Evasão de divisas. Depósitos no exterior não declarados à repartição pública competente. Art. 22, parágrafo único da Lei 7492/86. Sonegação fiscal. Art. 1º, inciso I, da Lei 8137/90. Crédito tributário não constituído definitivamente. Pendência de recurso na esfera administrativa. Suspensão da ação penal tão-só quanto a este último por ausência de justa causa.
Rel. Des. Luiz Fernando Wowk Penteado
- Cuida-se de habeas corpus objetivando trancar a Ação Penal nº 2006.70.00.002146-9, proposta em desfavor de Cresus Coutinho Camargo pela prática, em tese, dos delitos dos artigos 22, parágrafo único, última parte, da Lei nº 7.492/86 e 1º, inciso I, da Lei nº 8.137/90 ou, sucessivamente, suspender o seu curso “enquanto não se decide definitivamente o procedimento administrativo-tributário, dado que o mesmo se constitui em prejudicial ao processo criminal quanto ao art. 22, parágrafo único, da Lei nº 7.492/86“. Consta da denúncia que “entre julho de 2001 a fevereiro de 2004, o denunciado CRESUS COUTINHO CAMARGO deliberadamente, manteve depósitos no exterior sem declaração à repartição pública competente, assim como, consciente da ilicitude de sua conduta, suprimiu o pagamento dos tributos referentes ao Imposto de Renda Pessoa Física, mediante a omissão de informações às autoridades fazendárias“. Narra, ainda, que “Procedido ao devido afastamento do sigilo da mencionada conta (fls. 05/07 e 67/69), obteve-se a documentação relativa às suas movimentações, a partir da qual, com auxílio da Receita Federal, pode-se identificar que o ora denunciado foi beneficiário de depósitos e ordenante de remessas de dólares, sem contudo, declarar a manutenção desses recursos no exterior à autoridade fazendária“. Indica-se, também, que o paciente teria recebido “13 (treze) depósitos em suas contas correntes totalizando um montante de US$ 3.460.844,00 (Três milhões, quatrocentos e sessenta mil, oitocentos e quarenta e quatro dólares)“. Os impetrantes sustentam que o paciente “nunca remeteu dinheiro para o exterior, assim como nunca abriu conta bancária fora do Brasil e sequer ordenou ou consentiu que em seu nome assim se fizesse“. Esclarecem que o acusado “mantinha por lazer o hábito de freqüentar hotéis-cassinos na América do Sul, onde participava de torneios de jogos e apostas, com regularidade quase que mensal, com maior freqüência no Conrad Punta Del Este Resort & Casino, Uruguai“, sendo que “em razão de sua solidez econômico-financeira era agraciado em alguns desses hotéis-cassinos com linhas de crédito, cujos valores oscilavam em até U$ 400.000,00“. Relativamente ao delito de sonegação fiscal, referem que “O crédito tributário não está definitivamente constituído, vez que pende de julgamento recurso interposto perante a Sétima Câmara do Primeiro Conselho de Contribuintes“. No que toca ao ilícito do artigo 22, parágrafo único, da Lei nº 7.492/86, alegam a inépcia da inicial, pois “não descreve o fato com as circunstâncias que interessam à ação penal“, sendo que “a imputação da manutenção de depósitos no exterior não declarados à repartição federal competente, baseada em supostos fatos - ganhos milionários em cassinos, não encontra nenhum suporte na investigação policial que deveria dar supedâneo à peça acusatória. Assim, a denúncia pelo artigo 22, parágrafo único, da Lei nº 7.492/86, embora descreva um fato típico, não encontra conforto no caderno investigatório, constituindo-se em evidente abuso do Ministério Público no poder de denunciar, sanável por habeas corpus, para que se tranque a ação penal por falta de justa causa“. Acrescentam, ainda, que, “Mesmo com os fatos distorcidos na denúncia, é de fácil inferência que a manutenção de depósitos não declarados à repartição federal competente se constituiu em exaurimento do crime tributário“. Referem que, caso assim não se entenda, “são indisfarçáveis os laços de conexão entre ambos tipos penais imputados“ ao acusado, sendo “inquestionável que a absolvição do impetrante no procedimento administrativo obstará a constituição do crédito tributário pelo reconhecimento da ausência do ganho tributável. E assim, não tendo havido ganho, não se configurará, por decorrência, o crime de manutenção de depósito no exterior sem declaração à repartição federal, que pressupõe a disponibilidade dos recursos em depósito“. Requerem liminarmente a suspensão da ação penal, tendo em vista a existência de interrogatório aprazado para o dia 17 do mês em curso. Nos apensos dos presentes autos (anexos VI e VII), verifica-se que o procedimento administrativo que embasou a denúncia não chegou ao termo final, tendo o paciente apresentado recurso voluntário do lançamento. Assim, não havendo constituição definitiva do crédito tributário, não há materialidade do delito do artigo 1º da Lei nº 8.137/90. Confiram-se os precedentes da Corte: PENAL. ARTIGO 337-A DO CP. SONEGAÇÃO DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. ANULAÇÃO AB INITIO DO PROCESSO. 1. Em se tratando de crime de sonegação fiscal, que exige efetiva supressão ou redução de tributo para a sua consumação (crime material), necessária a constituição definitiva do crédito tributário como condição de procedibilidade, da mesma forma que ocorre nos delitos previstos no artigo 1° da Lei 8.137/90. 2. Tendo sido a denúncia recebida em data anterior à constituição do crédito tributário, carece de justa causa a ação penal. (QUOACR 2004.71.05.000622-6/RS, 7ª Turma, rel. Des. Federal Tadaaqui Hirose, D.E., ed. 10-10-2007) PENAL E PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. REDUÇÃO DE TRIBUTO PRATICADA MEDIANTE FALSIDADE DOCUMENTAL. LEI Nº 8.137/90, ART. 1º. CONSTITUIÇÃO DEFINITIVA DO CRÉDITO. PRESSUPOSTO DA PERSECUÇÃO PENAL. FALSO. CRIME-MEIO DA ELISÃO TRIBUTÁRIA. 1. A jurisprudência da Corte consolidou-se no sentido de que “a constituição definitiva do crédito tributário é pressuposto da persecução penal concernente a crime contra a ordem tributária previsto no art. 1ª da Lei nº 8.137/90“ (TRF4R, Súmula nº 78), tendo a Colenda 4ª Seção, ao aprovar a redação do referido enunciado, consignado, expressamente, que a expressão persecução criminal deve ser interpretada em seu sentido mais amplo, de forma a abranger inclusive o inquérito policial. (...) (HC 2006.04.00.011243-6/PR, 8ª Turma, Des. Federal Paulo AfonsoBrum Vaz, DJU, ed. 17-05-2006, p. 1.015) No que diz respeito à inépcia da denúncia quanto ao delito descrito no artigo 22, parágrafo único, última parte, da Lei nº 7.492/86, ao superficial e provisório exame, realizado para fins de decisão de urgência, parece que a narrativa feita pelo órgão acusador atende aos pressupostos do artigo 41 do Código de Processo Penal, pois nela está contida uma acusação de evasão de divisas, na modalidade de manutenção de depósitos no exterior que não teriam sido declarados. Assim, ainda que remetendo para oportuna e atenta verificação a descrição na denúncia (ou nos documentos que a acompanham), dos fatos e respectivas circunstâncias, a aparência é de que, como formulada, possibilita que o acusado exerça a contento seu direito à ampla defesa. Importa destacar que a matéria ventilada no presente habeas corpus demonstra alguma complexidade, demandando exame mais detido, o que, nesta ocasião de juízo de cognição sumária não se mostra propício. Assim, não obstante os argumentos tecidos na impetração, de ser mantida, até o enfrentamento da matéria pelo colegiado, a imputação de infração ao artigo 22, parágrafo único, última parte, da Lei nº 7492/86, lembrando que o interrogatório agendado constitui também meio de defesa do acusado e oportunidade de esclarecer o juiz da causa sobre os fatos imputados na denúncia. Ante o exposto, defiro em parte a liminar apenas para suspender a ação penal no que se refere à suposta infração ao art. 1º, inciso I, da Lei 8137/90. Comunique-se à autoridade impetrada, solicitando-lhe, na oportunidade informações. Após, dê-se vista ao Ministério Público Federal. Publique-se. Intime-se. Porto Alegre, 12 de dezembro de 2007.
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