impetrantes alegam excesso de prazo no julgamento da apelação interposta em benefício do ora paciente. (...). Cumpre consignar que eventual retardamento no julgamento do recurso interposto não tem condão de afastar, de plano, ao menos na vertente hipótese, a necessidade da custódia. No caso, o atraso do julgamento do recurso de apelação interposto não dá ensejo, em atendimento ao postulado da razoabilidade, à automática concessão da ordem a fim de que o ora paciente aguarde o julgamento do recurso em liberdade. (...). Ademais, não se pode desprezar o fato de ter sido decretada sua prisão preventiva, permanecendo custodiado ao longo do processo. O segundo tópico apresentado diz respeito à possibilidade de formar o processo de execução criminal (PEC) provisório, com o objetivo de pleitear os benefícios da execução, enquanto pendente o julgamento de recurso de apelação interposto pelo Ministério Público. A possibilidade de execução provisória da sentença condenatória, pendente recurso da acusação, é tema dos mais controversos, mas que já foi objeto de seguidas manifestações desta Turma. Primordialmente, é imperioso reconhecer que o dano será muito maior ao status libertatis do paciente, caso a sentença não sofra reparo e aquele tenha de cumprir boa parte de sua pena em regime mais gravoso, que ao jus puniendi do Estado, se o decisum for reformado e o condenado já tiver passado parte de sua pena em regime mais favorável. (...). Confira-se, finalmente, manifestação do Pretório Excelso a respeito do tema, firmada no Enunciado da Súmula 716: 'Admite-se a progressão de regime de cumprimento da pena ou a aplicação imediata de regime menos severo nela determinada, antes do trânsito em julgado da sentença condenatória'. Ante o exposto, concedo parcialmente o habeas corpus para que seja expedida guia de recolhimento provisória, a fim de formar o processo de execução criminal (PEC provisório).“ Efetivamente, a pendência de recurso do órgão acusatório não pode evitar - quando mais favorável ao acusado - a imediata execução da reprimenda, pois, se a irresignação do Parquet não for acolhida, o réu ficará submetido à prisão (provisória) em sistema mais gravoso do que aquele determinado na sentença, o que, como visto, não se mostra razoável. Caso o apelo do Ministério Público seja provido, posteriormente o Juízo das Execuções poderá fazer os ajustes necessários. Na hipótese dos autos, considerando a data da prisão dos réus (a maioria foi em maio de 2005) e as penas aplicadas na sentença (média de 12 anos para o acusados presos) mostra-se possível, a priori, a progressão de regime prisional, cuja análise dos requisitos legais deve ser feita pelo Juízo das Execuções Penais, nos termos do 66, inc. III, 'b', da Lei nº 7.210/84. Ante o exposto, defiro o pedido de fls. 8404-8425, para determinar a execução provisória da sentença em relação aos acusados Kleber Lazari, Cícero Venâncio da Silva e Valdemir Antônio Zaine. Considerando que aos réus José Doniseth Balan, Jackson Esthesne, Roberto Balan, Luiz Carlos Balan, Renato Pertille, Éder Fabicheo, Kelvis Fernando Rodrigues e Milton Sposito Prado também não foi concedido o direito de apelar em liberdade, estendo-lhes a presente decisão, com apoio no artigo 580 do CPP. Comunique-se, com urgência, à Vara de origem, para a adoção das providências legais. Intimem-se. Publique-se.“ Nesse contexto, determinada a execução provisória da pena, resta manifestamente prejudicada qualquer análise a respeito da manutenção da custódia cautelar, mormente quando tal questão já foi reiteradamente objeto de exame por este Tribunal. Ante o exposto, com fundamento no artigo 162 c/c art. 37, § 1º, inc. II, ambos do Regimento Interno desta Corte, indefiro in limine o presente mandamus, por manifestamente incabível. Intimem-se. Publique-se. Após, arquivem-se os autos.