APELACAO CRIMINAL 2005.50.01.012276-4

REL. DES. ANDRÉ FONTES -  

Apelações criminais dos réus e do ministério público federal. Art. 288 do cp e art. 325, §2º do cp. Prescrição da pretensão punitiva. Preliminares afastadas. Ausência de incompetência absoluta. Inocorrência de inépcia. Justa causa para a ação penal. Licitude das provas. Desnecessidade de propositura da suspensão condicional do processo. Da inexistência de afrontação ao princípio da correlação. Ausência de nulidade por violação ao disposto no art. 514 do cpp. Mérito. Confirmação das condenações. Nova dosimetria. Recursos do mpf e de maria josé parcialmente providos; recurso de marlene provido; recurso de gilberto, wladimir, miguel e christian desprovidos.  1 - Narrou a denúncia, que os réus associaram-se em quadrilha desde 1998 até a data em que foram presos (09 de novembro de 2005), “para o fim de cometer crimes contra ordem tributária, de corrupção ativa e passiva, de violação de sigilo funcional, de falsidade documental, de estelionato, de lavagem de dinheiro e de advocacia administrativa”. Com o fim de se eximir do pagamento de obrigações tributárias referentes às empresas (constituídas quase sempre em nome de “laranjas”), eram realizadas diversas falsificações de notas fiscais, dentre outros ilícitos. Consignou-se, ainda, na peça exordial que uma das rés, ex-servidora do Ministério Público Federal, à época lotada no Gabinete do Procurador da República responsável pelas investigações da quadrilha, e esposa de um dos réus, teria sido responsável pelo vazamento de informações sigilosas a respeito do implemento de medidas cautelares investigatórias em detrimento dos acusados, o que oportunizou a destruição de evidências.  2 – Prescrição da pretensão punitiva do crime do art. 288 do CP. Em sua apelação, o Ministério Público Federal requereu a reforma da pena das acusadas MARIA JOSÉ e MARLENE para que fossem aumentadas em 6 (seis) meses. Diante desse quadro, verifica-se que, ainda que se desse provimento à apelação criminal do MPF, haverá a ocorrência da prescrição da pretensão punitiva, eis que as penas não atingiriam o patamar de 2 (dois) anos e entre a data do recebimento da denúncia (13/12/2005) e a data da publicação da sentença condenatória (01/02/2011), passaram-se mais de 4 (quatro) anos, ensejando a aplicação do disposto no art. 109, V, do Código Penal. Extinção da punibilidade para as rés em relação a este delito, nos termos do art. 107, IV do Código Penal.  3 - Não há que se falar em incompetência absoluta do juízo da 1ª Vara Federal de Vitória/ES, uma vez que a competência da 2ª Vara Federal de Vitória para processar e julgar crimes praticados por organizações criminosas deve respeitar o disposto no art. 20 da Resolução nº 22, de 28 de setembro de 2010, deste Tribunal Regional Federal.  4 - A exordial acusatória atribuiu aos réus condutas específicas delimitadas. A inicial não mencionou de forma genérica a atuação para a concorrência do tipo penal, mas evidenciou, de forma clara, o envolvimento dos réus e a associação para a prática de crimes. Há, portanto, fatos imputados aos réus a partir dos quais foi possível que exercessem sua defesa. O nexo de causalidade entre as condutas supostamente praticadas e o cometimento do crime é evidente, de modo que a denúncia narrou, de forma satisfatória, os fatos imputados aos réus e os expôs com todas as suas circunstâncias, conforme determina o art. 41 do Código de Processo Penal.  5 - Em relação à alegada ausência de justa causa, apesar da ausência de notícias acerca da constituição definitiva dos créditos tributários dos delitos de sonegação e do disposto na súmula vinculante nº 24, é certo que a denúncia narra outras condutas delituosas, como o caso de falsidades ideológicas e documentais, bem como a violação de sigilo funcional. Além dos delitos contra a ordem tributária, a denúncia narrou a associação para fins de cometimentos de outros crimes, que ficaram comprovados durante a instrução processual.  6 - As partes alegam ilicitude de provas colhidas durante a fase de inquérito quando o feito tramitava na Justiça Estadual, uma vez que a interceptação telefônica teria sido autorizada por Juiz Estadual. Todavia, inicialmente, apurava-se a sonegação de impostos estaduais e, somente após o início das investigações, passou-se a vislumbrar-se também a prática de crimes cuja competência seria da Justiça Federal. Após a identificação da conexão dos crimes, houve remessa dos autos ao juízo competente, não havendo que se falar em vício na produção probatória.  7 – Não há qualquer nulidade do processo pela ausência de propositura da suspensão condicional do processo. Inicialmente, verifica-se que, antes da sentença condenatória, não houve qualquer manifestação do réu a respeito do não oferecimento do benefício. O princípio da ampla defesa não contempla o direito de arguir a qualquer tempo questões já preclusas. O rito processual está ordenado na lei, cabendo ao juiz conduzir o feito velando por seu regular andamento, e nenhuma das partes pode pretender introduzir temas superados no momento que lhes parece adequado.  8 - Apesar de que, pelo princípio acusatório, o juiz sentenciante esteja adstrito aos pedidos formulados pelo órgão de acusação, certo é que, em sede de alegações finais, o MPF expressamente requereu a condenação da ré pelo delito previsto no art. 325, § 2º, do CP. Foi oportunizada à ré, portanto, manifestar-se sobre essa situação em suas próprias alegações finais, estas apresentadas por defesa técnica. A peça acusatória individualizou os fatos e deixou evidente a violação de sigilo profissional pela acusada. A ré defendeu-se especificamente dos fatos, não havendo qualquer prejuízo.  9 – Inexistência de nulidade por inobservância do rito do art. 514 do Código de Processo Penal. Tendo em vista que a ação penal fora instruída por inquérito policial, não há necessidade da notificação do acusado funcionário público para responder em 15 dias. Súmula 330 do STJ. Ademais, foi imputada à ré a prática de crime comum e não só aquele de responsabilidade do funcionário público, o que também retira a obrigatoriedade do procedimento.  10 – No que tange ao mérito da ação penal, a autoria e materialidade delitiva foram devidamente atestadas, em especial pelos diálogos obtidos a partir das interceptações telefônicas e pelas provas cotejadas na denominada “Operação Profilaxia”.  11 – As ações penais nas quais não tenha havido condenação definitiva transitada em julgado (ou mesmo inquéritos policiais e mandados de prisão em aberto) não autorizam o aumento da pena base, seja para fins de configuração de maus antecedentes ou mesmo para fins de valoração negativa da personalidade e da conduta social, sob pena de violação ao princípio da presunção de inocência insculpido no art. 5º, LVII, da CF. Súmula 444 do STJ.  12 – O fato dos réus pertencerem a famílias abastadas e terem amplas oportunidades de vida, não torna a sua culpa mais acentuada. O dever de agir de acordo com a lei e não praticar crimes diz respeito a todos os indivíduos e não é condição particular daquele que possui condição financeira favorável. Entendo que acolher tal consideração significaria, a contrario sensu, valorar com menor grau o ato praticado por pessoa que se encontre em situação menos favorecida, o que se revela descabido, eis que integra o senso comum a noção de que constitui crime a associação em grupo para a prática de outros delitos.  13 - Apesar de não haver constituição definitiva do crédito tributário, nos presentes autos foram comprovadas diversas falsidades ideológicas praticadas e também a violação de sigilo profissional. Considerando que, de fato, vários crimes almejados se concretizaram e foram devidamente comprovados durante a instrução processual, a conduta deverá sofrer maior reprimenda, eis que o grupo obteve sucesso em sua organização.  14 - A utilização de familiares e pessoas do convívio familiar como “laranjas” para a constituição de empresas de fachada e dificultar a fiscalização devem ser valorada com maior reprovação, eis que houve o envolvimento de terceiros na ação criminosa. Além disso, é possível verificar, a partir das transcrições das gravações telefônicas, que os réus destruíram evidências e mobilizaram-se prontamente a fim de evitar a configuração da quadrilha.  15 - Considerando as movimentações financeiras relatadas durante a instrução processual e a capacidade econômica dos réus, entendo que o valor de 1 (um) salário mínimo mensal é insuficiente para a reprimenda do delito. A quantia de 4 (quatro) salários mínimos por mês é razoável e se coaduna com as informações colhidas. Durante todo o processo, averiguou-se que as empresas administradas pelos réus movimentavam vultosas quantias.  16 – Recursos do MPF e de MARIA JOSÉ parcialmente providos; recurso de MARLENE provido; recurso de GILBERTO, WLADIMIR, MIGUEL e CHRISTIAN desprovidos.

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