Habeas Corpus – 0008567-95.2018.4.02.0000

Magistrada: SIMONE SCHREIBER -  

HABEAS CORPUS. PENAL E PROCESSO PENAL. OPERAÇÃO ARCANUS. DECISÃO QUE EXAMINOU FUNDAMENTADAMENTE AS RESPOSTAS À ACUSAÇÃO. DENÚNCIA QUE ATENDE AOS REQUISITOS DO ART. 41 DO CPP E ENCONTRA AMPARO EM FARTO SUBSTRATO INDICIÁRIO, QUE INCLUI INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA, BUSCA E APREENSÃO E ATÉ MESMO INFILTRAÇÃO DE AGENTE. VALIDADE DAS MEDIDAS CAUTELARES DE INFILTRAÇÃO DE AGENTE, CAPTAÇÃO AMBIENTAL E AÇÃO CONTROLADA. DESNECESSIDADE DE IDENTIFICAÇÃO DA FONTE HUMANA. VALIDADE DA APREENSÃO DE E-MAILS NA EMPRESA CAMORIM. VALIDADE DA INCLUSÃO DO RAMAL TELEFÔNICO DE PACIENTE NA INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA. VALIDADE DO AFASTAMENTO DO SIGILO DAS CONVERSAS REALIZADAS VIA NEXTEL. ILEGALIDADE DA CONDUÇÃO COERCITIVA E NULIDADE DOS INTERROGATÓRIOS DELA DECORRENTES, MANTIDA HÍGIDA A AÇÃO PENAL DE ORIGEM NOS DEMAIS PONTOS, INCLUINDO AS MEDIDAS CAUTELARES. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA. I -  Estão em julgamento 5 habeas corpus impetrados em favor de acusados na chamada Operação Arcanus, que identificou a atuação de uma suposta organização criminosa composta por servidores da Anvisa no Porto do Rio de Janeiro e que teria como foco principal a emissão fraudulenta de certificados de inspeção sanitária para embarcações, como o Certificado de Isenção de Controle Sanitário de Bordo (CICSB) e o Certificado de Controle Sanitário de Bordo (CCSB), sem a realização de vistoria. II -  Encerradas as investigações, o Ministério Público Federal ofereceu denúncia contra dois grandes núcleos de acusados: o primeiro, formado por servidores da Anvisa, responsáveis pela emissão dos aludidos certificados; o segundo, por funcionários da empresa Prestomar Serviços Marítimos, que atuaria como uma espécie de despachante para as embarcações interessadas na emissão fraudulenta de certificados de inspeção sanitária sem vistoria. Os pacientes enquadram-se no segundo grupo. III -  Decisão que examinou fundamentadamente as respostas à acusação. Embora indiscutivelmente sucinta, a decisão que manteve a rejeição parcial da denúncia examinou as teses defensivas, incluindo as alegações preliminares de nulidade, bem como motivou o indeferimento das diligências requeridas. Além disso, referida decisão deve ser lida em conjunto com a anterior, que, após examinar detidamente o atendimento aos requisitos do art. 41 do CPP, rejeitou parcialmente a denúncia. IV -  De todo modo, os impetrantes diligentemente também trouxeram ao conhecimento do Tribunal as alegações sobre as quais o Juízo de origem teria deixado de se pronunciar, e que são analisadas no writ. A medida tem o condão de suprir eventual omissão que, na visão dos impetrantes, ainda esteja presente. V -  Denúncia que atende aos requisitos do art. 41 do CPP e encontra amparo em farto substrato indiciário, que inclui interceptação telefônica, busca e apreensão e até mesmo infiltração de agente. A narrativa ministerial descreveu individualizada e detalhadamente os indícios de autoria e materialidade das condutas imputadas a cada um dos pacientes, relativas ao crime de corrupção ativa e materializadas no oferecimento de vantagem indevida a servidores da Anvisa em troca da emissão fraudulenta de certificados de inspeção sanitária, sem a realização de vistoria. VI -  Validade das medidas cautelares de infiltração de agente, captação ambiental e ação controlada. A medida cautelar de infiltração policial não é nula, uma vez que não foi a primeira medida investigativa, tendo sido requerida depois que os ¿outros meios disponíveis¿ se revelaram inadequados ao caso concreto, exatamente como exige o art. 10, §2°, da Lei 12.850/13. Também não padecem de qualquer nulidade as demais medidas cautelares requeridas, e posteriormente autorizadas, quais sejam, a captação ambiental e a ação controlada. VII -  Desnecessidade de identificação da fonte humana. Foram as diligências preliminares e o inquérito policial ¿ e não a fonte humana ¿ que constituíram o substrato fático que permitiu o deferimento das cautelares em exame, de modo que o impetrante não possui razão quando busca acesso à Ordem de Missão Policial n° 27/2013. Em verdade, os ¿elementos que subsidiaram as medidas cautelares ora em exame¿ (diligências preliminares e o inquérito policial) já se encontram nos autos da ação penal originária, tanto assim que foram trazidos ao presente writ pelo próprio impetrante. VIII -  Validade da apreensão de e-mails na empresa CAMORIM. A obtenção dos emails se deu no âmbito de busca e apreensão autorizada judicialmente, nos termos da jurisprudência dos Tribunais Superiores (cf. STF, RHC 115.983/RJ). IX -  Validade da inclusão do ramal telefônica de paciente na interceptação telefônica. Considerando que, no bojo de interceptação telefônica autorizada judicialmente, a autoridade policial havia identificado a existência de potenciais atos criminosos praticados por meio de comunicação telefônica, parece claro que apenas a interceptação de tais ramais constituía meio eficaz para a obtenção da prova de autoria. X -  Validade do afastamento do sigilo das conversas realizadas via Nextel. Revela-se evidente que a interceptação do ramal do paciente Rodrigo Antônio tinha por objeto a captação de todas as comunicações por voz dele originadas, incluindo, por óbvio, aquelas realizadas por meio da tecnologia rádio. A indicação do terminal telefônico na decisão serviu apenas para identificar, para a operadora de telefonia, qual seria o aparelho a ser interceptado. XI -  Ilegalidade da condução coercitiva e nulidade dos interrogatórios dela decorrentes. A condução coercitiva de investigados ou de réus para seus próprios interrogatórios é medida que vulnera gravemente o direito constitucional ao silêncio, previsto no art. 5º, LXIII, da CRFB. No caso concreto, não há dúvida de que a condução coercitiva prejudicou o exercício de tal direito por parte dos pacientes Rodrigo Antônio e Thiago Moura. Mais: a condução coercitiva para interrogatório representa uma restrição da liberdade de locomoção e da presunção de inocência, ao obrigar a presença em um ato ao qual o investigado não é obrigado a comparecer. XII -  Por outro lado, mesmo se desconsiderados todos os depoimentos prestados em sede policial, após a condução coercitiva, ainda assim remanesce justa causa para a deflagração da ação penal de origem, pois, como afirmado anteriormente, a narrativa ministerial encontra amparo em farto substrato indiciário, incluindo medidas de busca e apreensão, interceptação telefônica e até mesmo infiltração de agente policial. Prova disso é que, para chegar à conclusão da aptidão da denúncia e presença de justa causa, o presente voto sequer fez qualquer referência aos interrogatórios realizados após a condução coercitiva. XIII -  Além disso, tais medidas cautelares foram deferidas antes da condução coercitiva e dos interrogatórios dos pacientes, razão pela qual não se contaminam com a presente declaração de nulidade. XIV -  Ordem parcialmente concedida nos autos do habeas corpus 000898363.2018.4.02.0000 (2018.00.00.008983-3), apenas para declarar a nulidade do interrogatório dos pacientes Rodrigo Antônio e Thiago Moura ocorrido em 20.05.2015 em sede policial, mantendo hígida a ação penal e suas medidas cautelares nos demais pontos. Denegada a ordem postulada nos habeas corpus HC 0008567-95.2018.4.02.0000 (2018.00.00.008567-0), HC 0008990-55.2018.4.02.0000 (2018.00.00.008990-0), HC 0009366-41.2018.4.02.0000 (2018.00.00.009366-6) e HC 0009637-50.2018.4.02.0000 (2018.00.00.009637-0).

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