Processual penal. Penal. Inépcia da denúncia afastada. Desnecessidade de oitiva do parquet para a decretação da interceptação telefônica. Furtos qualificados pelo emprego de fraude, consumado e tentado. Saques fraudulentos de contas bancárias por meio da confecção de cartões clones. Inexistência de atos preparatórios. Formação de quadrilha ou bando. Organização criminosa. Autoria e materialidade comprovadas. Absorção do crime do art. 10 da lc nº 105/2001. Perdimento de bens. Incidência da continuidade delitiva. 1. A peça acusatória preenche todos os requisitos do art. 41 do CPP, não dificultando a produção de defesa pelos réus. A inépcia da denúncia deve ser atacada até a prolação da sentença, pois, após, não há mais interesse do réu, eis que os supostos vícios foram supridos (v. REsp 913911/RJ). Princípio da correlação entre a denúncia e a sentença observado. 2. O art. 42 da Lei n. 9.296/95 não exige prévia manifestação do Ministério Público para decretar a interceptação telefônica, e o art. 6º dessa norma dispõe que a interceptação telefônica prescinde de efetivo acompanhamento das diligências pelo Ministério Público. 3. Condutas praticadas que se adéquam ao conceito de furto mediante fraude, eis que não houve a entrega do bem pela vítima em virtude de ter sido ludibriada, mas verdadeira operação de fraudar o sistema de segurança dos bancos para subtrair valores das contas das vítimas, sem que estas tivessem qualquer participação. 4. A captação de dados bancários, como senha dos correntistas, e a confecção de cartões clones configuram o início do iter criminis do furto qualificado, ou seja, são fases de execução desse crime. Poder-se-ia se falar em atos preparatórios na formação da quadrilha, no aliciamento de funcionários das empresas de manutenção, na confecção de softwares e de equipamentos para obtenção de dados bancários, porquanto, a partir do momento em que todo esse maquinário é utilizado, tem início a fase de execução do crime. 5. Há subsunção do delito previsto no art. 10 da Lei Complementar n. 105/2001 pelo delito previsto no art. 155, §4º, do CP, quando o objetivo dos membros da quadrilha é o acesso a informações bancárias dos correntistas para proceder à subtração de valores depositados em contas bancárias. O acesso a informações bancárias dos correntistas constituiu meio, fase necessária e indispensável para a perpetração das subtrações. 6. Autoria e materialidade dos crimes comprovadas pelas provas documentais e testemunhais. 7. A Convenção das Nações Unidas contra o crime Organizado Transnacional, conhecida como Convenção de Palermo, incorporada ao ordenamento jurídico brasileiro pelo Decreto nº 5015/2004, conceitua grupo criminoso organizado como aquele praticado por três ou mais pessoas reunidas, com atuação concentrada (tal como ocorre na quadrilha), com o fim de obter benefício econômico ou material (prática de crime indicado na Convenção: lavagem do produto do crime, corrupção (ativa e passiva), obstrução à justiça (que pode configurar vários crimes no Brasil, como a ameaça, resistência, desobediência, falso testemunho e coação no curso do processo) e infrações graves (pena máxima não inferior a quatro anos). Também se exige a existência prévia do grupo, dispensando-se, porém, a existência da hierarquia e estruturação qualificada. Na ausência de um conceito legal de organização criminosa, a doutrina e a jurisprudência têm equiparado esta a grupo criminoso organizado. 8. Configuração do crime de organização criminosa quando o grupo apresenta: estrutura hierárquico-piramidal, disciplina e restrição a informações; repartição de tarefas e multiplicidade de membros; infiltração em áreas estratégicas, abrangência estadual e contínua expansão; uso de códigos para confundir ações de repressão; emprego de tecnologias avançadas e aprimoramento de técnicas criminosas; empregos de técnicas de contabilidade; e acúmulo de capital. 9. A delação (traição) premiada revela a incompetência do Estado na luta contra o crime, na ineficiência do sistema de persecução penal. Vale-se, então, da fraqueza de caráter de determinados indivíduos. A delação premiada é a institucionalização da traição. Porém, a não concessão desse benefício ao co-réu não detém interesse para nenhum dos demais réus, pois essa pretensão caberia ao Parquet, que é o órgão acusador e, em conseqüência, teria interesse na suspensão da benesse. 10. A culpabilidade, no rol de circunstâncias judiciais analisadas na primeira fase da dosimetria da pena, não é fundamento da pena, mas limite de sua aplicação, impedindo que seja imposta além da medida prevista pela própria idéia de culpabilidade. 11. Existiam elementos suficientes da prática de sucessivos crimes da mesma natureza, revelando uma profissão. Homogeneidade de condutas. Os crimes praticados pelos acusados tiveram início partindo de uma mesma situação. Todos os crimes praticados por eles são da mesma natureza, idênticos entre si (furto mediante fraude). Fazem os atos criminosos, enlaçados entre si, os subseqüentes ligados ao primeiro, fazendo parte de um mesmo projeto criminoso. 12. Para o deferimento da pena de perdimento de bens em nome de terceiros é necessária a prova da origem ilícita, ou seja, de que, além de adquiridos à época da prática dos crimes e com produtos deles, eles foram transferidos a terceiros com a finalidade de ocultar suas origens. Para tanto, mister se faz a prova, pela acusação, de que os terceiros não detinham capacidade financeira para aquisição desses bens.
Rel. Des. Tourinho Neto
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