APELAÇÃO CRIMINAL N. 0000800-80.2012.4.01.3900/PA

RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL NÉVITON GUEDES -  

PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA AS TELECOMUNICAÇÕES. ART. 183 DA LEI 9.472/1997. OPERAR RÁDIO CLANDESTINA SEM A DEVIDA AUTORIZAÇÃO DA ANATEL. DELITO FORMAL E ABSTRATO. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.  1. Apelação interposta pelo réu contra sentença que julgou procedente a pretensão punitiva estatal para condená-lo nas penas do art. 183 da Lei 9.472/1997, em razão de desenvolver atividade clandestina de telecomunicação explorando serviço de rádio, à pena de 4 (quatro) anos de detenção e 120 (cento e vinte) dias-multa.  2. Consta dos autos que o réu desenvolvia atividade clandestina de telecomunicação explorando serviço de radiodifusão, no município de Cametá/PA, e, na data de 02/05/2011, os agentes fiscais procederam à interrupção das atividades e lavraram Autos de Apreensão e Infração.  3. Materialidade e autoria do delito comprovadas pelo Termo de Interrupção de Serviço e Termo de Apreensão lavrados no dia 02/05/2011, em razão da constatação de atividade de telecomunicação não autorizada, pelo Laudo Técnico nº 31/2011, bem como pelo interrogatório do acusado.  4. No laudo técnico ficou consignado que “a estação ao utilizar um canal de frequência destinado ao Serviço de Radiodifusão Sonora em Frequência Modulada (SRSFM) transforma-se em potencial fonte de radiointerferência”.  5. De início, não prospera a alegação de que se aplica ao caso concreto a tipificação constante no art. 70 da Lei 4.117/62, pois o referido dispositivo visa punir o agente que, de posse da devida outorga expedida pelo Poder Público, atua de forma contrária às regras de exploração do serviço de telecomunicações. Já o artigo da Lei 9.472/97 objetiva punir o agente que desenvolva, sem autorização, o serviço de telecomunicação, que é o caso dos autos.  6. A jurisprudência do STJ já assentou que a instalação de estação de radiodifusão clandestina é delito de natureza formal de perigo abstrato que, por si só, é suficiente para comprometer a segurança, a regularidade e a operabilidade do sistema de telecomunicações do país, não tendo aplicação o princípio da insignificância mesmo que se trate de serviço de baixa potência (AgRg no AREsp 1064266/SP, Rel. Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 27/06/2017, DJe 01/08/2017; AgRg no REsp 1566462/SC, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, julgado em 15/03/2016, DJe 28/03/2016).  7. Para a consumação do delito previsto no art. 183 da Lei 9.472/1997, basta que alguém desenvolva atividades de telecomunicações de forma irregular, ou clandestinamente, ainda que não se concretize, ou não se apure prejuízo concreto para as telecomunicações, para terceiros ou para a segurança em geral. É que o fim visado pela lei consiste em evitar o perigo de serem utilizadas as instalações irregulares ou clandestinas contra interesses nacionais, além dos inconvenientes decorrentes do uso de frequências, sistemas ou processos não autorizados.  7. A ausência de perigo concreto não é apta a descaracterizar a ocorrência do delito, em razão de o tipo penal descrever um potencial dano às telecomunicações. Assim, “basta à adequação típica da conduta de manter atividade clandestina de telecomunicação ao tipo do art. 183 da Lei 9.472/1997 o mero risco de comprometimento da regular operacionalidade de tão fundamental serviço, sendo indiferentes a baixa potência do equipamento e a ausência de prova de lesão concreta” (HC 245.551/ES, Rel. Min. Laurita Vaz, Quinta turma, DJe 24.06.2014).  8. No presente caso, conforme consta na denúncia, o acusado desenvolvia atividade de telecomunicação sem a autorização prévia do poder concedente, o que caracteriza o crime descrito no art. 183 da Lei 9.472/1997. 9. Dosimetria. Na análise das circunstâncias judiciais do art. 59 do CP, o juiz de origem fixou a pena-base em 04 (quatro) anos de detenção em razão de considerar a culpabilidade elevada, pois mesmo tendo obtido transação penal em 2006 pelo crime previsto no art. 70 da Lei 4.117/62, voltou a praticar a mesma conduta (crime contra as telecomunicações). Registrou que a personalidade é voltada para os crimes contra as telecomunicações e que as circunstâncias do crime demonstram “menoscabo à família, visto que abusou da boa-fé de parente a quem deveria resguardar, causando-lhe transtornos”, isso porque a prática se deu na casa de seu genitor. 10. Não incidindo circunstâncias atenuantes e agravantes, assim como qualquer causa de diminuição ou aumento de pena, a pena definitiva ficou em 04 (quatro) anos de detenção e 120 (cento e vinte) dias-multa, à razão de 1/30 (um trinta avos) do salário-mínimo vigente ao tempo do fato.  11. Preenchidos os requisitos do art. 44 do CP, o juiz de origem substituiu a pena privativa de liberdade por 02 (duas) restritivas de direitos, consistentes em doação de 03 (três) cestas básicas, cada uma no valor de um salário mínimo, para entidade a ser designada pelo juízo da execução, por duas vezes.  12. No caso, merece reforma a dosimetria. Na primeira fase, analisando as circunstâncias judiciais (CP, art. 59), entendo que a culpabilidade pode ser considerada intensa, uma vez que o réu, mesmo após ser processado e ter obtido transação penal em 2006 pelo crime previsto no art. 70 da Lei 4.117/62, persistiu na prática delitiva.  13. No tocante a personalidade, todavia, não basta para majorar a pena-base a afirmação de que é voltada para o crime, pois a personalidade é definida pela doutrina como a índole do agente, sua maneira de agir e de sentir, seu grau de senso moral. Assim, não havendo nos autos, elementos suficientes para o exame da personalidade não há como valorar essa circunstância. As circunstâncias do crime, por sua vez, devem ser relevantes e indicar uma maior censurabilidade à conduta praticada pelo condenado. Não atendem a essa finalidade a justificativa de demonstrar “menoscabo à família”.  14. Em razão de considerar apenas uma circunstância desfavorável a pena-base fica estabelecida em 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de detenção e 13 (treze) diasmulta. Ausentes atenuantes, agravantes, bem como causas de aumento e de diminuição da pena, torno definitiva a pena já fixada.  15. Preenchidos os requisitos do art. 44 do CP, a pena privativa de liberdade deve ser substituída por penas 02 (duas) restritivas de direitos, consistentes em (i) prestação de serviços à comunidade pelo tempo da execução da pena em entidade a ser designada pelo juízo da execução e (ii) doação de 03 (três) cestas básicas, cada uma no valor de um salário mínimo, para entidade a ser designada pelo juízo da execução.  16. Apelação parcialmente provida para reduzir sua pena para 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de detenção e 13 (treze) dias-multa.

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