APELAÇÃO CRIMINAL N. 0001308-14.2012.4.01.3807/MG

RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL NÉVITON GUEDES -  

PENAL. PROCESSO PENAL. CRIME DE RESPONSABILIDADE DE PREFEITO. ART. 1°, I, DO DECRETO LEI 201/1967. CRIME DO ART. 90 DA LEI 8.666/1993. PRELIMINARES DE NULIDADE DA SENTENÇA POR INOBSERVÂNCIA DO RITO ESPECIAL DO DECRETO LEGISLATIVO; INÉPCIA DA DENÚNCIA; CERCEAMENTO DE DEFESA; INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. INOCORRÊNCIA. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. RECONHECIMENTO DE ERRO DE PROIBIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. DOSIMETRIA ESCORREITA. SENTENÇA MANTIDA. APELAÇÕES DESPROVIDAS. 1. Apelações interpostas pelo Ministério Público Federal e pelos réus Elcio Silva Dias, José Silva Dias, Orlando Ferreira de Souza contra sentença que julgou procedente a pretensão punitiva estatal para condenar Elcio Silva Dias à pena de 05 (cinco) anos de reclusão pela prática do delito disposto no art. 1°, I, do Decreto Lei 201/1967; José Silva Dias à pena de 04 (quatro) anos e 10 (dez) meses de reclusão pela prática do delito disposto no art. 1°, I, do D ecreto Lei 201/1967; e Orlando Ferreira de Souza à pena de 02 (dois) anos e 06 (seis) meses de detenção e multa pela prática do delito disposto no art. 90 da Lei 8.666/1993. 2. Narra a denúncia que o município de Riacho dos Machados/MG, na gestão do acusado Élcio Silva, recebeu do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação — FNDE, a importância de R$50.894,00 (cinquenta mil, oitocentos e noventa e quatro reais), destinada ao custeio das ações do Programa Nacional de Alimentação Escolar — PNAE no ano de 2004. De acordo com a acusação, após a transferência dos recursos ao município, os acusados, em conluio, desviaram e se apropriaram da integralidade dos recursos federais do PNAE. 3. Segundo a inicial acusatória, Elcio Silva Dias e José Silva Dias foram responsáveis pelo saque dos valores, enquanto Orlando Ferreira de Souza e Sônia Ferreira de Souza teriam lançado suas assinaturas em documentos ideologicamente falsos com a finalidade de ocultar a prática delituosa. 4. Não há falar em nulidade por inobservância do rito previsto no Decreto Lei 201/1967 e no art. 514 do CPP, pois em se tratando de procedimento que visa à proteção do funcionário público, considerando o risco de ele ser alvo de perseguição, bem como a premência do interesse público, mostra-se despicienda a abertura de prazo para defesa prévia em relação ao particular denunciado em coautoria e ao agente que já não mais ostenta a qualidade de funcionário público quando da oferta da incoativa.  5. A alegação de inépcia da denúncia deve ser analisada de acordo com os requisitos exigidos pelos arts. 41 do CPP e 5º, LV, da CF/1988. No caso, a peça acusatória preenche os requisitos exigidos pelo art. 41 do CPP, porquanto descreve detalhadamente os elementos essenciais da conduta do réu. 6. Não se vislumbra a ocorrência do alegado cerceamento de defesa, pois o réu Élcio Silva foi devidamente certificado da audiência de instrução, tanto que pleiteou e obteve sua redesignação em decorrência de ato processual simultâneo na Justiça do Trabalho de Monte Azul e também não apontou prejuízo em sua intimação via diário oficial, e João da Silva não foi intimado pessoalmente por ter mudado de endereço sem comunicação ao juízo, bem como foi devidamente intimado via imprensa oficial. 7. Nos termos no art. 109, IV, da CF é competência da Justiça Federal processar e julgar “os crimes políticos e as infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas”. Na hipótese, procura-se apurar desvio de verba transferida do FNDE, na importância de R$50.894,00 (cinquenta mil, oitocentos e noventa e quatro reais), que era destinado ao custeio das ações do PNAE. 8. Materialidade e autoria. As provas coligidas nos autos são suficientes a comprovar a materialidade e a autoria dos delitos imputados aos réus Élcio Silva, José da Silva e Orlando Ferreira.  9. Acertado o entendimento do juízo a quo no sentido de que a conduta de Orlando Ferreira amolda-se ao tipo penal previsto no art. 90 da Lei 8.666/1993. Na hipótese, de fato, encontra-se devidamente configurado o aludido tipo penal, conforme exposto na sentença, tendo em vista que os réus simularam, por fraude documental, a existência de procedimentos licitatórios (o que fez inexistir qualquer competição), para apropriarem-se, indevidamente, de verba destinada à merenda escolar. 10. No caso, não se pode falar em exclusão da culpabilidade por erro de proibição, previsto no art. 21 do CP, uma vez que o desconhecimento da lei é inescusável e para que se isente o agente de pena o erro sobre a ilicitude do fato precisa ser inevitável, o que não ficou demonstrado na hipótese em exame. 11. Inviável o acolhimento da tese trazida na apelação do réu José Silva Dias quanto à prática das condutas a ele imputadas em razão de estrito cumprimento do dever, pois o servidor público tem o dever de cumprir as ordens emanadas de seus superiores, salvo quando manifestamente ilegais, como ocorre na espécie.  12. No que tange à dosimetria da pena, o Direito Penal brasileiro adota o critério trifásico, elaborado por Nélson Hungria, conforme se extrai do art. 68 do CP. Nesse sistema, há de se observar três etapas. Na primeira, calcula-se a pena base conforme as circunstâncias judiciais do art. 59 do CP. Na segunda, o magistrado aplica as atenuantes e agravantes que porventura venham a existir. Por fim, na terceira fase, levam-se em conta eventuais causas de aumento e diminuição da pena. 13. As dosimetrias das penas aplicadas aos réus também não merecem reparos. Isso porque, o magistrado a quo fixou a pena-base acima do mínimo legal, após análise dos requisitos do art. 59 do CP, por entender que as circunstâncias judiciais, eram em sua maioria, desfavoráveis aos condenados. 14. Inviável o pedido do MPF para a condenação dos réus à pena de multa, uma vez que o tipo penal do art. 1º, I, do Decreto-Lei 201/1967 não prevê a imposição da requerida penalidade. 15. Apelações desprovidas.

Para ler o documento na íntegra, clique aqui!

Comments are closed.